A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal aprovou, por 18 votos a favor e nove contrários, o nome de André Mendonça ao cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). A indicação feita por Jair Bolsonaro à suprema corte deverá ser avaliada pelo Plenário do Senado, ainda nesta quarta-feira (1º).
A sabatina de André Mendonça durou cerca de oito horas, e contou com acenos do ex-ministro da Justiça à imparcialidade e ao Estado Laico. Pairavam dúvidas a respeito dos dois temas contra o sabatinado – que foi indicado por Bolsonaro como um ministro “terrivelmente evangélico”.
Ex-pastor evangélico e funcionário de carreira da Advocacia-Geral da União (AGU), Mendonça foi advogado-geral da União e ministro da Justiça e Segurança Pública no governo de Jair Bolsonaro. Ele é cotado para a vaga do ex-ministro Marco Aurélio Mello, que aposentou em julho deste ano. Para ser aprovado, o indicado também passará por uma votação secreta e precisa de pelo menos o quórum de 49 senadores a favor.
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A indicação foi relatada pela senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), escolhida pelo presidente da CCJ Davi Alcolumbre (DEM-AP), acatando a um pedido feito pelas bancadas evangélica e feminina. Nesta terça-feira (30), a senadora já havia apresentado um parecer favorável para a aprovação e afirmou que os questionamentos sobre a vertente religiosa de Mendonça não podem se sobrepor “ao debate da exigência constitucional do notório saber jurídico e da reputação ilibada”.
A indicação de Mendonça estava paralisada na CCJ por 141 dias. A demora em pautar a sabatina gerou críticas por parte de Bolsonaro e parlamentares governistas, que cobravam uma definição do presidente Alcolumbre.
Comprometimento com a democracia
Em discurso inicial, André Mendonça relembrou as passagens da sua carreira, família e saudou os parlamentares mortos durante a pandemia. O sabatinado afirmou que vai trabalhar na defesa do estado laico e democrático, sem manifestações religiosas na Corte.
“Embora eu seja genuinamente evangélico, não é espaço para manifestações públicas em sessões do STF. Na vida, a Bíblia. No Supremo, a Constituição”, afirmou.
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Entre um dos pontos polêmicos a serem abordados pelos senadores, Mendonça se antecipou e mostrou posicionamento sobre a prisão em segunda instância. Segundo ele, o tema deverá ser deliberado pelo Congresso Nacional.
“Sou adepto do princípio da segurança jurídica. Entendo que a questão está submetida ao Congresso, cabendo a esse deliberar sobre o tema”, disse.
O ex-AGU afirmou que é “garantista” e defende o respeito do processo legal, com direito de defesa e presunção de inocência.
“Reafirmo a preservação dos direitos e garantias fundamentais que se revelam ainda mais indispensável pelos membros do poder judiciário. Em especial pelos ministros da Suprema Corte do país. Juiz não é acusador e acusador não é juiz, bem como não se deve fazer pré-julgamentos”, declarou.
Aposta laica
A relatora, senadora Eliziane Gama, ressaltou a importância de ter um nome indicado ao Supremo que suscite o debate pelo Estado laico. Apesar de ser pastor, o sabatinado bateu na tecla pelo respeito às diferenças religiosas.
A senadora condiciona a religião de Mendonça a “grandes responsabilidades e compromissos com o Estado laico e a democracia”.
Eliziane preparou dez perguntas para o indicado ao STF, entre a rodada, a senadora o questionou sobre questões de política ambiental, diversidade de gênero e violência.
Se aprovado como ministro da Corte, Mendonça afirmou vai se comprometer na aplicação de uma legislatura determinada pelo próprio STF que enquadrou a LGBTfobia como crime de racismo.
“O meu comprometimento é também diante de situações como essa aplicar a legislação pertinente, inclusive na questão da própria decisão do STF que equiparou a ação dirigida a essa comunidade [LGQTI+] como racismo. Logicamente também com a ressalva trazida no STF em relação à liberdade religiosa, mas fazendo com o devido respeito a todas as pessoas”, justificou.
Ainda sobre a questão LGBT, Mendonça foi questionado sobe sua posição a respeito do casamento homoafetivo pelo senador Fabiano Contarato (Rede-ES). O parlamentar quis saber se André Mendonça, caso ocupasse cargo de ministro do STF, votaria favoravelmente ao casamento civil de pessoas do mesmo sexo.
O ex-AGU reiterou que, por mais conservador que seja, iria respeitar o direito constitucional ao casamento civil das pessoas do mesmo sexo.
“Os direitos civis de Vossa Excelência [Contarato] são os mesmos que os meus. O direito da família do senhor ser constituída, dentro daquilo que o senhor acredita, é o mesmo que o meu. Esses direitos têm que ser respeitados”, disse.
“Somos todos antifascistas”
O ex-ministro da Justiça foi questionado por Contarato e também por Rogério Carvalho (PT-SE) sobre a produção, pelo Ministério, de um dossiê contra policiais que se identificavam como “antifascistas” e seriam contra o governo de Jair Bolsonaro. O documento, revelado pela imprensa no ano passado, foi confirmado pela pasta como “ações de inteligência”, e teve sua produção suspensa por ordem do STF.
Ao responder sobre a sua ação no documento, Mendonça disse que auxiliou as autoridades sobre tais atos, que seriam anteriores à sua gestão. “Eu concordo com vossa excelência”, disse Mendonça, se referindo a Rogério Carvalho, “que todos nós somos antifascistas, e, diante daquele contexto, o que nós fizemos foi pedir ao CNJ e à Comissão Mista… para que corrigíssemos aquilo que não era adequado na visão não só daqui, do trabalho interno e do conhecimento interno próprio da área de inteligência, mas, principalmente, à luz da Constituição Federal.”
“Terrivelmente evangélico”
Ao colocar o nome de André Luiz de Almeida Mendonça em jogo, Bolsonaro agora cumpriu a promessa, de dois anos atrás, de indicar um ministro “terrivelmente evangélico” à corte. Após indicado, o presidente afirmou que só fez um pedido ao candidato: que ao menos uma vez por semana inicie uma sessão do STF com uma oração.
Mendonça ocupa cargos na administração pública desde o final dos anos 1990, como advogado da Petrobras. Desde 2000, está nos quadros da AGU, que entrou por meio de concurso. Em 2019, tomou posse como Advogado-Geral da União, cargo máximo da instituição e que e responsável pela assessoria jurídica ao governo federal.
Em abril de 2020, assumiu o Ministério da Justiça e Segurança Pública após a ruidosa saída de Sergio Moro do cargo. André Mendonça ficou no posto até março deste ano, quando foi substituído por Anderson Torres e voltou ao cargo de AGU.
Para ser aprovado, o nome de André Mendonça precisa de 41 senadores favoráveis no plenário da Casa.