Na última segunda-feira (3) o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que deve colocar em pauta ainda este semestre o Projeto de Lei Complementar (PLC) do deputado Fábio Trad (PSD-MS) que prevê uma quarentena política para magistrados, membros do Ministério Público e das Forças Armadas.
Apesar da discussão sobre o tema ainda não ter tomado corpo entre os congressistas, membros da Frente Parlamentar de Segurança Pública, a chamada bancada da bala, vêm demonstrando insatisfação com a matéria e prometem trabalhar para obstruir as votações do projeto nas duas Casas.
O texto chama atenção porque pode barrar uma futura candidatura do ex-ministro Sergio Moro à presidência no pleito de 2022, uma vez que amplia de três para seis anos o tempo entre a atividade jurídica e política.
No entanto, as críticas ao texto vão além. De acordo com parlamentares ouvidos pelo Congresso em Foco, o projeto pretende criar “uma reserva de mercado” para políticos de carreira, relegando os militares à “cidadãos de segunda classe”.
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Para o deputado Capitão Augusto (PL-SP), o projeto é uma “aberração, preconceituoso e antidemocrático”. De acordo com o líder da bancada da bala, o projeto é uma forma de inibir e restringir a participação política de servidores públicos, principalmente dos militares. “Nós já chegamos em desvantagem em um pleito eleitoral porque a gente não pode ter filiação partidária, não pode ter nenhum tipo de atividade político-partidária. Concorremos com pessoas que estão na militância há vários anos com direitos, com partidos ajudando”, diz.
Na visão de Major Olímpio (PSL-SP), políticos de carreira vêm perdendo credibilidade diante dos eleitores. Para o senador, isso aconteceu em função “da derrocada da classe política, da perda de força dos sindicatos e do crescimento de policiais entrando nos pleitos. Neste momento, eles temem a concorrência”, defende. Ainda segundo o senador, nas bases eleitorais dos militares, o texto será visto como “mais um revanchismo contra as classes policiais”.
PublicidadePara Fábio Trad, não há qualquer propósito de se criar uma distinção entre policiais e “pessoas comuns”. O objetivo, diz, é “desigualar situações desiguais, para se atingir a igualdade, uma vez que policiais civis e militares detêm o controle do uso da violência legalizada e essa atribuição é prerrogativa exclusiva deles”.
Na opinião do deputado, “muitas vezes ela é utilizada com o objetivo político-eleitoral, como nas greves de policiais que, coincidentemente, são deflagradas em períodos pré-eleitorais, bem como na estruturação de milícias compostas, em regra, por policiais da ativa que cooptam territórios, sobretudo no Rio de Janeiro, com objetivos eleitorais”, salienta. Portanto, diz ,é uma necessidade jurídica para atingir o propósito de dar isonomia ao pleito eleitoral.
Poder de fogo
Mesmo tendo mais de 300 congressistas, a bancada da bala parece não ter poder de fogo suficiente para barrar o projeto e há chances de prosperar nas duas Casas. De acordo com fontes ouvidas pelo Congresso em Foco, desde sua criação em 2019, a Frente Parlamentar não se reuniu sequer uma vez para discutir projetos e temas de interesse.
Além disso, dizem os parlamentares, o texto do deputado Fábio Trad agrada desde os partidos de esquerda aos aliados de Bolsonaro justamente por frear candidaturas, como as de Sérgio Moro, do juiz Marcelo Bretas e de membros do Ministério Público, como o procurador Deltan Dallagnol, nomes reconhecidos e populares pelas atuações na Operação Lava Jato.
“Hoje, tanto o grupo do Bolsonaro, quanto o grupo da esquerda, capitaneado pelo PT, têm uma acomodação. Os dois já se escolheram um para ser adversário do outro em 2022. Está todo mundo de mãos dadas porque sabem que se o Moro entrar na parada, ele pode jogar areia na farofa seja do PT, seja do Bolsonaro”, diz Major Olímpio.
A proposta de Fábio Trad, no entanto, não deve retroagir, ou seja, não pode alcançar quem já deixou a magistratura, como é o caso do ex-ministro Moro. “A Constituição proíbe e existe dispositivo expresso no projeto nesse sentido”, diz o autor da proposta.
Ainda assim, os parlamentares protestam e dizem que essa parte do texto é interpretativa e que, em tese, caberia ao Supremo decidir sobre o tema, onde não haveria, na opinião dos deputados, “votos suficientes para reverter a situação”.
Fábio Trad argumenta que não há nenhum sentido em equiparar o texto com a Lei da Ficha Limpa, que o Supremo emprestou efeito de retroatividade. Isso porque “a Lei da Ficha Limpa trata de inelegibilidade e o projeto trata de desincompatibilização. São institutos jurídicos totalmente diferentes”, conclui.