As eleições municipais estão batendo à nossa porta. Estamos a menos de 15 dias de definir os rumos políticos dos municípios brasileiros ao escolhermos os prefeitos, vice-prefeitos e vereadores que estarão à frente dos Executivos e Legislativos municipais pelos próximos quatro anos a partir de janeiro de 2025. As campanhas a prefeito passam a dominar as ruas das cidades e as redes sociais com fotos e imagens dos candidatos além dos tradicionais jingles de campanha. No caso dos vereadores, como de costume, a visibilidade é mais desafiadora diante da imensa oferta de candidaturas (mais de 450 mil em 2024) frente ao menor volume de recursos para financiamento das campanhas. Destacar-se no meio da multidão é tarefa hercúlea na maioria dos casos. No entanto, há uma preocupação que antecipa a realização do pleito e em relação a qual é importante direcionar a atenção, a qual diz respeito à crescente taxa de alienação eleitoral nas últimas eleições, assunto que vez ou outra ganha a atenção nos meios de comunicação em função de uma suposta desmobilização da sociedade em relação às eleições, resultado de um desencantamento com a política representativa. A respeito disso, vale a pena problematizar o caso do cargo que é a porta de entrada na política brasileira, o de vereador. Justamente em função de um paradoxo interessante associado a ele. Explico!
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A alienação eleitoral diz respeito à somatória dos eleitores que, por diversos motivos, ou não puderam participar do pleito ou escolheram por não escolher ninguém. Portanto, inclui a abstenção eleitoral (eleitores que não compareceram às urnas) acrescido daqueles que optaram pelo voto branco ou voto nulo (votos inválidos). Em estudo de 2022, os professores Bruno Speck e Vitor Peixoto ao compararem as eleições para o Executivo e Legislativo nos três níveis federativos do país apresentaram as taxas do que definiram como “eleitores mobilizados”, ou seja, aqueles que decidiram ir votar em diferentes pleitos entre os anos de 1998 a 2020. A partir de dados agregados nacionalmente, identificaram um padrão nos ciclos eleitorais de eleições nacionais/eleições municipais (1998/2000; 2002/2004; 2006/2008; 2010/2012; 2014/2016 e 2018/2020) que chama a atenção: as eleições que mais mobilizam os eleitores são as municipais quando comparadas às nacionais. Achado intuitivo quando consideramos que os eleitores vivenciam os problemas do dia a dia a partir do município. Mas o mais interessante é quando analisam os dados por cargos representativos e chegam à conclusão de que as eleições para vereador são as que mais possuem votos válidos (eleitores que escolheram um candidato ou votaram na legenda), perdendo somente para o cargo de presidente da República. Em suma: as campanhas para vereador são extremamente importantes, pois além de competitivas são a segunda que mais mobilizam votos dos eleitores, mais até do que o cargo de prefeito, tido como a figura política mais importante da localidade.
Qual o paradoxo disso tudo? De modo geral, expressiva parcela dos eleitores não se lembra em quem vota para o Poder Legislativo. Por exemplo: para o Congresso Nacional, em 2022, o DataFolha havia apontado que 60% dos eleitores não se lembravam de quem haviam escolhido nas eleições nacionais anteriores, de 2018. No caso dos vereadores, embora não haja dados sistematizados para o país como um todo, na cidade de São Paulo 69% não se recordam da sua escolha para a câmara municipal nas últimas eleições municipais de 2020. Talvez o tamanho do município possa impactar positivamente na memória do voto dada a proximidade do eleitor com o político e, consequentemente, o incentivo para uma maior ou menor participação eleitoral, considerando que é nos municípios maiores que existe a tendência à uma maior alienação eleitoral do que em municípios menores, sobretudo puxada pelas abstenções eleitorais. Mas o custo da não participação ou da escolha por não escolher, deixando a cargo das preferências dos eleitores mobilizados, tem o seu significado.
O eleitor alienado é o desafio constante da democracia em termos de engajamento participativo e, ao mesmo tempo, a solução fácil para o político profissional experiente, o qual aposta na desmobilização para se beneficiar do voto de última hora, sem critérios e sem pesquisa prévia. É necessário superarmos esse hiato nas escolhas dos representantes do Poder Legislativo, sobretudo os vereadores, em relação aos quais mais se escolhe e menos se lembra. Quem não lembra, dificilmente acompanha e fiscaliza. Se não investe o mínimo de recursos para acompanhar e estar mais próximo, como superar a sensação de que há uma distância enorme entre representantes e representados? Em 2024 é possível fazer diferente: a começar por escolher participar, votar com consciência e acompanhar a atuação do representante. A democracia é um regime exigente para com o cidadão!
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