A então vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, pediu em agosto de 2023 que o declínio da competência do Supremo Tribunal Federal (STF) na condução das investigações do caso das joias sauditas. A informação consta nos relatórios da Polícia Federal (PF) tornados públicos nesta segunda-feira (8) que indiciam o ex-presidente Jair Bolsonaro e mais 11 aliados — entre eles o ex-ajudante de ordens Mauro Cid, o ex-secretário de comunicação Fábio Wajngarten e o advogado de Bolsonaro, Frederick Wassef.
Lindôra era a segunda em comando na Procuradoria Geral da República durante a gestão de Augusto Aras, PGR nomeado por Bolsonaro.
Segundo a PF, a atuação de Bolsonaro e sua cúpula se estrutura como organização criminosa a partir de cinco eixos: ataques virtuais a opositores, ataques às instituições (STF e TSE), tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito, ataques às vacinas contra a Covid-19, e uso da estrutura do Estado para obtenção de vantagens. Neste último ponto estão o “desvio de bens de alto valor patrimonial entregues por autoridades estrangeiras ao ex-Presidente da República”. É o caso do inqúerito que investiga a venda joias e esculturas sauditas, como o conjunto de itens masculinos da marca Chopard: uma caneta, um anel, um par de abotoaduras, um rosário arabe e um relógio.
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Já a vice-procuradora alega “ausência de conexão” entre fatos já investigados, como o Inquérito das Fake News e das Milícias Digitais, com o caso das joias. Ela também argumenta que a “suposta conexão” teria o propósito de atrair o caso para o STF. Além disso, Lindôra Araújo diz que nenhum dos investigados possuem foro com prerrogativa de função, o foro privilegiado, que por si só justificaria a competência do Supremo.
“O encontro fortuito de elementos informativos relacionados a outros fatos supostamente criminosos não, por si só, configura conexão, atraindo o conhecimento de hipóteses criminais desvinculadas de eventuais procedimentos no bojo dos quais aqueles foram coletados”, escreve a vice-procuradora.
Outro argumento para afastar a competência do curso das investigações do STF, segundo Lindôra Araújo, é a existência de investigação já em curso na Procuradoria da República no Município de Guarulhos (SP). Na 6ª Vara Federal de Guarulhos, já está em tramitação inquérito policial para apurar o caráter ilícito do recebimento e da entrada no país de joias e esculturas, presenteadas pelo governo da Arabia Saudita, e a destinação desses bens.
“Ainda que se pretenda sustentar que o objeto da presente Petição seria mais amplo, não se justifica a instauração de procedimento em duplicidade, a caracterizar bis in idem, renovando-se uma série de diligências e medidas persecutórias conduzidas por autoridades que já possuem familiaridade com o arcabouço probatório”, argumenta Lindôra Araújo.
Ela ainda recomenda, na petição, a “atuação conjunta da Polícia Federal, envidando-se esforços para o alcance dos fins das investigações já em curso, no âmbito do Juízo da 6ª Vara Federal de Guarulhos/SP, até mesmo com a deflagração de novas fases”.
A vice-procuradora-geral da República tem histórico de decisões que blindam o ex-presidente Bolsonaro. Em 2022, Lindôra Araújo solicitou ao STF o arquivamento de inquérito que investigava se houve tentativa por parte do ex-chefe do Executivo de interferir nas investigações da PF. No mesmo ano, ela concluiu que não havia elementos necessários para abrir inquérito contra Bolsonaro no contexto de supostas irregularidades no repasse de recursos ao Ministério da Educação.
O ministro Alexandre de Moraes, do STF, não acolheu o pedido de declínio de competência e pediu à Vara o “reencaminhamento do inquérito policial com o objetivo de possibilitar a efetiva análise dos autos”.
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