José Rodrigues Filho *
Com o julgamento da chapa Dilma/Temer na eleição de 2014, pelo TSE, é preciso que o Parlamento brasileiro tome uma decisão em relação à administração das eleições no Brasil. Já foi dito, há várias décadas passadas, que uma eleição é uma das atividades mais desorganizadas que existem. A exemplo de outros países, a chamada Justiça eleitoral no Brasil demonstrou que é favorável às falhas da Justiça política. Pesquisa realizada no México, por exemplo, mostrou os vários tipos de falhas das cortes eleitorais, incluindo o fato de se branquear ilegalidades eleitorais em pactos informais, por trás de portas fechadas.
Enquanto organização responsável pelas eleições, a Justiça Eleitoral nunca foi estudada em relação a sua eficiência e o seu papel no fortalecimento da democracia no Brasil. O que mais se sabe é que o órgão tornou-se poderoso, com uma casta de servidores bem pagos e ágeis para punir candidatos sem expressão de votos, talvez como marco autoritário de eficiência, criando assim um “quarto poder” na República.
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Não há dúvidas sobre a participação de magistrados exemplares e de qualificação invejável no TSE, a exemplo do que foi observado no julgamento acima citado, mas a participação de outros causa a impressão da existência de juízes sem a devida qualificação. Isso é decepcionante, sobretudo quando se divulga que o país estava diante de um dos maiores julgamentos de sua história. Não é só decepção. É vergonha. É bom que se diga que essa diferença tem que ser feita em quem vota contra ou a favor em determinado julgamento.
Há muito tempo atrás John Rawls tratou da Teoria da Justiça e, nos dias de hoje, vários pesquisadores avançam seu pensamento nas sociedades liberais, quando tratam das falhas da Justiça social, da Justiça política e da Justiça distributiva. O sistema democrático que não está estruturado para isolar os efeitos de interesses particulares deve ser entendido como um sistema político que não vivencia o ideal de justiça. Isso é um exemplo de falha da Justiça. Nesse caso, a atividade política corporativa busca desviar-se do sistema político que igualmente representa os interesses de todos os cidadãos para aquele que representa apenas os interesses daqueles que querem e são capazes de pagar pelo acesso.
Para alguns autores, as falhas da Justiça política acontecem quando não se pode assegurar a existência de governos suficientemente democráticos e independentes de interesses econômicos e sociais. É justamente nesse campo das falhas da Justiça política que entra o papel das empresas ou corporações, diante da habilidade delas de afetar a política, às custa da igualdade democrática.
Publicidade O julgamento da chapa Dilma/Temer se deu em cima das falhas da Justiça política, já que o relator, ministro Herman Benjamim, demonstrou e provou que a chapa não só foi financiada por corporações. Pior. Em vez de financiamento limpo e legal, valeu-se de propinas ilegais. Aliás, o seu relatório pode ser visto como o mais completo trabalho nacional e internacional de suporte aos estudiosos de ética nos negócios. No momento, o Brasil é o maior laboratório para estudiosos de Direito e Administração que queiram estudar a ética nos negócios ou nas empresas.
Costumeiramente, sempre se estudou as falhas do mercado, que muitas vezes tornavam as empresas ineficientes. Porém, nos dias de hoje, a questão da ética nos negócios tem sido enfatizada. No caso aqui citado, o papel de autoridade política dos executivos corporativos exacerba as falhas da Justiça política.
Espera-se que o Supremo Tribunal Federal anule esse julgamento, tão sofrido para a população brasileira, mas também que o Congresso Nacional repense a administração das eleições no Brasil, de modo que elas fortaleçam a democracia, e não sejam administradas por órgãos que reforçam a participação de corporações corruptas no processo democrático, enfatizando na prática e teoricamente, as falhas da Justiça eleitoral.
Se são do conhecimento da sociedade brasileira as práticas corruptas nas eleições e nunca o TSE deu um basta nisso, para que serve esse órgão? Para punir os mais fracos? Portanto, o fortalecimento de um “quarto poder” no Brasil, através da Justiça eleitoral, precisa ser reavaliado pelo Parlamento. O momento atual é de preocupação e temor para todos nós, considerando o mau funcionamento das nossas instituições, que, com suas práticas corruptas e vergonhosas, estão abrindo espaço para o autoritarismo.
* José Rodrigues Filho, professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), foi pesquisador nas universidades deHarvard e Johns Hopkins (EUA).