O brasileiro pagando mais de R$ 100 num botijão de gás, quase R$ 10 pelo litro de gasolina e a preocupação do presidente é indultar bandido.
Isso mesmo, enquanto o brasileiro sofre para ter o mínimo de dignidade, Bolsonaro faz a festa com a sua patota.
Jair Bolsonaro decidiu retomar a sua escaramuça contra a integridade institucional no Brasil e assinou um decreto que concede o indulto individual (graça) ao deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a oito anos e nove meses de prisão.
Antes de avançarmos com a discussão neste artigo, tenha em mente algumas reflexões sobre o episódio:
Que apego todo é esse por mais alguns meses de mandato? Segundo especialistas da área, Daniel seguirá sem os seus direitos políticos.
Em conversa com o jurista Caio Paiva, ele foi taxativo:
A graça extingue apenas os efeitos primários da condenação. Continua sem direitos políticos e sem o mandato conforme a Súmula 631 do STJ.
Que desespero é esse?
Por qual motivo o Daniel Silveira quer preservar o seu foro? E por que Jair Bolsonaro precisa manter o foro de um deputado?! Tenho a impressão de que esse indulto seja sobre tudo, menos sobre a condenação no STF em si.
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Embora eu tenha uma fé inabalável na parvuleza do presidente, nada é impossível com um pouco de perversidade.
Segundo fontes no Planalto, Bolsonaro já estudava fazer algo do tipo caso o deputado Massaramduba fosse condenado. Ou seja, não foi um ato de impulso.
O indulto é só parte de um projeto que terá o seu desfecho ao final de outubro. É mais uma ação de alguém cujo um dos filhos defendeu o fechamento do STF por um cabo e um soldado, um presidente que já ameaçou descumprir decisões judiciais e que fragiliza o alambrado da institucionalidade dia sim e dia também.
Silveira é um deputado que fez e faz ameaças de morte e incita violência física contra membros do Judiciário. Um inimigo venal do Estado Democrático de Direito, vocalizando muitas vezes os desejos e pensamentos do nosso tão delinquente presidente.
Ao ser corretamente condenado pelos ministros da corte, é rapidamente beneficiado por um indulto individual para que não seja preso. É claro convite para que outros radicais avancem nas agressões e acintes contra a corte. Um verdadeiro alvará para que incitem à violência contra as instituições impunemente.
Bolsonaro sabe que perde para todo e qualquer candidato no segundo turno, faz um governo sofrível e delinquente. Por isso a sua aposta está em tumultuar o resultado que virá das urnas no segundo turno.
Para isso, precisa intimidar as instituições que até hoje foram capazes de contê-lo e qual a melhor maneira do que emitindo um salvo-conduto para a delinquência e intimidação?
Bolsonaro quer que os seus 25% de eleitores radicalizados sejam os novos camisas negras.
Quando foi permitido que Aécio Neves questionasse o processo eleitoral sem qualquer respaldo factual e tentasse criar uma espécie de terceiro turno do pleito de 2014 é claro que ninguém achou que poderíamos acabar nessa loucura, mas infelizmente isso abriu um precedente perigoso.
Quando, em 2018, a justificativa para votar em um homem que sempre nutriu um profundo desprezo pela democracia e pela dignidade humana, um economista incompetente e um juiz cujas decisões “reberveraram” no processo eleitoral, chancelamos a delinquência.
A verdade é que foram pequenas concessões ao longo dos últimos nove anos que permitiram que hoje um presidente pudesse fazer o que faz.
Ainda existe alguém que tenha coragem de comparar Lula, Haddad ou seja lá quem for com Jair Bolsonaro?
Dilma poderia ter feito o mesmo com Lula, não o fez, Haddad, ainda em 2018, negou que faria algo do tipo.
Mas o maior erro é do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, que por mero capricho e voluntarismo delinquente, não colocou a cassação do deputado Daniel Silveira em pauta no plenário.
Infelizmente todo Hitler tem o seu Petáin.
Vale lembrar que um dos períodos de pior performance eleitoral do Bolsonaro foi na escaramuça do 7 de Setembro, quando fixou seus esforços para cavar uma crise institucional.
Ele aqueceu os mais fanáticos, mas reduziu ainda mais as chances de ampliar sua base eleitoral.
Bolsonaro está fazendo uma aposta que não pode bancar e tende a sair fustigado dessa intentona assim como no 7 de Setembro.
Bolsonaro é minúsculo diante das nossas instituições. Inclusive, a presidência da República, que era gigantesca, encolheu em seu governo. Todos os seus quatro filhos estão enrolados com a Justiça. Da última vez que tentou tumultuar o país, precisou pedir socorro para Michel Temer, de lá para cá, as coisas não mudaram muito.
Talvez seja interessante não dar para o Jair o que ele quer, que é uma batalha campal contra o STF. Mesmo com o perdão, Daniel seguirá sem os direitos políticos, o que será extremamente benéfico para o país.
Bolsonaro joga com a frustração dos militares que estão irritados com o STF que liberou acesso aos áudios de ministros do Superior Tribunal Militar falando sobre a tortura nos porões da ditadura.
Como sempre, nossos fardados amam se lambuzar de ilegalidades, mas detestam quando são cobrados por isso.
Além disso, aliados do presidente e seus delinquentes estudam ingressar no STF com uma ação direta de inconstitucionalidade. Há inclusive, quem diga que essa Adin poderá vir pela Câmara e que Bolsonaro está pressionando para que isso ocorra.
Se a própria Câmara ingressar com uma Adin no STF sobre o tema para restaurar os direitos políticos do Daniel Silveira, aí podemos fechar a banca. Não acho que Arthur Lira irá para o tudo ou nada na defesa do bolsonarismo, ele sabe muito bem que existe vida além de Jair Bolsonaro.
Significa que Bolsonaro dará um golpe ou que tenha força para tal? Não! Significa que o país virou uma bagunça generalizada.
Outra coisa importante sobre essa situação toda. O indulto é sim uma afronta à democracia, logo poderia ser enquadrado como crime de responsabilidade (Lei 1079, artigo 6º), mas, jogar para o STF a discussão de revisão judicial do indulto é defender uma transferência de competências políticas. Tudo que o Brasil não precisa neste momento. É jogar mais gasolina em um incêndio. Juridicamente, Bolsonaro usou de suas prerrogativas dentro da Constituição Federal para fazer isso.
Se o Ministério Público passou a governar no interior do país através de termos de ajustamento de conduta (TAC), o STF se arvora em governar em casos em que há a suspeita de desvio de finalidade.
Mesmo assim, quem quiser contestar o indulto, o melhor caminho será alegar abuso de poder ou desvio de finalidade, não há inconstitucionalidade no ato do presidente.
O STF precisará escolher em qual front irá lutar, não pode correr o risco de ser desmoralizado com esse embate uma vez que não possuí força para defender a prisão do deputado e ao mesmo tempo a suspensão dos direitos políticos, precisará escolher.
A meu ver, o caminho mais bonançoso está em não permitir que o Massaranduba sem-graça possa ser candidato nos próximos oito anos.
Só existem dois caminhos para a resolução dessa encruzilhada: a primeira, com o eu já disse acima, o STF focar em manter Daniel inelegível a segunda opção é o próprio Congresso.
Seja com os senadores ou deputados. Até mesmo um decreto parlamentar é válido.
Além disso, é necessário que em algum momento Bolsonaro conheça de forma mais incisiva os limites da nossa institucionalidade.
Só chegou onde chegou por desconhecer tais limites, por algum motivo, nossas gigantescas instituições foram coniventes com a sua delinquência.
Como eu disse acima, Jair, é minúsculo e sabe disso. Principalmente se comparado com as instituições. Ele não tem força política para tentar qualquer coisa, não é um Viktor Orbán, tampouco um Erdogan.
Só lhe restam a violência e a truculência.
Bolsonaro não concedeu um indulto para Daniel Silveira, fez um convite à violência.
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