A ideia em um segundo
O Congresso Nacional, em sintonia com o Executivo, aprovou um orçamento inexequível para 2021. A finalidade é manter o discurso do teto de gastos e do compromisso com a austeridade. O governo contava com a variável tempo, uma vez que os efeitos completos do orçamento aprovado só se darão após 2022. Mas o ambiente sensível não está propício a malabarismos.

No xadrez da competição político-eleitoral brasileira, o tempo entrou definitivamente em cena a partir de 2021[fotografo] Pixabay [/fotografo]
Cálculos incompletos
No xadrez de competição colocam-se cronômetros, tornando o tempo obrigatório no cálculo dos competidores. Fosse ilimitado, poderíamos chegar ao cúmulo de partidas intermináveis, com jogadores calculando e recalculando probabilidades na busca de esgotar as possibilidades. No xadrez da competição político-eleitoral brasileira, o tempo entrou definitivamente em cena a partir de 2021. Premidos pelo relógio, os atores são forçados a se mover na incerteza oriunda da imperfeição de cálculos incompletos.
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Peça de ficção
O teto de gastos é suficientemente esotérico para que nenhum brasileiro sinta algo quando desabar sobre nossas cabeças. Calculado e aferido por especialistas, tem um tempo próprio para que sentenças definitivas possam ser formuladas e efetivadas. As manobras fiscais que levaram ao impeachment de Dilma Rousseff em 2016 foram feitas para o orçamento de 2014. Similarmente, o orçamento fake, aprovado neste mês, terá repercussões fiscalizatórias após 2022. Com isso, vale arriscar uma peça de ficção, na melhor tradição brasileira de fazer as coisas para inglês ver.
Reações imediatas

Legenda: O ministro da Economia, Paulo Guedes, e o relator-geral do orçamento, senador Márcio Bittar[fotografo]Edu Andrade/ME[/fotografo]
A proposta, contudo, gerou reações imediatas, talvez inviabilizando a tentativa de o governo jogar com o tempo. Da oposição parlamentar veio um pedido de explicações sobre a exequibilidade do orçamento aprovado. Do mercado, via manifestações midiáticas, diversas reações negativas, apontando para o mau humor crescente. Da Instituição Fiscal Independente, vinculada ao Senado, a confirmação da inexequibilidade na forma proposta – seria necessário, para começar, um contingenciamento da ordem de R$ 32 bilhões para pelo menos manter as aparências. Do Tribunal de Contas da União veio o aviso de que a sanção, como está, poderia configurar crime de responsabilidade. E o dólar deu mais uma de suas microdisparadas.
Ao que tudo indica, o quadro geral deixou tudo e todos mais sensíveis. A proposta orçamentária, que em outros tempos poderia passar sem maiores contestações, tropeça e já cambaleia, com o próprio governo admitindo que fará uma revisão.
Panela de pressão
O drama do orçamento acontece quando o governo se vê pressionado pelo recrudescimento da pandemia, com uma segunda onda muito mais avassaladora que a primeira. Porta-vozes do PIB põem suas digitais em carta aberta ao Ministério da Economia.
Em uma mudança ministerial feita às pressas e de forma atabalhoada, Bolsonaro tenta equilibrar os inconciliáveis objetivos de agradar sua base, reforçar a linha de defesa da família, agradar ao Centrão e apagar o incêndio no Itamaraty.

Edson Pujol, de farda, e Azevedo e Silva, à direita. Comandante do Exército e ministro da Defesa não resistiram à pressão política de Bolsonaro [fotografo] Valter Campanato/ABr[/fotografo]
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