Luiz Alberto dos Santos* e Regina Luna Santos de Souza**
Em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, a ministra da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, aborda, em boa hora, a necessidade do reajuste remuneratório para os servidores do Poder Executivo em 2023.
Segundo a ministra, com a instalação da Mesa Nacional de Negociação Permanente, o Executivo poderá concluir as negociações com os servidores e encaminhar ao Congresso projeto de lei ou medida provisória para assegurar o reajuste. Porém, sua vigência seria a partir de março ou abril de 2023, enquanto os servidores do Legislativo e Judiciário já tiveram reajuste a partir de 1º de fevereiro de 2023. Apenas os magistrados e membros do Ministério Público terão reajuste, já aprovado, a partir de abril de 2023.
A ministra aponta a existência de limites orçamentários que permitiriam reajuste de até 9% para os servidores civis do Executivo.
De fato, como já abordamos em outras oportunidades, o limite de expansão da despesa com pessoal com reajustes para o ano de 2023 no Executivo, aprovado pelo Congresso na forma da alínea 5.1 do Item II do Anexo V da Lei Orçamentária Anual para 2023 é de R$ 11,477 bi, já incluída a despesa com a contribuição patronal para o plano de seguridade social do servidor. No entanto, esse limite está direcionado COM EXCLUSIVIDADE aos servidores civis do Executivo:
“5.1. Limite destinado ao atendimento do PDL 471, de 2022, e de PLs relativos a concessão de vantagens, reestruturação e/ou aumento linear de remuneração de cargos, funções e carreiras civis no âmbito do Poder Executivo e das forças de Segurança Pública do Distrito Federal.”
PublicidadeOs militares, ao longo do governo Bolsonaro, foram contemplados com reajustes na forma da Lei nº 13.984, de 16 de dezembro de 2019, cujas parcelas foram implementadas de forma progressiva e a última delas, na forma de aumento de gratificação por cursos (adicional de habilitação), será implementada a partir de julho de 2023. A tabela de soldos, porém, teve seu último reajuste em janeiro de 2020.
Seria irreal imaginar que o Executivo, ao propor ao Congresso um reajuste, iria ignorar essa situação. Ainda que o faça com reajuste menor, dificilmente deixará de contemplar as Forças Armadas. Para tanto, porém, mesmo que não altere o acréscimo da despesa previsto, precisaria alterar a Lei Orçamentária, o que somente pode ser feito por meio de projeto de lei ordinária.
Caso seja necessário utilizar o limite de expansão da despesa com reajustes para militares e civis do Executivo, a dotação total somente permitiria conceder um reajuste geral inferior a 6%, a partir de abril de 2023, com custo total de pelo menos R$ 12,4 bilhões. Essa solução teria um caráter isonômico, embora seja injusta com as carreiras e categorias que tiveram seu último reajuste em janeiro de 2017 e que correspondem a cerca de metade da força de trabalho civil do Executivo.
Contudo, se os militares forem excluídos do reajuste – o que poderia levar a mais uma crise com as Forças Armadas -, o limite orçamentário autorizado permitiria conceder, a partir de abril, aos servidores CIVIS do Executivo, um reajuste médio de 8%, a um custo total de R$ 11,5 bi. Uma alternativa, nesse caso, seria conceder o mesmo reajuste conferido aos servidores do Legislativo e Judiciário, que tiveram reajuste em janeiro de 2019, ou seja, de 6%, e um reajuste que poderia chegar a 10% ou mais, para os que não tiveram reajustes desde 2017, e que, em regra, tem média remuneratória inferior aos que tiveram reajustes em 2018 e 2019.
Como reconhece a ministra, nenhum desses cenários chegará sequer próximo de repor as perdas acumuladas desde 2017 ou 2019, estimadas, até dezembro de 2022, em 35,56% e 26,93%, respectivamente. Para os militares, a defasagem no soldo já atinge 21,69% até dezembro de 2022.
A ministra comenta sobre a alternativa de conceder aumento ao auxílio-alimentação em sua entrevista. Em que pese ser meritória a preocupação, uma vez que o valor do auxílio-alimentação, no Poder Executivo, é de R$ 458 mensais, e está congelado desde janeiro de 2016, não pode ser vista como solução para tal problema.
Primeiramente, trata-se de reajuste que somente beneficia servidores ativos.
Em segundo lugar, a LDO 2023 permite que, no exercício de 2023, o auxílio-alimentação seja reajustado em, no máximo, a variação acumulada do IPCA desde a última revisão. Assim, esse benefício poderia ser reajustado em, no máximo, 47%, a partir de abril, dado que até janeiro de 2023, inclusive, o IPCA acumulado desde o último reajuste é de 44,85%. Ainda assim, o valor do auxílio-alimentação permaneceria correspondendo a 50% do atualmente devido aos servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário, e a LDO não permite que haja aumento acima desses percentuais.
Para esse fim, porém, o Executivo precisará promover remanejamento de dotação orçamentária, visto que esse auxílio não é despesa com pessoal, mas de custeio, e não foram incorporadas à LOA as repercussões do impacto de qualquer aumento com o benefício no Poder Executivo.
Trata-se, sem dúvida, de problemas de enorme magnitude e que exigem não apenas a disposição de negociar, a boa vontade para atender as demandas dos servidores e suas entidades, mas medidas concretas no plano legal e orçamentário, sob pena de frustração de expectativas e agravamento de uma situação crítica, derivada da política fiscal austericida do Governo Bolsonaro e sua reiterada visão de antagonismo com os servidores públicos.
*Consultor legislativo e advogado
** Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, mestre em Ciência Política e Doutora em Comunicação Social