Celso Cunha *
O setor nuclear brasileiro está no limiar de uma nova era, repleta de oportunidades e desafios. Projetos emblemáticos como a conclusão de Angra 3 e a exploração de Reatores Modulares Pequenos (SMRs) estão na pauta do dia, evidenciando a relevância da energia nuclear para a matriz energética nacional. No entanto, o sucesso dessas iniciativas está intrinsecamente ligado à qualidade da regulação que, por sua vez, depende diretamente da competência técnica dos profissionais nomeados para ocupar posições-chave nas agências reguladoras.
O setor nuclear é caracterizado por uma complexidade técnica que exige conhecimento especializado em diversas disciplinas. Os reguladores precisam estar preparados para lidar com questões que vão desde a segurança radiológica até o licenciamento de novas tecnologias, passando pelo gerenciamento de resíduos nucleares e a fiscalização das operações. Essa vasta gama de responsabilidades torna imperativo que as nomeações para cargos regulatórios sejam baseadas em critérios técnicos rigorosos.
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Recentemente, o setor nuclear brasileiro tem enfrentado desafios significativos em relação às nomeações para cargos regulatórios. A Associação Brasileira para o Desenvolvimento das Atividades Nucleares (Abdan), que representa as empresas e entidades envolvidas no desenvolvimento da energia nuclear no Brasil, tem acompanhado com preocupação a indicação de profissionais sem a qualificação técnica necessária para essas funções. Essa situação não só compromete a qualidade da regulação, mas também ameaça a segurança dos projetos em andamento e futuros.
A escolha inadequada de profissionais para cargos técnicos pode levar a uma série de problemas graves. Em primeiro lugar, há o risco de uma regulamentação ineficaz, que pode resultar em atrasos nos projetos e aumento de custos. No contexto do projeto de Angra 3, por exemplo, qualquer atraso adicional pode ter consequências significativas para a segurança energética do país. Além disso, uma regulação mal conduzida pode prejudicar a competitividade do Brasil no cenário internacional, afastando investidores que buscam estabilidade e previsibilidade.
Outro aspecto crucial é a segurança. A regulação nuclear envolve a implementação de normas de segurança extremamente rigorosas, destinadas a proteger tanto os trabalhadores das instalações nucleares quanto a população em geral. Nomeações baseadas em critérios políticos, em vez de técnicos, podem resultar em uma fiscalização menos rigorosa, aumentando o risco de incidentes. Um exemplo disso pode ser observado em países onde falhas na regulação contribuíram para acidentes nucleares com consequências devastadoras.
A experiência internacional mostra que países com uma regulação nuclear robusta e eficiente são aqueles onde as nomeações para cargos regulatórios são feitas com base em mérito e competência técnica. Esses países conseguiram desenvolver indústrias nucleares seguras e competitivas, que contribuem de maneira significativa para suas economias e para a mitigação das mudanças climáticas. O Brasil, com seu vasto potencial, não pode se dar ao luxo de ficar para trás.
Além disso, a falta de técnicos qualificados na regulação pode afetar negativamente a confiança do mercado no setor nuclear brasileiro. Investidores nacionais e internacionais estão atentos à forma como o Brasil está estruturando a sua regulação, e a percepção de que as decisões estão sendo tomadas por pessoas sem a devida qualificação pode levar à retirada de investimentos. Isso seria um retrocesso inaceitável num momento em que o país precisa avançar com urgência na diversificação de sua matriz energética.
Também é importante destacar que a regulação nuclear não pode ser vista de forma isolada. Ela faz parte de um ecossistema mais amplo, que inclui a formação e capacitação de profissionais, o desenvolvimento de novas tecnologias e a criação de políticas públicas que incentivem o uso seguro e eficiente da energia nuclear. Nesse contexto, as nomeações técnicas são apenas o primeiro passo. Precisamos de um compromisso contínuo com a excelência em todas as etapas do processo, desde a formação dos reguladores até a implementação das políticas.
Em última análise, a regulação eficaz é a base sobre a qual se constrói uma indústria nuclear próspera e segura. O Brasil tem todos os recursos necessários para se tornar um líder global em energia nuclear, mas isso só será possível se assegurarmos que os cargos regulatórios sejam ocupados pelos melhores e mais capacitados profissionais. Esse é o caminho para garantir a segurança energética do país, promover o desenvolvimento econômico e contribuir para a luta global contra as mudanças climáticas.
A energia nuclear, como fonte de energia limpa e segura, desempenhará um papel crucial na transição energética do Brasil, ajudando o país a cumprir suas metas de redução de emissões de carbono e a garantir um fornecimento estável e confiável de energia para as próximas décadas. No entanto, o alcance desse objetivo depende de nossa capacidade de assegurar uma regulação técnica e eficaz, conduzida por profissionais altamente qualificados e comprometidos com o futuro do setor.
* Presidente da Associação Brasileira para o Desenvolvimento das Atividades Nucleares – Abdan
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