Avancemos para 2011. Depois de passar cinco anos fora, mas com visitas trimestrais, estou convencido de que profundas mudanças estão ocorrendo no país e, principalmente, na mentalidade das pessoas. Então, depois de quase 40 anos de promessas, teria o Brasil realmente amadurecido e convertido o sonho em realidade? Não exatamente, e me parece que há ainda muito trabalho a ser feito. Inflação controlada, política econômica racional, ascensão da classe média e a explosão do mercado de commodities, estimulado pelo crescimento da China, têm colocado o Brasil nos holofotes do mundo, e ao mesmo tempo, mascarado os problemas estruturais. Sérias reformas terão que ser feitas nos próximos dez anos para que nos orgulhemos de estar no time de países com chances de ser desenvolvidos, como Chile, Coréia do Sul e até mesmo China. Caso contrário, nosso destino poderá ser o da Venezuela, Rússia ou Grécia, que fizeram bonito um dia, mas deixaram a oportunidade escapar por entre os dedos.
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Abaixo, listo as principais reformas necessárias para destravar o crescimento do Brasil e deixá-lo em ponto de bala para realmente prosperar:
Educação - no ensino fundamental, o nosso nível de conhecimento de ciências, matémática e português é um dos mais baixos do mundo. No recente teste Pisa aplicado pela OCDE, o Brasil aparece em quinquagésimo terceiro lugar. Os estudantes de Xangai foram os primeiros. Em termos de ensino superior, o Brasil forma hoje muito mais jovens que antigamente. Incrivelmente, mais advogados saem de nossas universidades que em todos os EUA. E mais médicos que em toda a Europa Ocidental. Embora quantitativamente tenhamos tido progresso, percebo que a qualidade do ensino caiu vertiginosamente.
Nossas universidades estão sucateadas pela incompetência e ideologia equivocada. A maioria dos professores que temos, mesmo os doutores, são acomodados e são contra a iniciativa privada. Estão ultrapassados pela velocidade da informação na era da internet e do capitalismo. Por se sentirem ameaçados, lutam para continuar com o modelo arcaico vigente, prejudicando milhares de estudantes todos os anos. Temos gente competente, mas muitos precisam ir ao exterior para brilhar. Há algo errado no sistema e basta dar um pequeno giro em universidades dos EUA, Chile, Cingapura ou China para vermos o quanto perdemos o bonde em termos de qualidade de ensino e pesquisa. Dinheiro só não resolverá o problema, é preciso uma mudança de mentalidade rumo à meritocracia e a aceitação da iniciativa privada para financiar projetos importantes. Caso isso não aconteça urgentemente, o Brasil não terá talentos suficientes para gerir o país a partir de 2030 e aí teremos desperdiçado uma geração inteira de jovens talentos.
PublicidadeVisão - os brasileiros ainda sofrem de um complexo de inferioridade e falta de visão em relação ao futuro. Alimentados por referências de políticos incompetentes e muita corrupção no setor público e privado, a convenção vigente é que devemos pensar a curto prazo. Aeroportos são feitos para durar e suprir a demanda por cinco anos e não 50. As estradas duram apenas um ano, pois assim reparos de emergência alimentados por interesses escusos podem prosperar no negócio da “manutenção”.
Não há incentivos e nenhum plano de longo prazo para reverter a saída de cérebros para empresas privadas e universidades em outros lugares do mundo, como se passou nas décadas de 80 e 90. Nossos maiores cientistas estão fora do Brasil. Querem voltar, mas ainda é dificílimo fazer ciência de qualidade no Brasil.
Se essa mentalidade superficial e colonial persistir, perderemos a oportunidade novamente. Precisamos de um líder para mostrar o caminho de como se fazer muito com pouco, e mudar a mentalidade da classe política e empresarial. Mesmo assim, qualquer trabalho nesse sentido demorará uma geração para chegar a um nível aceitável, como ocorreu na China, Chile ou Cingapura. Não há como fazer milagres.
Infraestrutura - vivi na China por quase dois anos e fui testemunha da dramática mudança na infraestrutura do país. A China era bem menos industrializada que o Brasil em 1980, com 80% da população vivendo no campo. Desde então a infra-estrutura do país se transformou rapidamente, como pode ser ilustrado pelas fotos abaixo de Xangai, em 1990 e em 2010.
Enquanto discutimos a aprovação do trem-bala RJ-SP para, quem sabe, ser concluído em 2020, a China constrói desde 2008 uma rede de trem-bala de 16.000 km para ficar pronta em 2014. Esta semana, já será possível ir de Xangai a Pequim (mais de mil km de distância) de trem-bala, dois anos antes do prazo estimado. Sem falar no metrô da cidade, que já se tornou o maior do mundo em apenas 15 anos, e é dez vezes maior que o de São Paulo, que tem 35 anos. Quando se trata de aeroportos, aí a balança pende 100% para o lado chinês. Quem já viajou pelo país sabe do que estou falando. Os aeroportos são maravilhas arquitetônicas construídas pensando-se nos próximos 50 anos. E mais 56 deles serão construídos até 2016 nas principais cidades chinesas. E nem comecei a falar de estradas e portos.
Os políticos, claro, dirão que a culpa é da ditadura chinesa, que pode desalojar pessoas num piscar de olhos e passar por cima de trâmites democráticos. Isso é parcialmente verdade, mas já pensaram que os chineses podem ser realmente competentes e visionários? Que outra semi-ditadura do mundo foi tão eficiente como a chinesa no último século? Competência não tem ideologia. Basta comparar a infraestrutura de países democráticos e emergentes como Taiwan, Coréia do Sul e Chile com a brasileira. Não há desculpas, nem mesmo a de que o Brasil é pobre e tem dimensões continentais (neste caso, SP, que é rico e pequeno, deveria se orgulhar de sua infra, o que não é o caso). A falta de infraestrutura encarece o país e o faz perder oportunidades, tempo e dinheiro. Não é uma questão de recursos, é uma questão de mentalidade e eficiência.
Código tributário - como falar de problemas brasileiros sem citar o escalafobético código tributário. Um país emergente que paga 36% do seu Produto Interno Bruto em impostos deve ter algo bastante desafinado na máquina pública. Aqui, a produção é taxada, não o consumo. Não é possível companhias multinacionais serem geradas aqui organicamente em setores de alta tecnologia e valor agregado. Um Google, com alcance mundial, não seria possível em solo nacional, seja por falta de mão de obra qualificada ou porque teríamos custos proibitivos. Hoje, contratar engenheiros de software no Canadá e no miolo dos EUA, com mais experiência, é mais barato do que contratá-lo em São Paulo, devido aos impostos que incidem sobre a folha de pagamento, que podem chegar a 80%, 100% do salário. Então, alguém que ganha R$ 10 mil custaria R$ 20 mil para a empresa. Isso são US$ 12 mil ao mês.
Como desenvolver nossa indústria dessa maneira? Estaremos destinados a ser exportadores de commodities para sempre? Impostos altos mascaram e financiam a incompetência de nossos administradores e a passividade do povo.
Sistema jurídico - todos sabem que o sistema legal brasileiro é um misto de caos, plutocracia e subjetividade. Pergunte a qualquer homem de negócios para lhe contar histórias de horror relativas ao sistema jurídico. Geralmente, elas findam com uma dose de corrupção. Criminosos confessos fora da cadeia e processos que demoram 20 anos não ajudam a saciar a sensação de impunidade. E isso está custando caro ao país. Por exemplo: há enorme interesse pelo setor de internet e alta tecnologia brasileiro por investidores estrangeiros, mas a maioria deles só investirá se a matriz da empresa tiver sede nos EUA, onde a Justiça funciona e protege os investidores. Perdem-se anualmente diversas Apples, Facebooks e Googles por conta do custo Brasil e do arcaico sistema jurídico.
É fato que estamos mais evoluídos nesse terreno que a China, a Índia e a Rússia, mas isso não é o suficiente para deixar o país numa posição confortável quanto às condições para conduzir negócios. Atualmente, o Brasil ocupa a 129a posição (dados de 2010). Não é falta de leis, o Brasil tem algumas das melhores do mundo. O problema é o cumprimento delas e o draconiano sistema de recursos de advogados bem pagos que exploram as fraquezas do sistema. Está na hora de sermos mais eficientes. E temos urgência.
E para terminar, claro, vale dizer que tudo isso só acontecerá depois de uma reforma no sistema político. Precisamos de melhores líderes, compromissados com o país. Como diria Deng Xiaoping, o arquiteto das reformas chinesas em 1979: “Mantenha a cabeça fria e não busque os holofotes. Nunca tome a liderança, mas planeje fazer algo grandioso”. O resto, como sabemos, é história.
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