A comitiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), entidade autora do processo que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) alegando inconstitucionalidade da lei aprovada em 2023 que estabelece o marco temporal como critério de demarcação de terras, se retirou da audiência de conciliação durante a reunião com representantes dos demais poderes. A entidade considera ilegítima a tentativa do ministro Gilmar Mendes de solução negociada para a questão.
A lei do Marco Temporal foi aprovada nas duas Casas legislativas logo após o julgamento no STF que considerou inconstitucional o critério, que define como válidas apenas as demarcações de terras indígenas ocupadas na data da promulgação da Constituição. Alegando buscar uma solução que não traga novas contestações, o relator do processo que trata da nova lei, Gilmar Mendes, determinou que fosse tentada uma saída mediada entre representações indígenas, setores do agronegócio, governo e Congresso Nacional.
A Apib recebeu a proposta com ceticismo, e a primeira audiência de conciliação além de não alcançar resultados, foi marcada por novos problemas: representantes da articulação enfrentaram resistência para participar da reunião, alegaram falta de paridade nas negociações e também de tradutores de línguas originárias. O encontro aconteceu no dia cinco de agosto, em meio ao aumento da intensidade dos ataques violentos de fazendeiros contra aldeias indígenas nas regiões Sul e Centro-Oeste.
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Desde aquele momento, a articulação manifestava o desejo de se retirar da mesa de negociação. A Apib argumenta que, além de não haver paridade de armas sem uma decisão liminar suspendendo a lei do marco temporal para desestimular ataques a comunidades, o tema da negociação é um direito inalienável definido no texto constitucional, não podendo ser objeto de acordo. O gabinete de Gilmar Mendes reagiu afirmando que a mediação continuaria com ou sem a participação deles.
Nesta terça (28), a Apib anunciou que não faria mais parte da tentativa de acordo. “As nossas propostas [de termos] para a permanência da Apib não foram consideradas, e foram ainda desrespeitados os nossos direitos. Não tem como a gente dar sequência dentro de um espaço onde só um lado é o lado mais forte: Executivo, Legislativo e Judiciário, contra nós, povos indígenas. Não tem como continuar em um espaço como esse”, disse Kretã Kaingang, coordenador executivo da entidade pela região Sul.
Mauricio Terena, coordenador jurídico da Apib, criticou também o anúncio da chefia de gabinete de Mendes sobre a manutenção da câmara de conciliação com ou sem a Apib: a entidade poderá ser substituída pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), inclusive para fins de votação de um eventual acordo.
“Pensem vocês, não indígenas: você entra com um processo o Judiciário, e o juiz marca uma conciliação. Você fala que não e eles, no lugar, colocam a vizinha de vocês, outra pessoa sem nada a ver com a questão. Isso é uma medida jurídica incabível. (…) A parte autora é insubstituível”, declarou. O advogado reivindica que o processo seja discutido não na Câmara de Conciliação, mas no plenário do STF.
O representante da articulação indígena ainda avalia que o caso não deveria estar sob relatoria de Gilmar Mendes. Ele conta que, desde o dia 1º, a Apib possui pedidos em tramitação para que os processos que tratam do marco temporal sejam conduzidos por Edson Fachin, que foi o relator do julgamento de 2023. Estes, porém, seguem sem resposta.
A Apib também encaminhou um comunicado ao presidente do STF, Luís Roberto Barroso, formalizando os motivos de sua saída da audiência e ressaltando seus pedidos de equilíbrio de forças na discussão.
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