Está sob análise da Casa Civil um projeto de lei de autoria do governo que pretende facilitar e evitar controvérsias jurídicas sobre o bloqueio de bens de investigados por participar ou financiar atos golpistas. O Congresso em Foco teve acesso à minuta da proposta, considerada pelo Executivo como a menos polêmica do chamado Pacote pela Democracia, conjunto de iniciativas entregues pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, ao presidente Lula como reação aos atentados de 8 de janeiro.
O texto prevê que, no caso em que houver indícios suficientes de participação ou financiamento de crimes contra o Estado democrático de direito, o juiz, por iniciativa própria, a requerimento do Ministério Público, da Advocacia-Geral da União, ou mediante representação da autoridade policial, poderá ordenar a apreensão de bens e o bloqueio de contas bancárias e de ativos financeiros, em qualquer fase do processo ou ainda antes de oferecida a denúncia ou queixa.
A intenção é tornar a legislação mais clara, afastar questionamentos jurídicos sobre a adoção da medida e permitir que o juiz possa impor o bloqueio por conta própria, mesmo que não haja pedido do Ministério Público ou outra autoridade, ainda na fase inicial de investigação.
Leia também
Indícios veementes
O projeto prevê a inclusão do artigo 144-B no Código de Processo Penal. A medida vale tanto para pessoas físicas quanto empresas. Segundo a proposta, a apreensão e o bloqueio poderão recair sobre bens, contas bancárias e ativos financeiros de pessoas jurídicas “quando houver indícios veementes de que tenham sido utilizados pelo sujeito ativo para cometimento de quaisquer dos crimes contra o Estado democrático de direito”.
Para o governo, os ataques às sedes do Congresso Nacional, do Palácio do Planalto e do Supremo Tribunal Federal mostram que é preciso endurecer o combate aos movimentos golpistas.
“Os atos antidemocráticos ocorridos em 8 de janeiro de 2023, que culminaram em gravíssimos danos contra os Poderes do Estado e o patrimônio público, demonstraram que o tratamento penal conferido quando do cometimento dos crimes contra o Estado democrático de direito precisa ser mais severo a fim de que sejam assegurados o livre exercício dos poderes e das instituições democráticas, o funcionamento regular dos serviços públicos essenciais e a própria soberania nacional”, diz a justificativa do texto.
PublicidadeAutoria e circunstâncias
Ainda de acordo com o governo, a proposta pretende “fortalecer os instrumentos jurídicos disponíveis para a elucidação acerca da autoria e das circunstâncias dos crimes contra a soberania nacional, contra as instituições democráticas, contra o funcionamento das instituições democráticas, contra o funcionamento das instituições democráticas no processo eleitoral e contra o funcionamento dos serviços essenciais”.
O projeto pretende acelerar, tornar mais legítimo e estender ao juiz a decisão sobre o bloqueio de contas dos suspeitos de atentarem contra a democracia. A Justiça Federal já concedeu o bloqueio de bens e contas no valor de R$ 18,5 milhões de 134 investigados nos atos golpistas, a pedido da Advocacia-Geral da União. Na quarta-feira (8), a AGU solicitou a elevação desse montante para R$ 20,7 milhões, tendo em vista a atualização dos cálculos dos prejuízos provocados pela invasão à Câmara.
Os bloqueios foram determinados em três ações da AGU. Entre os alvos, estão sete presas acusadas de financiar o fretamento de presos por participar da depredação às sedes dos três Poderes. Há uma quarta ação dos advogados-gerais da União contra mais 42 detidos em flagrante nos atos, mas a Justiça ainda não decidiu sobre o assunto.
Pacote pela Democracia
O “Pacote pela Democracia” entregue por Flávio Dino a Lula em 26 de janeiro é formado ainda por uma proposta de emenda à Constituição, uma medida provisória e outro projeto de lei. Segundo o ministro, as iniciativas visam a coibir e acelerar a punição em caso de novos atentados contra as instituições, a exemplo dos praticados contra as sedes dos três Poderes em 8 de janeiro em Brasília.
Só após a conclusão da análise pela Casa Civil o pacote será enviado ao Congresso. A PEC prevê a criação de uma Guarda Nacional, permanente, à qual caberá proteger os prédios públicos de Brasília, a Esplanada e a Praça dos Três Poderes, e atuar em missões especiais em terras indígenas e áreas de fronteira.
Além do PL do bloqueio de bens, outro projeto de lei propõe aumento de pena para quem financiar ou organizar atos golpistas e antidemocráticos, além da tipificação de novos crimes, como o de atentado contra a vida dos presidentes dos três poderes.
A outra proposta, inicialmente prevista para ser apresentada como medida provisória, estabelece mudanças legais para criminalizar condutas na internet que configurem a prática de atentado contra o Estado Democrático de Direito, com a responsabilização de plataformas na internet que não derrubem publicações terroristas e antidemocráticas. O assunto, no entanto, poderá vir a ser tratado como projeto de lei por causa da polêmica em torno do assunto. Há possibilidade de o tema ser discutido em conjunto com o chamado PL das Fake News, relatado pelo deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) na Câmara.