O deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) poderá ficar proibido de participar de qualquer eleição até pelo menos 2040, segundo o ex-juiz e advogado eleitoral Márlon Reis, um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa. Silveira foi condenado a oito anos e nove meses de prisão, à perda do mandato e dos direitos políticos por igual período nessa quarta-feira (20) pelo Supremo Tribunal Federal. Só depois de cumprir essa pena é que começarão a ser contados os oito anos de inelegibilidade previstos na Ficha Limpa, de acordo com Márlon. Na prática, o deputado bolsonarista deve ficar impedido de concorrer por 17 anos. A eleição seguinte seria a municipal de 2040.
“Ele está inelegível. Aguarda-se apenas a publicação do acórdão”, explica o ex-juiz. “Só após os oito anos e nove meses da condenação é que serão contados os oito anos de inelegibilidade”, ressalta. Segundo Márlon, esse tempo poderá ser ampliado caso a defesa do deputado insista em recursos protelatórios, já que isso retardaria o início do cumprimento da pena. “O acúmulo de recursos não o beneficia do ponto de vista da reconquista da inelegibilidade. Poderá ficar inelegível por mais que os 17 anos previstos se ficar recorrendo”, observa o advogado. Com isso, o deputado, que hoje tem 39 anos, poderá voltar a se candidatar somente quando tiver 57 anos.
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Daniel Silveira foi condenado um mês após o Supremo rejeitar uma ação do PDT que contestava a premissa de que os oito anos de inelegibilidade devem ser contados apenas ao final do cumprimento da pena. O partido do presidenciável Ciro Gomes queria que esse prazo de suspensão dos direitos políticos pudesse ser descontado do período da pena. Pela interpretação dos pedetistas, o político condenado a cinco anos de prisão ficaria esse período inelegível e impedido de disputar a eleição por mais três anos, somando-se os oito anos previstos na Lei da Ficha Limpa. Os ministros não quiseram analisar sequer o mérito do pedido.
“A ideia da Lei da Ficha Limpa foi exatamente expurgar da política, por mais tempo que seja possível, criminosos graves”, afirmou no julgamento de 9 de março o ministro Alexandre de Moraes, ao defender a aplicação mais rigorosa da lei. O ministro foi também o relator da ação contra Daniel Silveira e principal alvo dos ataques do parlamentar.
“A interpretação de que os oito anos começam a contar após o cumprimento da pena existe desde a criação da lei, em 2010, mas vinha sendo questionada em tribunais”, diz Márlon. “Com a Ficha Limpa, o excesso de recursos virou-se contra o acusado”, explica.
O advogado diz que não há como a defesa de Daniel Silveira ter sucesso em uma eventual contestação do enquadramento do seu caso na Ficha Limpa. Aliados do parlamentar alegam que ele não poderia ser barrado pela lei porque os crimes de ameaça ao Estado Democrático de Direito e coação no curso do processo, pelos quais foi condenado, não estão expressos na Ficha Limpa.
“A lei apresenta uma série de enunciados de tipos de crimes. Ela não relaciona crime por crime. Quando se fala de crime contra a administração pública, é um aspecto amplo que abarca crimes como aqueles pelos quais o deputado foi condenado. O TSE e o Supremo já decidiram que essa lista de crimes não é taxativa. Ela enuncia os tipos de crimes que se quer alcançar. Não há dúvida de que ele está inelegível. Outras inelegibilidades dependem de vários detalhes, mas não é esse o caso”, considera Márlon Reis.
O presidente da Câmara acionou o Supremo ainda nessa quarta-feira para que o Legislativo tenha a palavra final em caso de cassação de parlamentares julgados pela corte. Daniel Silveira foi condenado também à perda do mandato. Prevalece entre os ministros o entendimento de que cabe à Câmara apenas cumprir a decisão. Mas Lira e outros parlamentares contestam e alegam que compete aos deputados confirmar ou não a cassação do colega.
Para Márlon, o questionamento de Lira vem em boa hora. “Entendo que essa matéria não está definitivamente sanada e será uma boa oportunidade para se pacificar o tema”, diz. Na avaliação dele, no entanto, o Supremo também tem poder para cassar mandatos. “Não há dúvida de que tanto o Congresso quanto o STF podem retirar mandatos parlamentares em suas respectivas áreas. Pelo sistema de separação dos poderes, uma decisão condenatória transitada em julgado pelo Supremo não pode deixar de ser cumprida”, defendeu o idealizador da Ficha Limpa. Daniel Silveira ainda tem direito a apresentar recursos contestando aspectos pontuais da decisão, mas não o seu mérito.
O processo foi aberto quando Daniel Silveira publicou um vídeo em suas redes sociais no qual se referia ao ministro Edson Fachin, afirmando que “qualquer cidadão que conjecturar uma surra bem dada nessa sua cara com um gato morto até ele miar, de preferência, após cada refeição, não é crime”. Defendeu também o fechamento do STF e se posicionou favoravelmente ao AI-5, ato institucional do regime militar (1964-1985) que instituiu a censura e a suspensão de grande parte dos direitos políticos e civis da população. Ele foi condenado por dez a um. O único ministro a votar contra a condenação de Daniel Silveira foi Kassio Nunes Marques, o primeiro indicado ao cargo pelo presidente Jair Bolsonaro. Também indicado pelo presidente, André Mendonça votou pela condenação e enfrentou ataques de bolsonaristas e evangélicos.
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