Marcelo Aith*
Em que pese o Supremo Tribunal Federal (STF) tenha reconhecido a constitucionalidade espelhada do artigo 283 do Código de Processo Penal, que afasta o imediato cumprimento da pena com a condenação em segunda instância, há dois projetos tramitando respectivamente na Câmara do Deputados, de relatoria do deputado Ivan Manente (a CCJ da Câmara aprovou dia 20.11.2019 o relatório por 50 a 12), e no Senado Federal capitaneado pelo presidente Davi Alcolumbre, este por alteração do Código de Processo Penal, para impor prisão em segunda instância. Seria uma manobra para afrontar o STF que julgou procedentes as ADCs 43, 44 e 54?
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Lá vem o Congresso Nacional seguir a vox populi e rasgar a Constituição. Explico.
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Com a declaração de constitucionalidade no julgamento das ADCs todos os Poderes estão vinculados, não podendo subverter a decisão através de Emendas Constitucionais ou por Projeto de Lei. As propostas encaminhadas pelo deputado federal Manente ou pelo senador Alcolumbre, além de absolutamente impertinentes, causadores de insegurança jurídica e desequilíbrio institucional, são totalmente inconstitucionais.
Ademais, conforme ressaltado por Lenio Streck, “O legislador ordinário quer fazer como o ministro Fachin: quer interpretar a Constituição de acordo com a lei ordinária, moda que parece que vai pegar. O Brasil ainda vai mostrar ao mundo essa nova “técnica”, pela qual é possível mudar a Constituição via lei ordinária…!”. Ou seja, pretendem que a Constituição da República se adapte ao Código de Processo Penal, não o inverso como deve ocorrer em todas as normas, uma vez que todas as leis devem respeitar a Constituição, sob pena de serem inválidas.
PublicidadeNo entanto, parte dos congressistas, que desejam agradar seus eleitores, desconsiderando a regra constitucional, insistem no “canto da sereia”, como se “a prisão em segunda instância” fosse a pedra de toque do combate à corrupção. Ledo engano!
Não se pode esquecer que estamos a lidar com a liberdade das pessoas, que muitas vezes tem suas condenações revertidas parcialmente pelas Cortes Superiores, o que por si só seria suficiente para nem se pensar em tal atrocidade. Rui Barbosa brilhantemente pontua que “A injustiça, por ínfima que seja a criatura vitimada, revolta-me, transmuda-me, incendeia-me, roubando-me a tranquilidade e a estima pela vida”. Imagina quando há injustiça no encarceramento?
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*Marcelo Aith é especialista em Direito Criminal e Direito Público e professor de Processo Penal da Escola Paulista de Direito