Em meio à tensão entre o presidente Lula e o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu, o Ministério das Relações Exteriores convocou reuniões tanto com o embaixador brasileiro em Tel Aviv, Frederico Meyer, quanto com o embaixador de Israel em Brasília, Daniel Zohar. O israelense deverá comparecer ao histórico Palácio do Itamaraty, no Rio de Janeiro. Especialistas temem uma tendência de acirramento na relação entre os dois países.
A convocação dos embaixadores se deu em resposta a uma ação semelhante do governo de Israel, que convocou Frederico Meyer para uma reunião no Museu do Holocausto, em Jerusalém. Ele declarou o presidente Lula como “persona non grata” no país. Lula havia comparado as violações de direitos humanos cometidas pelo exército israelense na Faixa de Gaza às cometidas por Adolf Hitler contra os judeus durante o Holocausto.
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Para o professor de Relações Internacionais do Centro Universitário de Brasília (Ceub), Luciano Muñoz, a declaração do presidente Lula como “persona non grata” em Israel pode surtir em uma escalada na tensão entre os dois países. “Se nada for feito, a crise diplomática pode evoluir até um rompimento de relações, o que é bastante grave”. Israel exige uma retratação por parte do chefe de Estado pela sua fala.
Assessor especial para assuntos internacionais de Lula, o ex-chanceler Celso Amorim se reuniu com o presidente nesta segunda-feira para discutir o tema. Ele rechaçou qualquer possibilidade de Lula se desculpar, chamou de “coisa absurda” a reação do governo de Benjamin Netanyahu e disse que Israel está cada vez mais se isolando por causa do massacre promovido na Faixa de Gaza.
O professor Luciano Muñoz considera assertiva a condenação, por parte do presidente, dos ataques realizados por Israel contra civis na Faixa de Gaza, incluindo mulheres, crianças e ambulâncias. Ao tocar na questão do Holocausto, porém, ele teme que o Brasil acabe sendo descartado enquanto possível mediador do conflito, papel de elevada importância para a diplomacia brasileira.
“Todo o discurso diplomático brasileiro é de que o Brasil trabalha para articular consenso entre os países. (…) Ele tem uma tradição de resolução pacífica de controvérsias, ele busca aparecer como mediador dos conflitos. Quando você quer ser mediador de um conflito, você não pode demonstrar uma predileção, ao menos não abertamente por um dos lados”, apontou.
PublicidadeO professor de Teoria Geral do Estado na Universidade de São Paulo (USP), Rubens Beçak, teme consequências maiores para a posição do Brasil na comunidade internacional. “Tenho a impressão de que a política exterior brasileira está errática, e dando sinais que podem isolar o Brasil na comunidade internacional”.
Por outro lado, o especialista não acredita em prejuízo à comunidade brasileira em Israel. “Não acho que a situação descambe para algo como um rompimento de relações ou algo que minimamente possa afetar a população brasileira lá. Nem que fosse para esse extremo, eu penso que a população sofreria qualquer contratempo por lá”, avaliou.
Munõz pensa diferente, temendo eventual retaliação não necessariamente contra os brasileiros que vivem em Israel, mas contra os que vivem na Palestina. Ele relembra que, durante a operação de retirada dos brasileiros que estavam na Faixa de Gaza no início da ofensiva israelense, o governo israelense demorou para liberar a saída de brasileiros sem anunciar os critérios. “Quando os Estados têm relações diplomáticas estressadas, os nacionais do outro lado podem sofrer as consequências”, alertou.