O ministro Nunes Marques, indicado por Jair Bolsonaro e o mais novo no Supremo Tribunal Federal (STF), pediu mais tempo para analisar o habeas corpus que pede que o ex-juiz federal Sergio Moro seja declarado suspeito em ações envolvendo o ex-presidente Lula. Com isso, o julgamento foi paralisado e não há previsão de retorno.
Até o momento dois ministros votaram a favor da suspeição (Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski) e dois votaram contra o pedido de Lula (Edson Fachin, relator do caso, e Cármen Lúcia).
O voto de Nunes Marques deve desempatar a questão. Porém, a ministra Cármen Lúcia, que já votou contra o habeas corpus em 2018, anunciou que tem novo voto escrito e o lerá após Nunes Marques se manifestar, indicando que também mudará de posição para considerar Moro suspeito.
Em seu voto, Nunes Marques disse que nunca teve acesso ao processo digital e que nem teve “sequer a curiosidade” de acessar os diálogos presentes no processo. Com isso, alegou, precisará de mais tempo para julgar a questão.
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O ministro Ricardo Lewandowski também considerou que as ações de Sergio Moro reveladas pela operação Spoofing demonstram completa incompatibilidade para atuar no caso. “A revelação pública daquilo que ocorreu nos bastidores do fórum federal de Curitiba afasta qualquer dúvida que ainda pudesse existir acerca da parcialidade do então juiz Sérgio Moro”, escreveu o ministro.
PublicidadePara o ministro, Moro “chefiou à margem da lei” um grupo com procuradores, “evidenciando, quando menos, um olímpico desprezo de sua parte pelos deveres funcionais previstos na Lei Orgânica da Magistratura Nacional e no Código de Ética da categoria.”
“Em outras palavras, ficou patenteado o abuso de poder com o qual se houve o ex-magistrado, bem assim o seu completo menosprezo ao sistema processual vigente no País”, concluiu Lewandowski.
Antes disso, o ministro Gilmar Mendes fez duro voto pela suspeição do então juiz federal Sergio Moro nos processos envolvendo o ex-presidente Lula. A votação ocorre um dia depois de o ministro Edson Fachin já ter anulado todas as condenações.
Em um demorado voto, Gilmar leu trechos de mensagens trocadas entre os procuradores, reveladas pela imprensa e depois auditadas na Operação Spoofing. O ministro classificou as trocas de mensagens como dignas de “estados totalitários”. Para ele, houve efetiva violação do devido processo legal.
Leia a íntegra do voto de Gilmar Mendes:
“É relevantíssimo o combate à corrupção, mas ele há de ser feito dentro dos moldes e ditames legais. Não se combate crimes cometendo crimes – é preciso que o sistema acusatório seja integralmente preservado”, afirmou o ministro, em voto com críticas também direcionadas à mídia e ao Ministério Público.
Gilmar ainda votou no sentido de que Sergio Moro pague as custas do processo – hoje cabíveis à defesa de Lula.
Durante seu voto, Gilmar afirmou que o movimento do poder Judiciário capitaneado pela Operação Lava Jato e pelo então juiz federal Sergio Moro representa “experimento de um projeto populista de poder político”, estrelada pelo que chamou de “juiz subserviente” a ideais ferozes à princípios da Constituição.
“Há alguns anos compartilho e aprofundo críticas sobre os excessos e riscos impostos ao Estado de Direito por um modelo de atuação judicial oficiosa, que invoca para si um projeto de moralização”, disse Gilmar, ao ler seu voto durante o julgamento. “A história recente do poder Judiciário ficará marcada pelo experimento de um projeto populista de poder político, cuja tônica assentava-se na instrumentalização do processo penal, na deturpação dos valores da Justiça e na elevação mítica de um juiz subserviente a um ideal feroz de violências às garantias constitucionais do contraditório, da ampla defesa, da presunção de inocência e principalmente da dignidade da pessoa humana.”
Mendes também disse que a atuação de Moro gerou “efeitos extra-processuais e dos efeitos midiáticos” – e que esta atuação teria influenciado, sim, em 2018.
“A opção por provocar e não esperar ser provado garantia que o juiz estivesse na dianteira de uma narrativa que culminaria na consagração de um verdadeiro projeto de poder que passava pela deslegitimação política do Partido dos Trabalhadores e em especial do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva”, afirmou o ministro. O objetivo, indicou, era “afastá-lo do jogo eleitoral.”
Mendes é o segundo ministro mais antigo da corte e assumiu o cargo em 2002, por indicação de Fernando Henrique Cardoso. O ministro buscou ressaltar, ao menos duas vezes, que não foi indicado pelos presidentes do PT, caso de Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia (ambos em 2006) e Edson Fachin (em 2015).
Pedido de adiamento
O ministro Edson Fachin, relator do caso na turma, pediu o adiamento da questão antes do início da sessão – e voltou a requerer que o caso fosse retirado de pauta. O motivo seriam novas argumentações trazidas pela defesa do ex-presidente, assim como a sua decisão desta segunda-feira, que declarou a justiça curitibana como incompetente para julgar os processos contra o político.
A decisão desta segunda, afirmou Fachin, causaria a chamada “perda de objeto”, ou seja, a impossibilidade de se continuar o julgamento. A Procuradoria-Geral da República (PGR) argumentou que era necessária a suspensão do julgamento, acompanhando o ministro Fachin.
Gilmar Mendes entendeu de maneira contrária, pelo prosseguimento do julgamento: “Esta circunstância não compele nem poderia compelir que este colegiado tivesse sua jurisdição esvaziada para apreciação da matéria”, disse. Em seguida, comparou: “É, desculpe-me, o cachorro que abana o rabo e não o rabo que abana o cachorro”.
Os ministros da corte se alinharam à tese do ministro Gilmar Mendes. Nunes Marques, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia consideraram possível continuar a julgar a suspeição de Moro, mesmo após a decisão de Fachin,
“A decisão do ministro Fachin é uma decisão ainda precária e efêmera, que está sujeito à apreciação do próprio Plenário do Supremo tribunal e não tem o condão de obstar o julgamento desta 2ª Turma”, argumentou o ministro Ricardo Lewandowski.
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