Bolsonaro pode ser acusado de tudo, menos de incoerência. Sempre defendeu a ditadura militar. Publicamente, chegou a considerar a tortura necessária.
Deixou claro antes do pleito que representava as viúvas dos anos de chumbo. Seu desprezo pela democracia e pela Nova República não é nenhuma novidade. Sua família condecorava milicianos muito antes do Capitão subir a rampa do Planalto.
O presidente espancou a Globo nas eleições usando o apoio de Roberto Marinho ao Golpe de 64. Disse em alto e bom som que iria acabar com a Folha de S.Paulo para uma Avenida Paulista eufórica.
Diante desses fatos, não é natural que seu filho considere a edição de um novo AI-5?
Mais importante que o protesto – a normalização precisa ser fustigada -, é tentar descobrir como, jogando deste jeito, o time adversário venceu a partida. O que fez o povo votar nele “com ditadura, tortura e milícia no pacote”?
Jair Messias venceu por se apresentar simbolicamente como a negação do sistema, de instituições incapazes de apresentar respostas para os problemas da Dona Maria.
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Alguns profetizam – movidos pelo sempre necessário otimismo da vontade – que o isolamento crescente levará ao impeachment. Sua excelência, o povo, assiste a tudo de longe. Queda de presidente sem gente na rua seria uma tremenda novidade.
No Congresso, eventual palco da queda, a agenda de Guedes reina absoluta.
Deputados e senadores nunca tiveram tantas emendas, impositivas e “extras”. O Capitão criou o “presidencialismo de emendão”. Tirou a confusão da Esplanada e empurrou para parlamentares e prefeitos. Vem funcionado bem, apesar de ter potencial para virar o próximo escândalo nacional.
Os liberais que dirigem o Congresso demarcam com os arroubos autoritários, mas aplaudem a agenda econômica. Não há sinal de que a verborragia vai atrapalhar o andamento das reformas. Com emendas pagas e a Bolsa batendo recordes, a roda vai girando.
Se a economia não decola, também não afunda. O mais provável é que a situação do povo continue congelada. Até onde irá sua paciência? A agenda de costumes e valores será suficiente para manter uma base unida e mobilizada? Qual a capacidade da oposição de ressignificar a esperança e mobilizar a população?
Quando o bolsonarismo rouba da esquerda a bandeira do “Abaixo a Rede Globo!”, fica ainda mais difícil para o Seu João distinguir quem luta contra o sistema.
Num país que, segundo o IBGE, caminha para se tornar uma nação evangélica, como a esquerda pretende se reconectar com o povo? A defesa do passado recente é suficiente? Que posição assumir na disputa simbólica entre o novo e o velho, entre o passado e o futuro?
No debate sobre o Estado, que reformas sistêmicas a oposição propõe? A luta de resistência na defesa deste sistema é o melhor caminho?
Na política, muitas vezes a dificuldade está em aceitar a realidade e fazer as perguntas corretas. As bolhas seduzem e o ego nos empurra para dentro delas. É preciso tomar cuidado para não vestir a fantasia de Hiena imaginando estar posando de Leão.
> Radicalização da esquerda justifica edição de novo AI-5, afirma Eduardo Bolsonaro