É muito frequente apontar certas características que distinguem nós seres humanos das outras formas de vida. Vejamos sumariamente alguns dos principais traços diferenciadores anunciados, ponderando que nem todos os integrantes do gênero humano possuem essas características na mesma intensidade por inúmeras razões.
Inteligência. Somos capazes de raciocinar, planejar, resolver problemas, aprender e criar novas ideias, objetos, artefatos e tecnologias.
Consciência. Temos conhecimento da existência de nós mesmos e da separação do ambiente circundante. Somos capazes de pensar sobre nossas próprias emoções e temos um nítido senso de identidade pessoal.
Linguagem. Somos capazes de comunicar nossos pensamentos utilizando uma linguagem complexa e sofisticada. Por intermédio dela podemos transmitir informações, ideias e emoções de forma extremamente eficaz.
Cultura. Compartilhamos certas práticas, costumes, tradições e formas de transmissão de valores e crenças que influenciam fortemente o convívio e a identidade da sociedade humana.
Habilidade manual. Temos habilidades manuais altamente desenvolvidas. Por intermédio delas podemos construir e manipular objetos complexos, inclusive máquinas.
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Espiritualidade. Buscamos significados e propósitos para a vida além de nossas próprias existências ou do mundo físico que nos rodeia. Reconhecemos uma força vital universal criadora da realidade em seus múltiplos níveis.
Não nego, em linhas gerais, a correção ou consistência dessas considerações. Pondero, entretanto, que existe algo, um aspecto da vida, que é essencialmente humano no mundo em que estamos mergulhados.
Nós, seres humanos, e só nós seres humanos, fazemos escolhas conscientes. Nós, só nós seres humanos, decidimos, como exercício de vontade livre e consciente, acerca do conteúdo de nossas condutas ou comportamentos.
Assim, a moral, a pauta de valores, orientadora da escolha de cada conduta ou comportamento, assume importância monumental no convívio humano. A definição dos parâmetros fundamentais do que é mais valioso, desejado, esperado, produtivo ou construtivo ocupa posição central na vida individual e coletiva.
A tradição em torno das celebrações da páscoa cristã destaca a figura mais relevante para a humanidade (ao menos para a maior parte do mundo ocidental) justamente em termos da construção mais consequente moral individual e social.
Jesus, como revelou indiretamente Alan Kardec na questão 625 do “Livro dos Espíritos”, foi o tipo mais perfeito que Deus ofereceu ao homem para lhe servir de guia e modelo. Guia ou modelo da mais importante e revolucionária pauta moral para a evolução ou progresso do ser humano nas dimensões pessoal e social.
A revolução proposta pelo Cristo foi a prática do amor da forma mais intensa e radical jamais vista. Em outras palavras, a renúncia consciente de todos os sentimentos e práticas destrutivas ou negativas. Nada de vingança, ódio, violência, egoísmo, orgulho, discriminação, opressão ou injustiça.
Obviamente, essa proposta precisa ser encarada como um processo, um caminho, uma estrada (permanente). Os testes são diários, de todos os tipos e magnitudes, a serem enfrentados nesta e em outras vidas (para quem admite a reencarnação como ferramenta necessária para a evolução espiritual).
Nessa linha, é possível indicar a máxima da moral cristã, também conhecida como “regra de ouro”. Ela orienta cada passo, cada ato, cada conduta, cada comportamento na trilha da vida. Ela aponta como escolher conscientemente da melhor forma possível. Jeffrey Moses, no seu livro “Unidade. Os princípios comuns a todas as religiões”, afirma que: “a ‘regra de ouro’ é a pedra angular da compreensão religiosa. Ela é a mais completa expressão da Unidade de todas as pessoas e serve de alicerce para a paz e a boa vontade universal na Terra. /A Regra de Ouro é expressa quase da mesma forma em todas as religiões e é tão fundamental que fundadores e mestres iluminados de todas as crenças a observam rigorosamente”.
A apresentação cristã da “regra de ouro” assume a seguinte forma: “faz aos outros tudo o que queres que te façam”. Perceba a radical transformação pessoal e social proposta por Jesus. Não é fazer aos outros o que fizeram conosco. Também não é dar o que os outros merecem.
A ética cristã também apresenta um “desafio de ouro” na prática diária: o exercício do perdão. Essa atitude pode ser considerada a mais forte e sublime demonstração de amor, além de ser a maior evidência do nível de evolução espiritual alcançado.
Pedro perguntou a Jesus: “Senhor, quantas vezes devo perdoar meu irmão quando ele pecar contra mim? Até sete vezes?”. Jesus respondeu: “Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete” (Mateus 18:21-22). No entanto, a primeira fala de Jesus na cruz é muito mais impressionante. Em Lucas 23:34, ele diz: “Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem”. Essa declaração foi realizada no momento da crucificação e depois de ter sofrido as maiores ofensas morais e torturas físicas imagináveis.
Além da dimensão pessoal, a moral cristã possui inequivocamente uma dimensão coletiva ou social. Afinal, não existe espírito evoluído ou em evolução, praticante do amor e do perdão, isolado ou afastado do convívio com os semelhantes. O projeto de alcançar a felicidade é, ao mesmo tempo, individual e coletivo. Não existe amor em meio às violências, discriminações, opressões, misérias e fomes.
Ademais, todos somos responsáveis pela criação de um ambiente social, manifestado na forma da organização econômica e institucional da sociedade, em que cada espírito tenha plenas condições de evoluir, exercendo suas escolhas (de condutas ou comportamentos) da forma mais livre possível, assegurados a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência aos desamparados (artigo sexto da Constituição do Brasil).
Em uma de suas questões (número 806), Kardec indagou: “A desigualdade das condições sociais é uma lei natural?”. A resposta dada pelos espíritos foi a seguinte: “Não, é uma obra do homem e não de Deus”. Já Jesus foi ainda mais enfático ao afirmar: “É mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus” (Mateus 19:24).
A moral de Jesus me parece insuperável como guia para as escolhas pessoais e coletivas de cada ser humano (nesta vida e nas próximas). Ao compreender Jesus, de forma livre e racional, escolhi Jesus. Escolha Jesus.