As articulações para a votação da reforma tributária trouxeram a Brasília não apenas governadores e prefeitos, que temem perder arrecadação e autonomia com as novas regras, mas também representantes de vários segmentos do setor produtivo. Entre eles, o de serviços, um dos mais críticos à proposta em discussão na Câmara.
Entidade que representa 1,8 milhão de empresários paulistas, a FecomercioSP tem feito corpo a corpo com parlamentares para que não aprovem a reforma neste momento. “Temos uma perspectiva de aumento da carga tributária para o setor. Mas estamos em voo cego. Ainda não há texto final. Não sabemos ao certo quanto vamos pagar. Estamos aqui para conscientizar os deputados”, disse ao Congresso em Foco Sarina Manata, porta-voz da FecomercioSP para a reforma tributária.
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A assessora jurídica reclama da falta de números que comprovem a tese do relator, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), de que o segmento não será prejudicado. O receio é que, com as novas regras, o setor de serviços tenha sua carga tributária elevada em até 171%. “Os empresários apontam dois caminhos: alguns vão conseguir repassar o aumento para o consumidor final; outros não vão conseguir e terão de diminuir sua margem de lucro, o que certamente vai gerar mais desemprego”, afirmou Sarita. Aguinaldo ainda faz ajustes no texto, que só deverá ser apresentado em sua versão final no plenário.
Considerado o maior empregador do país, o setor engloba todos os tipos de prestações de serviço, como comércio, transportes, planos de saúde, escolas, restaurantes e bares. É responsável por dois terços dos empregos e 70% do PIB.
O texto em discussão prevê a substituição de cinco tributos (IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS) por uma Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), gerida pela União, e um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a cargo de estados e municípios. Também será criado o Imposto Seletivo.
De acordo com a FecomercioSP, a criação dos dois impostos sobre consumo (IVA dual) é o ponto que mais traz incertezas para o setor de serviços. Uma delas, por exemplo, é sobre a alíquota definitiva a ser adotada para o novo tributo subnacional previsto no IBS.
Publicidade“A Federação vê esse ponto com preocupação, já que as atuais alíquotas dos dois tributos são de 18% para o ICMS e de 5% para o ISS, e cálculos simples já apontaram, justamente, para o aumento da carga tributária sobre setores relevantes da economia”, apontou a entidade em nota divulgada nesta terça.
O texto preliminar de Aguinaldo Ribeiro prevê alíquotas diferenciadas para segmentos específicos dos serviços, como educação, saúde e transporte público. Para a FecomercioSP, a medida é insuficiente, já que se aplica apenas a algumas atividades, e as empresas do setor, de uma forma geral, têm na folha de pagamentos a sua principal despesa — e ela não dá direito a créditos dentro do regime tributário.
A federação ainda reclama do limite imposto às transferências de créditos dos negócios com micro e empresas de pequeno porte. “O texto estipula que apenas o montante cobrado dentro do regime único pode ser transferido como crédito. No sistema atual, essas empresas podem transferir créditos integrais de PIS e Cofins, e não apenas o valor devido no Simples Nacional”, segundo o comunicado.
Segundo a entidade, para não perder competividade e continuar transferindo crédito integral, micro e pequenas empresas terão de recolher os novos tributos como uma empresa grande. “Para a FecomercioSP, trata-se de um problema, porque, além de terem que pagar mais impostos, ainda precisarão arcar com os custos de obrigações acessórias que não fazem parte do orçamento atual delas. É uma regra que vai na contramão do tratamento favorecido para esse tipo de negócio, vital para a economia brasileira.”
A porta-voz da FecomercioSP defende que a reformulação do sistema tributário deveria ser feita por lei, e não por mudança constitucional. “A discussão poderia ser infraconstitucional se unificassem o ISS e o ICMS. Poderiam começar melhorando esses tributos que a gente conhece. Queremos simplificação, e não uma complicação. Deveríamos melhorar a legislação existente para depois evoluirmos para uma reforma”, disse Sarita Manato.
O Congresso em Foco procurou a assessoria de Aguinaldo Ribeiro para comentar as críticas da FecomercioSP. Caso haja manifestação, este texto será atualizado. Por se tratar de uma proposta de emenda à Constituição, o texto precisa do apoio de pelo menos 308 dos 513 deputados, em dois turnos de votação, antes de passar ao Senado. O Congresso discute há cerca de 30 anos uma reforma tributária.