Aproximadamente 290 mil vidas perdidas no Brasil para o coronavírus. Sistema hospitalar em colapso, desabastecimento de medicamentos e tristes recordes diários de mortes. A maioria da população está preocupada com a lentidão da vacinação, com o emprego, o auxílio emergencial, a manutenção de suas empresas. E o mundo da política, acentuando característica histórica – a dissintonia com a sociedade, mergulha num debate inoportuno, fora de hora e insensível sobre a possível polarização entre Lula e Bolsonaro em 2022. Só haverá próximo ano novo se superarmos os enormes desafios imediatos de 2021.
Lula tem uma história pessoal admirável. Nascido pobre em Caetés, Pernambuco, migrou para São Paulo, onde se formou no SENAI no curso de torneiro mecânico e se tornou metalúrgico no ABC paulista. Daí, começou na vida sindical, sendo assessor e diretor do Sindicato dos Metalúrgicos. Nunca quis entrar no Partido Comunista Brasileiro de seu irmão Frei Chico. Cresceu sob as asas de Paulo Vidal, então presidente do sindicato, que o fez seu sucessor, sendo formado dentro da cultura do “sindicalismo de resultados” treinado pela escola americana. Liderou as grandes greves no ABC em 1978, 1979 e 1980 e se tornou um líder nacional. Seu carisma e liderança amadureceram nas grandes e históricas assembleias no Estádio Vila Euclides. Lembro que no movimento estudantil fazíamos coleta de doações para o fundo de greve do ABC.
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Incialmente, tinha posição classista e economicista antipolítica. Foi preso em 1980. E recebeu a solidariedade dos democratas de todo o Brasil. Tempos depois, liderou a fundação do PT, se tornou deputado constituinte, teve três derrotas em eleições presidenciais, até que em 2002 se torna o primeiro operário a chegar à Presidência da República. Ninguém faz uma trajetória pessoal dessas por acaso. Maquiavel dizia que o “Príncipe” para ter êxito precisaria de virtude e sorte. Lula demonstrou inegavelmente possuir esses dois elementos essenciais.
Durante todo o regime militar imperou o bipartidarismo, com a Arena, sustentando o governo, e o MDB, representando as oposições. Após a anistia; o fim do AI-5 e da censura; a crise econômica no governo Figueiredo, que combinava inflação, recessão e estrangulamento externo; o desgaste dos militares pela longa permanência no poder; os resultados expressivos do MDB nas eleições de 1974 e 1978; o “intelectual orgânico” do governo militar, General Golbery do Couto e Silva, engendrou a estratégia de dividir as oposições para as eleições de 1982, com a reforma partidária e o fim do bipartidarismo.
Em 20 de dezembro de 1979, o Congresso Nacional aprova a Lei 6.767, extinguindo a Arena e o MDB, e flexibilizando a criação de novos partidos. Aí nasceu o PT. Foram criados o PDS, sucedâneo da Arena; o PDT de Leonel Brizola; o PTB de Ivete Vargas; o PMDB, tendo a frente Ulysses Guimarães e o PP, como partido de centro moderado, unindo os rivais eleitorais de 1962 em Minas, Magalhães Pinto e Tancredo Neves. O roteiro imaginado por Golbery seria completamente realizado se não fosse um tropeço: o estabelecimento do voto vinculado. Com isso, percebendo as artimanhas do “bruxo do Planalto”, Tancredo Neves e Ulysses Guimarães promoveram a fusão de PMDB e PP, e o PMDB reassumiu a feição de grande e ampla frente democrática.
Voltaremos ao tema na próxima semana.
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