Na manhã desta quinta-feira (10), o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), recebeu representantes do Executivo e do Legislativo para uma nova audiência de conciliação para tratar sobre o destino das emendas parlamentares de comissão, para onde foram enviados recursos que até 2022 eram adotados em emendas parlamentares de relator, conhecidas como Orçamento Secreto. O ministro decidiu preservar a suspensão iniciada no último mês de agosto.
Emendas de relator foram uma categoria de emenda parlamentar criada no governo de Jair Bolsonaro. Por esse dispositivo, recursos eram enviados aos estados, municípios e entidades do terceiro setor por determinação do parlamentar relator do orçamento, sem instrumentos precisos sobre quem solicitou ou como seria destinado o dinheiro. Isso foi constantemente utilizado por deputados e senadores para o benefício de seus aliados sem prestar contas a respeito — daí o nome “Orçamento Secreto”.
Em 2022, as emendas de relator foram declaradas inconstitucionais, e o Congresso Nacional aprovou uma resolução a fim de enquadrar o funcionamento das emendas de relator aos requisitos legais e esvaziando os recursos disponíveis a elas. O Psol, partido autor da ação que resultou na declaração de inconstitucionalidade do Orçamento Secreto, acionou novamente o STF, alegando que, mesmo no novo formato, essas emendas continuavam operando sem transparência.
Também foram levantadas suspeitas sobre a forma como estavam sendo utilizadas as emendas de comissão, herdeiras nos anos seguintes da parcela do orçamento que antes seria enviada às de relator, podendo servir como novo instrumento de repasses sem rastreio a aliados dos parlamentares.
Em agosto, o ministro Flávio Dino, relator do processo, suspendeu as emendas de relator e de comissão, e enviou ao Congresso e ao governo uma série de questionamentos sobre os novos critérios de destinação e controle. Na reunião desta quinta, os dois poderes apresentaram suas respostas.
Na parte do Legislativo, Dino avaliou que as respostas foram imprecisas e insuficientes para justificar um retorno dos dois tipos de emenda. “A Câmara dos Deputados e o Senado Federal limitaram-se a apontar que soluções hão de ser definidas em Projeto de Lei Complementar (PLP), cuja tramitação sequer iniciou”, destacou. Ele ainda ressaltou que o Congresso falhou em responder a respeito de quais foram os deputados que não prestaram informações sobre as emendas solicitadas por eles às comissões.
PublicidadeQuanto ao Executivo, o ministro se sentiu contemplado com as respostas sobre quais medidas foram tomadas para rastrear essas emendas, mas que estas corroboram ainda mais pela manutenção da suspensão. Ele chama atenção a um dado enviado pela Corregedoria-Geral da União (CGU), que informou sobre a impossibilidade de se identificar os empenhos de 56% das emendas em questão.
“Ante o exposto, à vista das carências quanto ao cumprimento das determinações judiciais, permanece inviável o restabelecimento da plena execução das emendas parlamentares no corrente exercício de 2024, até que os Poderes Legislativo e Executivo consigam cumprir às inteiras a ordem constitucional e as decisões do Plenário do STF”, concluiu.
Disputa com o Congresso
A decisão foi proferida um dia após a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovar um pacote de propostas legislativas de limitação dos poderes do STF. O projeto foi enviado pela Mesa Diretora ao colegiado exatamente após a suspensão das emendas impositivas, decisão interpretada pelo governo e por interlocutores como um ato de retaliação ao Judiciário após a suspensão das emendas impositivas, também questionadas sobre sua constitucionalidade no atual modelo.
Nos autos, Flávio Dino aproveitou para reafirmar a competência do Supremo na discussão. “Nenhuma impositividade em um Estado de Direito é maior do que o ordenamento derivado diretamente da Constituição Federal, cuja guarda compete ao STF, como instância que – à luz da cláusula pétrea da separação de poderes – estabelece a última palavra sobre o alcance das regras emanadas do Poder Constituinte”, declarou.
Confira a íntegra da decisão: