“O impeachment entrou na agenda política brasileira. Agora, quando isso irá ocorrer, em função da pandemia, é muito difícil precisar”, disse o ex-deputado federal e presidente nacional do Cidadania (antigo PPS), Roberto Freire, em entrevista. Para ele, a avalanche de denúncias por crime de responsabilidade contra o presidente Jair Bolsonaro indica que o tema virou uma questão nacional da política, mas o avanço dessa discussão não está dado.
“O jogo ainda não está sendo jogado, você está ainda nas preliminares”, afirmou o ex-deputado federal, lembrando que o desencadeamento de um processo como o impeachment não ocorre de imediato.
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Na opinião dele, o governo do presidente Bolsonaro é pródigo na produção de crimes de responsabilidade, mas não há um quadro de normalidade social tal qual havia na época dos dois impeachments da história brasileira – dos ex-presidentes Fernando Collor e Dilma Rousseff.
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“Você não vai ter a mesma característica, as mesmas causas, as mesmas movimentações”, compara ele. Para Freire, um dos pontos-chave é a dificuldade de mobilização social no atual momento, dado que a população não pode se manifestar nas ruas devido às medidas de isolamento social decorrentes da pandemia do novo coronavírus.
Segundo pesquisas, Bolsonaro ainda tem um suporte popular de cerca de 30%, mas Freire recorda que, no início do processo que levou à queda de Dilma, a ex-presidente também tinha algum apoio. “A gente pensa que tudo começou como terminou. Não foi”, disse ele em referência ao longo caminho que culminou no afastamento de Dilma em 2016.
PublicidadeFreire avalia que há uma tentativa do governo de se blindar com o Congresso, com recentes negociações com partidos do Centrão. Para ele, esse movimento de aproximação não é nada estranho, pois os outros presidentes que acabaram impeachados fizeram tratativas semelhantes.
Crimes comuns
O presidente do Cidadania acredita que, se o Supremo Tribunal Federal (STF) definir em seu inquérito que houve a prática de crime comum pelo presidente Bolsonaro, haverá um processo menos político e mais rápido. “Esse inquérito pode ser mais consubstanciado, ou seja, com maior prova”, avaliou. Para ele, esse pode ser o caminho que seja adotado contra o que considera irresponsabilidade do governo Bolsonaro.
“É um presidente que não teve um gesto de solidariedade para as vítimas dessa pandemia. Nenhum. Isso é pouca coisa? Não, isso é um sinal terrível”, criticou.
O ministro do Supremo Celso de Mello autorizou, na noite de segunda-feira (27), a abertura do inquérito contra Jair Bolsonaro e o ex-ministro Sergio Moro. A decisão atendeu a um pedido que partiu do procurador-geral da República, Augusto Aras. O decano da corte foi escolhido através de sorteio.
O inquérito vai apurar os fatos narrados por Sergio Moro no dia em que anunciou sua saída do governo e denunciou que o presidente Bolsonaro teria interesse em trocar o diretor-geral da Polícia Federal por questões políticas. Para Celso de Mello, os fatos denunciados por Sergio Moro têm relação com o exercício do cargo, permitindo assim investigação do chefe do Executivo.
O governo pode impedir o encaminhamento de uma denúncia, disse ele citando o exemplo do ex-presidente Michel Temer. Em 2017, o então Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, apresentou duas denúncias que acabaram rejeitadas pela Câmara dos Deputados.
Raio-X
Roberto Freire, 78, tem longa trajetória no Legislativo, tendo sido deputado federal e senador por Pernambuco por vários mandatos. No Executivo, foi ministro da Cultura durante parte da gestão Temer, entre novembro de 2016 e maio de 2017.
O Cidadania é o sucessor do Partido Popular Socialista (PPS). A mudança no nome foi aprovada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2019. A sigla reúne 8 deputados federais e 3 senadores.
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