O ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP), reagiu nesta terça-feira (26), à adesão de banqueiros a um manifesto em defesa da democracia, com críticas ao presidente Jair Bolsonaro (PL). Entre os signatários estão Roberto Setúbal, Pedro Moreira Salles e Cândido Bracher, do Itaú Unibanco.
Em tuítes direcionados ao presidente da República, Ciro diz que é graças a Jair Bolsonaro que banqueiros hoje podem assinar manifestos contra o governo sem medo de perseguição. O ministro atribui a insatisfação dos bancos à implantação do PIX durante o atual governo, que resultou, segundo ele, em perdas bilionárias para as instituições financeiras.
O texto, que está sendo organizado pela Faculdade de Direito da USP e por entidades e representantes da sociedade civil, é uma resposta aos discursos autoritários do presidente, nos quais contesta a lisura do processo eleitoral e ameaça não aceitar o resultado das urnas eletrônicas.
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“Então, presidente, se o senhor faz alguém perder 40 bilhões por ano para beneficiar os brasileiros, não surpreende que o prejudicado assine manifesto contra o senhor”, escreveu Ciro Nogueira no Twitter. “Mas os beneficiários, presidente, as dezenas de milhões de beneficiários do PiX vão assinar o manifesto deles também, no dia da eleição, apoiando o seu nome”, acrescenta. Implantado no governo Bolsonaro, o PIX foi planejado na gestão de Michel Temer.
No início desta tarde, Ciro voltou ao Twitter e fez comentário sobre uma matéria publicada pelo Congresso em Foco em 2014, na qual uma diretora do Santander diz ter sido demitida por ter criticado o governo da então presidente Dilma Rousseff (PT).
“Felizmente, já passou o tempo em que criticar um governante era motivo para demissão nos bancos do país. Olhar para trás é sempre um excelente exercício para evitar repetir, no futuro, os mesmos erros que atrapalharam tanto no passado”, escreveu o ministro, que apoiou a maior parte do governo Dilma.
Veja os tuítes de Ciro Nogueira:
Então, presidente, se o senhor faz alguém perder 40 bilhões por ano para beneficiar os brasileiros, não surpreende que o prejudicado assine manifesto contra o senhor.
— Ciro Nogueira (@ciro_nogueira) July 26, 2022
Batizado de “Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito”, o manifesto será lançado em um encontro na faculdade no dia 11 de agosto, no Pátio das Arcadas, e já tem quase 3 mil assinaturas, segundo a colunista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo.
Além dos banqueiros, empresários como Fábio Barbosa, da Natura, artistas e personalidades, como Chico Buarque e Arnaldo Antunes, e o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, entre outros, assinaram a carta.
Embora não cite o nome do presidente da República, o texto é dirigido a Bolsonaro.
“São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional. Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito, aqui também não terão. Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática”, diz trecho da carta.
Leia a íntegra do texto:
“Em agosto de 1977, em meio às comemorações do sesquicentenário de fundação dos cursos jurídicos no país, o professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.
A semente plantada rendeu frutos. O Brasil superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou a legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o Estado Democrático de Direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais.
Temos os poderes da República, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a Constituição Federal.
Sob o manto da Constituição Federal de 1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres e periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para o país sempre foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular. A lição de Goffredo está estampada em nossa Constituição: ‘Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição’.
Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral. Nossa democracia cresceu e amadureceu, mas muito ainda há de ser feito.
Vivemos em um país de profundas desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das nossas potencialidades econômicas de forma sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a devida plenitude.
Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos.
Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições. Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o Estado Democrático de Direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira.
São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional. Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito, aqui também não terão. Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática.
Imbuídos do espírito cívico que lastreou a Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre do Largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos às brasileiras e aos brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições.
No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições. Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona:
Estado Democrático de Direito Sempre!”.