Durante sua participação no evento Brazil Economic Forum em Davos, na Suíça, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes criticou o atual modelo de distribuição de emendas parlamentares entre o Executivo e o Congresso Nacional. Como alternativa, propôs a implementação do semipresidencialismo.
Gilmar avalia que, no atual modelo de distribuição de emendas, as notícias sobre o tema “não estão apenas nas páginas da política, mas estão nas páginas policiais”, impondo o debate sobre alternativas ao mecanismo que hoje é considerado a principal moeda de troca entre Executivo e Legislativo. O ministro avalia que as emendas parlamentares foram desfiguradas a partir de 2015, quando começaram a ganhar seu caráter impositivo.
“É um modelo esquisito, estrambótico. O parlamentar participa da execução da política, propõe, mas não tem responsabilidade. Por outro lado, nós vivemos já, nessa quadratura que vai de 1988 até os nossos dias, dois impeachments presidenciais regulados e concretizados”, declarou. Gilmar Mendes revelou ter se debruçado sobre a possibilidade de transição ao semipresidencialismo junto ao ex-presidente Michel Temer, que também é professor de Direito Constitucional, e outros pesquisadores.
Leia também
“Há reformas institucionais que também precisam ser discutidas. Michel [Temer], eu e outros discutimos no Brasil um pouco lá atrás e chegamos a formular um projeto de semipresidencialismo. […] É um tema que certamente já está na agenda de 2025 e sobre qual nós teremos que nos debruçar”, declarou o ministro durante o fórum empresarial na Suíça. Também palestrante no evento, Temer defendeu o fim da reeleição e a adoção de um mandato único de cinco ou seis anos para o presidente da República.
O sistema de governo semipresidencialista é um modelo que mistura elementos do parlamentarismo e inclui um presidente que é eleito pelo povo e que tem a capacidade de influenciar a política do país. Muitos países adotaram esse sistema após uma transição do parlamentarismo, e a autonomia do presidente pode variar bastante de uma nação para outra.
De acordo com um estudo da Universidade de Oxford, o semipresidencialismo é um sistema presente em mais de 50 países, incluindo Portugal, França e várias nações do Leste Europeu.
A declaração de Gilmar Mendes foi feita em meio à suspensão de R$ 4,2 bilhões em emendas parlamentares de comissão por determinação do ministro Flávio Dino: decisão que um dos diversos momentos de atrito entre Legislativo e Judiciário diante de indícios de irregularidades na execução das emendas. Gilmar Mendes não citou o caso em si, mas ressaltou que as notícias sobre o tema “infelizmente não estão apenas nas páginas da política, mas estão nas páginas policiais”.
O ministro não é a primeira autoridade a cogitar uma mudança do presidencialismo para o semipresidencialismo. Entusiasta desse modelo, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), criou um grupo de trabalho em 2022 para construir uma proposta de transição. A discussão retornou no ano seguinte, em meio à elaboração da Lei de Diretrizes Orçamentárias. O relator, Danilo Forte (União-BA), foi acusado por deputados governistas de tentar transferir toda a competência sobre a execução das emendas ao Legislativo, construindo discretamente um modelo parlamentarista, do qual ele também é defensor.
O presidencialismo, modelo vigente no Brasil, estabelece o presidente da República como chefe tanto de governo quanto de Estado. No semipresidencialismo, ele ocupa apenas a chefia de Estado: assuntos internos são tratados por um primeiro-ministro indicado pelo presidente e submetido à aprovação pelo Congresso Nacional, que passa a exercer protagonismo na gestão pública.
Argumentos dos defensores da proposta:
– Quando há crises políticas, o semipresidencialismo possibilita que o primeiro-ministro seja trocado de maneira rápida e menos traumática, ajudando a manter a estabilidade do governo.
– O Brasil tem passado por instabilidades devido a dois impeachment recentes que foram bastante difíceis.
– O Congresso Nacional ganhou mais poder para definir as leis e influenciar o orçamento, mas esse aumento de poder não veio acompanhado de mais responsabilidades pela execução dos programas de governo.
Argumentos dos contrários ao modelo:
– As crises que o Brasil enfrenta são, na verdade, políticas e têm causas complexas.
– Mudar o sistema de governo não resolve as crises; é necessário lidar com os problemas políticos que as causam, que podem ocorrer independentemente do tipo de sistema adotado.