Nesta quarta-feira (7), será realizado o último julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a adoção ou não do marco temporal da demarcação de terras indígenas. Caso a Corte julgue como procedente o pedido, aberto pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, ficarão anuladas as reservas em disputa que não representem terras não ocupadas por indígenas na data da promulgação da Constituição, em 1988.
Para quem tem pressa:
– Nesta terça-feira, haverá o último julgamento no STF sobre o marco temporal da demarcação de terras indígenas.
-Se a Corte aceitar o pedido do governo Bolsonaro, reservas que não representem terras não ocupadas por indígenas em 1988 seriam anuladas.
-O marco temporal foi estabelecido em um julgamento de 2009, mas o ex-ministro Ayres Britto considera inconstitucional sua adoção como critério delimitador.
-Ayres Britto ressalta que, em seu voto, não constava a tese do marco temporal e que ela foi estabelecida no voto de outro ministro.
-O ex-ministro destaca que o direito à demarcação de terras indígenas não deve ser obstaculizado pela Constituição.
-A bancada ruralista da Câmara dos Deputados fez avançar o PL 490/2007, que formaliza o marco temporal, antes do julgamento no STF.
-Ayres Britto considera o projeto inconstitucional, pois a demarcação é uma questão exclusiva da Constituição e é um direito básico dos povos indígenas.
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O conceito de marco temporal foi estabelecido em um julgamento no STF pela delimitação da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, concluído em 2009. O relator foi o então ministro Carlos Ayres Britto, que votou pela manutenção da reserva indígena. Apesar do resultado, o relatório é utilizado por defensores do marco temporal para argumentar que se trata de uma questão já pacificada na Corte.
Ayres Britto afirmou ao Congresso em Foco que não se trata de um assunto pacificado, e que ele próprio considera inconstitucional a adoção do marco temporal como critério delimitador de reservas indígenas. “A tese do marco temporal não constou no meu voto originário. Foi trazido a lume em um voto vista do ministro Carlos Alberto Direito. Como foi voto vencido, tive que colocar no acórdão o marco temporal”, diz o ex-ministro.
Ele acrescenta que, no próprio acórdão, registrou suas ressalvas à tese do marco temporal. “Como foi aprovada a proposta de Carlos Direito, eu ponderei que é preciso ressalvar as situações em que comunidades indígenas, na data de 5 de outubro de 1988, pudessem não estar ocupando aquela terra por questões de esbulho, de expulsão, de violência. Nesses casos, o direito delas à demarcação deveria persistir”, relembrou.
PublicidadeO ex-ministro considera que, ao se tratar de questões relacionadas à demarcação de terras indígenas, a Constituição não prevê obstáculos para a causa dos povos originários. “Demarcar é dever da União e é direito das comunidades indígenas. O instituto da demarcação não é um favor”, defendeu.
Assista ao segundo episódio da série Donos da Terra, que traz o marco temporal sob a perspectiva indígena:
Esforço da Câmara
Na última semana de maio, com a iminência do julgamento no STF, a bancada ruralista da Câmara dos Deputados fez avançar o PL 490/2007, que cria uma lei ordinária formalizando o marco temporal. Um dos argumentos levantados por seu relator, Arthur Maia (União-BA), é justamente de que a tese veio de um julgamento passado.
Ayres Britto chama atenção para a inconstitucionalidade do projeto. “A matéria não pode ser objeto de lei ordinária. É uma matéria exclusivamente constitucional. O que se trata é a interpretação correta da Constituição. Coloquialmente falando, a Constituição matou o tema no peito”, apontou.
Arthur Maia afirma que o projeto, na realidade, regulamenta os artigos 231 e 232 da Constituição, que são os que abordam os direitos dos povos indígenas. O ministro considera o argumento falacioso, tendo em vista que os assuntos previstos para regulamentação no texto constitucional não tratam da demarcação de terras, mas sim do usufruto de seus recursos naturais em assuntos de interesse da União.
“Quando a Constituição dispôs sobre a possibilidade de regulação da matéria por lei, disse, mas somente nos fins desses dois parágrafos (3º e 6º do Art. 231). No mais, não cabe lei”, reforçou. A forma de tramitação adotada pelos parlamentares também foge da exigência legal ao tramitar na forma de lei ordinária, e não de lei complementar, que são as que regulam assuntos previstos pela Constituição.
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