Vagabunda, assassina, terrorista, bandida e louca. Esses são alguns dos termos depreciativos que, segundo a deputada Sâmia Bomfim (Psol-SP), colegas e usuários das redes sociais já usaram contra ela ao longo de seus dois mandatos como deputada federal e outros dois anos como vereadora na capital paulista. Desde quarta-feira (14), Sâmia e outras cinco deputadas do Psol e do PT respondem a processo por quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética. Motivo: chamaram de “assassinos” deputados que apoiaram a aprovação do projeto do marco temporal das demarcações de terras indígenas na Câmara, no último dia 30. Entre a apresentação das denúncias individualizadas, a chegada das representações no Conselho de Ética e o sorteio dos relatores dos processos passaram-se menos de 24 horas.
Uma agilidade de que não se tem notícia na Casa. Enquanto isso, pedidos de cassação contra deputados acusados de incitar e participar dos atos golpistas repousam na gaveta do presidente Arthur Lira (PP-AL) há quatro meses. A celeridade com que Lira encaminhou as ações e o objeto das denúncias, apresentadas pelo PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, trouxeram ao centro do debate uma expressão ainda pouco conhecida que remete a uma prática histórica no país: a violência política de gênero, transformada em crime pela Lei 14.192 em 2021. De acordo com a norma, “considera-se violência política contra a mulher toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir, obstaculizar ou restringir os direitos políticos da mulher”. A pena prevista é de um a quatro anos de reclusão e multa.
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Dois pesos e duas medidas
Em entrevista exclusiva ao Congresso em Foco, a deputada avalia que o machismo cresceu na Câmara na atual legislatura em comparação aos quatro anos anteriores graças, em grande parte, à conivência de Arthur Lira. “Ele tenta colocar um sinal de igual entre aquele sujeito [Nikolas Ferreira] que vai para a tribuna, coloca uma peruca ofendendo mulheres trans, que são deputadas pela primeira vez este ano, e deputadas que se manifestaram contrariamente ao marco temporal, que utilizaram um termo que um ou outro deputado não gostou, genocida. Mas todo dia sou chamada de vagabunda, assassina, terrorista, bandida e louca. Sou desqualificada o tempo todo, inclusive com ameaças de morte nas redes sociais, o que nunca foi feito diretamente por um deputado, mas que indiretamente é estimulado por eles. E nunca teve nenhum tipo de punição. Agora seis mulheres são denunciadas de uma vez”, critica.
Veja o trecho da entrevista em vídeo:
PublicidadeAlém de Sâmia Bomfim, também são alvo da representação, pelo mesmo motivo, as deputadas Talíria Petrone (Psol-RJ), Fernanda Melchionna (Psol-RS), Célia Xakriabá (MG), Erika Kokay (PT-DF) e Juliana Cardoso (PT-SP). Nenhum dos deputados que também chamaram colegas de assassinos, durante a manifestação, foi denunciado.
Microfone cortado
Uma das principais representantes da base governista na CPI do MST, Sâmia também ensejou um pedido de investigação do Ministério Público por violência política de gênero. No final de maio, a deputada teve o microfone desligado pelo presidente da comissão, deputado Tenente-coronel Zucco (Republicanos-RS), ao falar sobre os atos golpistas de 8 de janeiro. Zucco é investigado por participação nos atos. Esta não foi a única interrupção. Ela afirma que teve sua palavra cortada ao menos seis vezes dentro da CPI. Por causa dessas interrupções, o Ministério Público Federal pediu a abertura de processo para apurar se houve crime de violência política de gênero contra a deputada por parte da cúpula da comissão de inquérito. A PGR ainda não se pronunciou.
Sâmia tem sido uma das principais porta-vozes do governo na CPI, chamada por ela de “farsa”. “É um tiro no pé a condução que eles estão fazendo na CPI, tanto por parte do presidente quando do relator, mas que tem amparo dos demais membros do bolsonarismo, com muito autoritarismo e arbitrariedade na definição de quais requerimentos entram na pauta ou não, sem nenhuma justificativa. Marcam uma diligência nem sequer dizer de que forma ela vai se dar, como vai ser a programação”, reclama. “É tudo um palco armado para likes nas redes sociais, mas que acho que está tendo efeito reverso. Tem sido um tiro no pé para eles”, emenda.
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Apoio a Boulos
Ainda na entrevista, Sâmia Bomfim afirma que o fato de a bancada do Psol ter votado algumas vezes contra a orientação do governo, como no caso do arcabouço fiscal, não pode ser usado como subterfúgio pelo PT para descumprir o acordo firmado entre os dois partidos ano passado. Guilherme Boulos retirou sua candidatura ao governo de São Paulo em favor de Fernando Haddad em troca do apoio do PT ao seu nome para a prefeitura da capital em 2024. Dirigente do PT, o ex-deputado Jilmar Tatto defendeu que o acordo fosse rompido por causa da postura do Psol na Câmara. “Não vejo nada disso como real. Acordos costumam ser cumpridos. Nossa parte foi cumprida. Precisa a segunda parte ser cumprida”, defende.
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