O presidente Lula começa neste domingo (22) a primeira viagem internacional de seu terceiro mandato ao aterrissar em Buenos Aires. Lá, terá uma reunião com o presidente da Argentina, Alberto Fernández, com quem planeja debater a elaboração de projetos de parceria econômica entre os dois países. Um dos itens da pauta é a construção de uma moeda comum para países sul-americanos, pauta antes rechaçada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
A pauta do diálogo entre Lula e Fernandez foi estabelecida em um artigo conjunto assinado pelos dois presidentes na véspera do encontro e publicada pelo jornal portenho Perfil. No documento (leia a íntegra, em português, mais abaixo), os dois se referem ao Brasil e à Argentina como “duas nações irmãs” e se comprometem a “quebrar as barreiras em nossas trocas”. Uma das medidas para isso é “avançar nas discussões sobre uma moeda sul-americana comum que possa ser usada tanto para fluxos financeiros quanto comerciais, reduzindo custos operacionais e nossa vulnerabilidade externa”.
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Essa nova moeda, porém, não substituiria o Real ou o Peso, mas serviria como uma moeda internacional, aos moldes do Euro. Os dois países também planejam promover políticas para incentivo do uso de moedas locais na América do Sul, e utilizar o Mercosul como uma “plataforma para nossa efetiva integração com o mundo, por meio da negociação conjunta de acordos comerciais equilibrados que respondam aos nossos objetivos estratégicos de desenvolvimento”.
Os dois presidentes ainda planejam atuar em conjunto em projetos de construção de infraestrutura, em especial energética, com planos de integração da rede de distribuição de gás natural entre os dois países. Além disso, planejam retomar a política de parceria no desenvolvimento de energia nuclear, e desenvolver um projeto conjunto de lançamento de satélite espacial para monitoramento marítimo e costeiro.
Lula já tem também três viagens marcadas para 2023: uma para dos Estados Unidos, onde planeja tratar com Joe Biden sobre sua campanha eleitoral que se aproxima, outra para a China e por fim para a Alemanha, onde tratará com o primeiro-ministro Olaf Scholz sobre o crescimento de movimentos e partidos de extrema-direita no continente europeu.
Veja a íntegra do artigo traduzido:
Publicidade“Relançamento da aliança estratégica entre Argentina e Brasil”
Alberto Fernández e Luiz Inácio Lula da Silva *
Duas nações irmãs se encontram novamente. Amanhã [22.jan] nos encontraremos em Buenos Aires para o 1º encontro presidencial entre Brasil e Argentina em mais de 3 anos. Em seguida, será realizada a 7ª Cúpula da Celac, fórum que reúne os 33 países da região da América Latina e Caribe e que, desde o ano passado, está sob a presidência da Argentina. O evento marcará o retorno do Brasil a esse mecanismo de diálogo e consulta regional. Uma relação que nunca deveria ter sido interrompida e que a história da irmandade latino-americana consegue retomar.
Ambos os encontros marcam um novo começo, justamente no ano em que celebraremos o bicentenário de nossas relações diplomáticas. Em Buenos Aires vamos relançar a aliança estratégica bilateral com a reativação de vários espaços de cooperação e diálogo. São múltiplas as áreas em que voltaremos a trabalhar juntos em temas importantes para a qualidade de vida de nossas populações, como combate à fome e à pobreza, saúde, educação, desenvolvimento sustentável, mudanças climáticas e redução de todas as formas de desigualdade. De uma vez por todas, a história será escrita por nossos povos.
Vamos fortalecer o papel da sociedade civil, dos governos estaduais e municipais e dos parlamentos como atores dessa aproximação. Sabemos que o sonho de estarmos unidos é agora uma realidade possível.
Os laços entre Argentina e Brasil são baseados na consolidação da paz e da democracia. Queremos a democracia para sempre. Ditadura nunca mais.
A reindustrialização de nossas economias merecerá atenção especial, com geração de empregos de qualidade e investimento em inovação. O comércio entre Argentina e Brasil já tem alta participação de produtos industrializados em setores estratégicos. A integração entre nossas cadeias produtivas ajuda a mitigar choques externos, como os ocorridos durante a pandemia. Não podemos depender de fornecedores externos para podermos ter acesso a insumos e bens essenciais ao bem-estar das nossas populações.
Temos um setor privado dinâmico e empreendedor, cuja contribuição para o processo de integração bilateral é cada vez mais necessária. Compartilhamos a firme intenção de estreitar os já sólidos laços comerciais e de investimentos entre nossos países e promoveremos um seminário empresarial no âmbito da visita presidencial.
Nossos países continuarão a desempenhar um papel crítico para a segurança alimentar em um mundo afetado por riscos geopolíticos e graves interrupções nas cadeias de abastecimento. Temos o compromisso de dotar a nossa agricultura e pecuária de elevados padrões de sustentabilidade e de manter elevados níveis de produtividade.
Queremos promover projetos na área das infraestruturas. Um tema central deste novo momento é a integração energética. A interligação eléctrica entre os nossos países já é uma realidade e a integração do gás tem potencial para se tornar um dos projetos estratégicos da relação bilateral, com benefícios duradouros ao nível da atração de investimento, criação de emprego e ao nível da nossa segurança.
Consolidaremos nossa posição como possuidores de tecnologia nuclear para fins pacíficos, fortalecendo a Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares e dando continuidade a projetos ambiciosos como o reator multiuso. Com a reativação do Grupo de Trabalho Conjunto de Cooperação Espacial, vamos colocar satélites em órbita para realizar estudos costeiros e oceanográficos.
A relação fluida e dinâmica entre Brasil e Argentina é essencial para o avanço da integração regional. Junto com nossos parceiros, queremos que o Mercosul constitua uma plataforma para nossa efetiva integração com o mundo, por meio da negociação conjunta de acordos comerciais equilibrados que respondam aos nossos objetivos estratégicos de desenvolvimento.
Pretendemos quebrar as barreiras em nossas trocas, simplificar e modernizar as regras e incentivar o uso de moedas locais. Também decidimos avançar nas discussões sobre uma moeda sul-americana comum que possa ser usada tanto para fluxos financeiros quanto comerciais, reduzindo custos operacionais e nossa vulnerabilidade externa. “Trabalharemos juntos para resgatar e atualizar a Unasul, com base em seu inegável legado de conquistas. Argentina e Brasil estão firmemente comprometidos em construir uma América do Sul forte, democrática, estável e pacífica. Precisamos enfrentar um mundo cada vez mais complexo e desafiador e temos ampla convergência na agenda multilateral. Falta uma vontade política efetiva para enfrentar os dilemas atuais e as grandes crises: mudanças climáticas, pandemias, guerras, fome e imigração. A ONU e o G20 devem ajudar a preencher essa lacuna de liderança para provocar mudanças. Ambos os fóruns podem promover agendas inclusivas, sinalizando claramente a atuação de organizações como a OMC, o FMI e o Banco Mundial.
Trabalharemos em colaboração pela paz e pelo desenvolvimento.
O mundo mais justo e solidário a que aspiramos só será viável se tivermos coragem de construir juntos o nosso futuro. Esse é o significado estratégico da integração bilateral.
Não há nada mais emancipador do que a irmandade dos povos que vêm desde o alvorecer da nossa história para tomar posse do seu futuro.”