Agora me diz: por que os que denunciam golpe no Brasil não denunciam golpe na Venezuela? Sabe o que isso lembra? Aquele tempo em que os comunistas mais ranhetas defendiam com unhas, dentes e gritos, por dever de ofício, as atrocidades cometidas na Rússia de Stálin. Admitir que o “Pai dos Povos” e suas crueldades teve razão para fazer o que fez era parte do script de uma esquerda mais à direita do que a própria direita. O tempo ajudou a desmontar a narrativa furada do Comandante Supremo, o Generalíssimo Josef Stálin, que afinal não passava de um assassino que a história varreu pra lata de lixo.
Mandou matar a machadadas um de seus principais críticos, um certo Trótski. Para se ter uma ideia pálida de como pensavam os stalinistas daquele tempo é só prestar atenção nos argumentos dos que ainda se prestam à insanidade de defender a figura patética e ridícula de Nicolás Maduro e sua revolução bolivariana, seja lá que diabo isso signifique. A argumentação é exatamente a mesma, ainda que Maduro não seja um tirano marcado pela crueldade extrema, como Stálin com sua polícia secreta, seus gulags e suas execuções. Vale tudo pra manter o poder. Principalmente, mentir.
Pode botar menino na cadeia? Na Venezuela pode
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As levas de migrantes venezuelanos que diariamente atravessam a fronteira com o Brasil são a imagem mais deprimente de um país devastado por um socialismo de fancaria que começou com Chávez e permanece com Maduro ao longo de duas décadas de seguidas agressões ao que há de mais primário do ponto de vista do funcionamento de um regime democrático.
A ditadura venezuelana (sim, vamos chamar pelo nome), mantém controle absoluto sobre as Forças Armadas e o Poder Judiciário. O Legislativo não tem um pingo de credibilidade, já que foi “eleito” e funciona a partir de manobras espúrias, como a que escolheu os membros da tal de Constituinte que Maduro alardeia ter convocado há algum tempo, totalmente formada por governistas. Esse processo de “escolha”, que só se pode escrever entre aspas, repetiu-se tim-tim-por-tim-tim agora na eleição presidencial com a oposição venezuelana isolada ou na cadeia. Será que se pode falar de prisões políticas na Venezuela ou só vale para o Brasil de Lula? Segundo reportagem de Fabiano Maisonnave, da Folha de S.Paulo, até menores e blogueiros estão nas masmorras podres do regime de Maduro por atividades contra o governo, além dos principais líderes oposicionistas. Nenhum deles passou por julgamento.
A teoria da conspiração levada ao infinito
Com uma inflação de quase 14.000 por cento e um PIB reduzido à metade desde que Maduro assumiu o governo, a Venezuela empurra diariamente cerca de mil venezuelanos para fora de suas fronteiras. Já emigraram até aqui meio milhão, criando inclusive problemas sérios a países como o Brasil, que não têm alternativa a não ser acolhê-los mesmo sem ter como garantir-lhes casa, comida e emprego. Ora, se as dificuldades para garantir tais direitos aos compatriotas já anda difícil por aqui, imagina pra quem vem de fora…
Colegas jornalistas que visitam a Venezuela voltam estarrecidos com a falta de tudo o que se poderia chamar de condições mínimas de sobrevivência: comida, água, remédios, combustível (sim, combustível, embora o país tenha as maiores reservas de petróleo do mundo!), energia, produtos de higiene e limpeza. Tentar comprar um tubo de pasta de dentes em Caracas é enfrentar uma operação de guerra.
Todos mentem, menos Maduro
A satanização da mídia de mercado, acusada de se aliar a uma certa oligarquia venezuelana que estaria se articulando para voltar ao poder cheira (ou fede) à mais mirabolante teoria da conspiração. Seria como achar que TODOS os veículos de comunicação de massa – aí incluídos CNN, CBS News, NYT, Washington Post, Rede Globo, Band, SBT, Clarín, Associated Press e um monte de etcs. que denunciam diariamente o regime de Maduro – estariam agindo em sintonia fina para entregar a Venezuela aos americanos. Narrativa boa pra roteiro de séries da Netflix. Mas beeeem distante da realidade.
Ainda na última semana o Correio Braziliense publicou um editorial denunciando o isolamento do regime de Maduro depois da “eleição”, sintoma, na opinião do jornal, de que pode vir abaixo a qualquer hora. A mesma conclusão é manifestada pelos demais veículos da chamada grande mídia brasileira. Será que isso permite acreditar que seus editores, na calada da noite, gastam horas de sono tramando, conspirando, telefonando, trocando e-mails e twitters, tudo para desestabilizar a ditadura de Maduro? Ora, faça-me o favor! Por mais à direita que possam ser, jornais e jornalistas têm mais o que fazer. Apenas expressam a conclusão óbvia de que a Venezuela foi tomada há quase 20 anos por uma corja de delirantes como o próprio Chávez e agora, Maduro, que usam a retórica social-comunista com a exclusiva finalidade de se perpetuar no poder atirando o genuíno ideal socialista da esquerda pro espaço.
Órgãos da imprensa livre, em qualquer lugar do mundo, buscam a verdade, até porque, sem ela, perdem credibilidade e, portanto, anunciantes. Abre parêntese: é um tanto cabotino falar na primeira pessoa, mas ao longo dessas quatro décadas de jornalismo (O Globo, Jornal do Brasil, Rede Globo, Diário do Nordeste, TV Verdes Mares etc), NUNCA recebi qualquer orientação para direcionar uma matéria nesse ou naquele sentido.
Não digo que não existam órgãos que forçam matérias na direção de suas inclinações ideológicas – o que abertamente é feito por veículos oficiais de esquerda, como a Rússia Today, a RT, a TV famosa pelo hábito de distorcer notícias ou divulgar fake news favoráveis ao Kremlin. Mas EUZINHO – insisto – nunca fui instado a isso, o que me leva à conclusão de que esse complô planetário funciona bem em conversa de boteco ou pra alimentar o whatsapp, nada além. Fecha parêntese.
Imprensa livre? O que é isso?
O resultado da eleição permite concluir que, embora tenha havido uma abstenção de mais de 50%, os votos favoráveis a Maduro devem-se principalmente à concessão dos “Carnês da Pátria”, os talões de alimentação – o Bolsa Família lá deles – limitados a quem fosse às urnas. E ao controle extremo que a ditadura exerce sobre qualquer movimento da oposição, completamente impedida de divulgar suas ideias, pois não há imprensa livre na Venezuela.
Agora, escuta aqui, só pra mudar de assunto e não sair do mesmo (não perco essa mania de fazer perguntas aos meus três leitores): se a Venezuela é ideologicamente rompida e elegeu o “império” norte-americano como seu principal inimigo, por que nunca parou de vender petróleo aos gringos, heim?