O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) incluiu na pauta de julgamentos da próxima quinta-feira (24) uma ação que debate se oito pessoas moradoras de Arraial do Cabo, no interior do Rio de Janeiro, têm o direito de processar e pedir ressarcimento à República Federal da Alemanha, por um crime de guerra cometido em julho de 1943, no auge da 2ª Guerra Mundial. A disputa singular foi iniciada há 14 anos, mas tramita há quatro na suprema corte.
O pano de fundo da discussão envolve um barco pesqueiro brasileiro e um submarino da Alemanha Nazista de Hitler no litoral brasileiro, quando as nações de Getúlio Vargas e Adolf Hitler já completavam quase um ano em guerra. Agora, os países comandadas por Jair Bolsonaro e Angela Merkel, respectivamente, têm nova chance de revisitar a história.
A ação foi movida por uma estudante, uma merendeira, um pastor evangélico, uma pessoa desempregada e quatro mulheres apresentadas como “do lar”. Todos são netos de Deocleciano Pereira da Costa, um dos oito pescadores dados como mortos no afundamento do barco de pesca Changri-lá, em 4 de julho de 1943.
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A íntegra da ação pode ser lida no site do STF.
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O barco partiu de Arraial do Cabo, a 160 km da capital fluminense, durante a madrugada daquele domingo. Acredita-se que naquela mesma madrugada, o Changri-lá foi abatido pelo submarino U-199, da Alemanha Nazista, matando todos a bordo.
PublicidadeO submarino U-199 acabaria por ser afundado pela Força Aérea Brasileira no dia 31 de julho daquele mesmo ano. Os tripulantes sobreviventes, levados aos Estados Unidos como prisioneiros de guerra, acabaram confessando o torpedeamento do Changri-lá – os autos remontam que a embarcação alemã, comandada por Hans Werner Kraus, afundou o barco pesqueiro com dois tiros de canhão 105mm. A Marinha do Brasil só reconheceu o afundamento como crime de guerra em setembro de 2001, após pesquisas feitas por um historiador brasileiro revelarem a versão dos nazistas para o evento.
Por conta disso, os autores do recurso alegam que uma indenização por danos materiais e morais deve ser requerida da República Federal da Alemanha – que, fundada em 1949, sucedeu o Terceiro Reich nazista. A acusação se baseia em um entendimento do Código Civil brasileiro de 2002, que considera que quem causa dano a algo ou alguém comete um ato fora da lei.
“Tal conduta foi exercida não só com mera culpa, mas com dolo, como se vê do testemunho do comandante do submarino U-199”, assinou o advogado da ação, Luiz Roberto Luiz Roberto Leven Siano. “Não há dúvidas, portanto, da vontade de matar, de destruir e consequentemente causar os danos aqui reclamados”. A morte de um pai de família, alegam, teria jogado a família na miséria.
A ação começou a tramitar na Justiça do Rio de Janeiro, em 2006. Primeira corte a julgar a questão, o Tribunal Regional da 2ª Região (TRF-2) se considerou incompetente para julgar a questão. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi a segunda casa a deliberar sobre o tema, e negou o direito a reparação. Segundo o ministro Marco Buzzi, que julgou a questão em 2014, o Terceiro Reich cometeu um ato de império, mas que “não há infelizmente como submeter a República Federal da Alemanha à jurisdição nacional”. O caso foi levado, então, à Suprema Corte.
Em 2017, a suprema corte considerou que a questão era constitucional e de repercussão geral – ou seja, o que a corte definir neste julgamento valerá para teses semelhantes. Desde junho, o recurso foi incluído e retirado de pauta ao menos três vezes.
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