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A ideia em um segundo
A instalação da CPI da Covid aumenta a incerteza na conjuntura política. O governo saiu perdendo nos passos iniciais – aprovação da instalação, composição, escolha do presidente e do relator. O risco de a CPI ser o fator a provocar o término antecipado do governo é baixo, mas o risco de a comissão manter o governo acuado e no modo reativo até o final do ano é bastante elevado, o que por si só compromete o projeto eleitoral de Bolsonaro.
Uma fábrica de salsichas
Você sabe como começa o processo legislativo, mas nunca sabe como termina. O processo de feitura de leis assemelha-se ao de fabricação de salsichas, na visão de Bismarck, diplomata e político prussiano do séc. XIX: é melhor não saber como são feitas. Bismarck, contudo, esqueceu-se que somos todos livres para escolher consumir ou não salsichas, mas não somos livres para escolher ou não obedecer às leis. Por essa razão, por mais que as vísceras do processo político possam causar repugnância, é importante conhecer o processo.
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Aumento da incerteza
O sistema político como um todo, e a democracia, em particular, é um regulador das incertezas. Cria-se previsibilidade para o comportamento humano que, de outro modo, desde que nos livramos, como espécie, das amarras do instinto, resultaria caótico e, fatalmente, em uma guerra de todos contra todos (Thomas Hobbes).PublicidadeA instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) aumenta a incerteza presente no sistema. Por isso resulta em um aumento geral de ansiedade, pois todos querem o mais rapidamente e mais precisamente possível absorver o significado da novidade, para conseguir acomodá-la no quadro de expectativas. Em termos práticos, a CPI é um fato novo e, apenas por isso, já não seria possível ignorá-la.
Resistência governamental
CPIs são instrumentos de minoria. Por isso, seja agora, com a CPI da Covid, seja em qualquer outra circunstância, os governantes de ocasião são contra a instalação de CPIs. Como já dito, as Comissões aumentam a incerteza. E, de fato, reúnem poderes que tornam difícil para o governo manter uma gestão sobre a condução dos trabalhos.
A convocação de ministros, por exemplo, é prerrogativa das comissões permanentes das Casas Legislativas. Todas as vezes em que é tentada ou realizada, ocorre grande resistência (esse talvez seja um dos momentos mais estressantes para as assessorias parlamentares dos ministérios) e muitas vezes a convocação fracassa. Por vezes, mesmo depois de aprovada, como em caso recente em que a convocação do Ministro da Defesa, já aprovada pela Comissão, foi anulada pela Presidência da Câmara em manobra regimental.
No contexto de uma CPI, a convocação de ministros e quaisquer autoridades se torna muito mais provável e fácil de ser aprovada. Como se verificou logo no início dos trabalhos da CPI da Covid, que já convocou todos os ex-ministros da Saúde do governo Bolsonaro, bem como o atual.
Os poderes da CPI da Covid
Regimento Interno do Senado Federal, Art. 148. No exercício das suas atribuições, a comissão parlamentar de inquérito terá poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, facultada a realização de diligências que julgar necessárias, podendo convocar Ministros de Estado, tomar o depoimento de qualquer autoridade, inquirir testemunhas, sob compromisso, ouvir indiciados, requisitar de órgão público informações ou documentos de qualquer natureza, bem como requerer ao Tribunal de Contas da União a realização de inspeções e auditorias que entender necessárias.
Falando sério
O termo inquérito não é por acaso e remete à legislação processual penal. As testemunhas ouvidas em uma CPI o são “sob compromisso de dizer a verdade”. É diferente soltar um “todos queriam o pixulé do final do ano” em uma entrevista (Gen. Pazuello, em sua despedida do Ministério da Saúde, tentando explicar os motivos de sua saída) ou em uma CPI. No ambiente da Comissão, há consequências previsíveis para mentiras explícitas.Até por isso é muito comum que em CPIs as testemunhas ou depoentes optem por invocar o direito constitucional de ficarem caladas para não produzirem provas contra si mesmas. Ou, como está tentando Pazuello, busquem quaisquer desculpas para o não comparecimento.
Configuração
A configuração da CPI ficou ruim para o governo. A praxe manda o governante de ocasião tentar evitar a CPI. Uma vez instalada, entretanto, o comando é minimizar danos, buscando influenciar na composição dos membros e, sobretudo, na mesa da Comissão.
São 11 membros – sete independentes ou de oposição e quatro governistas. E a Mesa foi escolhida com membros de oposição ao governo. A escolha do relator, particularmente, foi danosa ao Planalto.
Renan Calheiros teve vários embates públicos com Jair Bolsonaro, a começar pela influência para sua derrota na disputa com Davi Alcolumbre pela presidência do Senado. Não é por menos que o governo tentou obstinadamente evitar que fosse escolhido relator, tendo inclusive recorrido à Justiça por meio de uma deputada aliada. Tiro que saiu pela culatra – não alcançou seu objetivo e serviu apenas para acirrar os ânimos.
Riscos efetivos
Com tudo o que foi dito, os riscos efetivos da CPI para o governo são baixos (considerando-se aqui o evento de término antecipado do governo via processo de impeachment). As CPIs se multiplicam e há poucas consequências efetivas. Lembra-se muito da CPI do Collor, mas também ali a CPI proporcionou um ambiente propício, mas o verdadeiro detonador do fim do mandato do Presidente foi a histórica entrevista de seu irmão à revista Veja.Os riscos de desgaste, entretanto, são altos. A CPI tem visibilidade garantida na mídia e o tema será relembrado continuamente às pessoas durante seu período de duração.
Timing ruim para o Planalto
A duração, por sua vez, tem chance elevada de ser prorrogada. Na perspectiva da oposição, uma prorrogação por iguais noventa dias da Comissão, levaria seu desenlace para próximo do final do ano. Momento em que Bolsonaro esperava ter boas notícias – o avanço da vacinação com a consequente redução de casos e mortes por conta da pandemia e uma melhoria mais pronunciada da economia. Um segundo semestre de 2021 mais positivo seria excelente trampolim para o presidente dar a largada oficial no projeto de reeleição em 2022.
A CPI pode fazer com que esse cenário não aconteça na forma idealizada. Se mantida até meados do segundo semestre, com repercussões até o final do ano, a comissão pode manter o governo nas cordas em um momento importante de definições.
No final das contas, é disso que se trata a CPI da Covid: a mistura de política e pandemia e de pandemia e política.
Termômetro
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Geladeira
O projeto de uma reforma tributária ampla agoniza na Câmara dos Deputados e o que deve prosperar é o que alguns parlamentares chamam de “puxadinhos tributários”. O presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), encerrou a comissão da Casa destinada à reforma e faz o movimento de esvaziar a comissão mista destinada ao mesmo objetivo. Com isso, ganha força a opção por mudanças pontuais indicadas por Paulo Guedes. Divergências políticas entre Lira e Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), que relatava o texto da reforma, colaboraram para os últimos acontecimentos.
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Chapa quente
Nas últimas semanas, o governo conseguiu avançar nas privatizações – um dos pontos fundamentais da campanha liberal de Jair Bolsonaro, capitaneada pelo então Posto Ipiranga Paulo Guedes. Os resultados recentes que o governo tem comemorado são a privatização da Cedae (Companhia Estadual de Água e Esgoto do Rio de Janeiro) – que rendeu R$ 22,7 bilhões, a concessão de 22 terminais aeroportuários, por R$ 3,3 bilhões, e a aprovação de rito de urgência ao projeto de venda dos Correios.
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O Farol Político é produzido pelos cientistas políticos e economistas André Sathler e Ricardo de João Braga e pelo jornalista Sylvio Costa. Edição: Edson Sardinha. Design: Vinícius Souza.
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