Idealizada pelo presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, a PEC 65/2023 ligou alerta entre os servidores da instituição. Tramitando no Senado, a proposta prevê a transformação da autarquia em uma empresa pública, aumentando o seu grau de independência em relação ao controle governamental e flexibilizando seus regimes contratuais.
Segundo o sindicato da categoria, essa autonomia representa um risco para a instituição, enfraquecendo mecanismos de controle de interesse da própria população. Essa não é apenas a posição da cúpula do sindicato, mas também de 74% dos servidores, que votaram a favor da rejeição do texto quando apresentado em uma enquete no final de março.
A PEC 65 foi construída por Campos Neto com diretores do BC, sem a participação dos servidores ou de seus representantes. Ela adota na instituição um regime de plena autonomia orçamentária e financeira: se aprovada a PEC, o banco passa a operar a partir de recursos próprios e a adotar seus próprios critérios para realização de contratos e gestão de pessoal, podendo inclusive terceirizar suas atividades, aproximando do modelo adotado pelo Federal Reserve, nos Estados Unidos.
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A tese adotada por Campos Neto e pelos 42 senadores que assinam a proposta é a de que, com maior autonomia, o BC passa a conseguir seus próprios meios para financiar suas atividades, e assim fica livre de eventuais constrangimentos orçamentários ao adotar políticas que contrariem os interesses do governo. A discussão ocorre em um momento de atrito da autarquia com o Executivo, que se queixa da demora na redução da taxa de juros.
Segundo o presidente do Sindicato Nacional dos Funcionários do BC (Sinal), Fabio Faiad, a proposta chega cercada de riscos para a própria instituição. “A PEC, além de muito mal redigida, flexibiliza processos licitatórios, compromete a independência dos funcionários e praticamente acaba com o regime estatutário”, alertou.
Dentre as críticas à proposta, está a de que a independência do BC poderia submeter o controle cambial brasileiro a interesses privados, ameaçando inclusive o controle da inflação. Faiad, por outro lado, considera cedo demais para incluir esse como um risco provável para a PEC. “Não é impossível que aconteça, mas essas propostas sempre passam por muitas mudanças no Congresso, então é difícil saber como o relatório no Senado vai tratar dessas questões”, apontou.
PublicidadeFaiad afirma que a ideia de aumentar a autonomia do BC não é, em si, um problema na visão do Sinal, desde que seja mantido o regime de autarquia, aproximando-se dos modelos adotados no Tribunal de Contas da União e na Defensoria Pública da União.
Sem apoio do governo
Apesar de a proposta ter recebido um grande número de assinaturas no Senado, ela não conta com apoio do governo. “Existe uma resistência muito grande dentro do PT. A própria presidente do partido, Gleisi Hoffmann (PT-PR), se pronunciou criticando a PEC. Lindbergh Farias (PT-RJ) também falou contra. Ainda não conseguimos falar com Fernando Haddad [ministro da Fazenda], mas ele já deu entrevistas em que disse ser contra o texto”, afirmou Faiad.
A Advocacia-Geral da União (AGU) também é contrária à proposta, alegando haver vício de iniciativa, uma vez que a PEC não foi apresentada por um representante do Executivo e sim pelo próprio presidente da autarquia.
Essa resistência do governo, porém, tem alcance limitado: dentre as 42 assinaturas da PEC, 20 vieram de senadores de partidos da base, respectivamente PSD, União, MDB e PSB. Isso inclui o próprio presidente da Comissão de Constituição e Justiça, Davi Alcolumbre (União-AP). O texto se encontra sob relatoria de Plínio Valério (PSDB-AM), também apoiador da proposta.
Confira a seguir os signatários da PEC:
Vanderlan Cardoso (PSD-GO)
Rogerio Marinho (PL-RN)
Davi Alcolumbre (UNIÃO-AP)
Wilder Morais (PL-GO)
Ciro Nogueira (PP-PI)
Laércio Oliveira (PP-SE)
Alessandro Vieira (MDB-SE)
Senadora Damares Alves (REPUBLICANOS-DF)
Eduardo Gomes (PL-TO)
Rodrigo Cunha (PODEMOS-AL)
Zequinha Marinho (PODEMOS-PA)
Nelsinho Trad (PSD-MS)
Mecias de Jesus (REPUBLICANOS-RR)
Fernando Farias (MDB-AL)
Eduardo Girão (NOVO-CE)
Jorge Seif (PL-SC)
Flávio Bolsonaro (PL-RJ)
Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB)
Angelo Coronel (PSD-BA)
Fernando Dueire (MDB-PE)
Plínio Valério (PSDB-AM)
Marcos do Val (PODEMOS-ES)
Cleitinho (REPUBLICANOS-MG)
Hamilton Mourão (REPUBLICANOS-RS)
Oriovisto Guimarães (PODEMOS-PR)
Styvenson Valentim (PODEMOS-RN)
Confúcio Moura (MDB-RO)
Flávio Arns (PSB-PR)
Sergio Moro (UNIÃO-PR)
Astronauta Marcos Pontes (PL-SP)
Otto Alencar (PSD-BA)
Senadora Eliziane Gama (PSD-MA)
Senadora Tereza Cristina (PP-MS)
Jayme Campos (UNIÃO-MT)
Chico Rodrigues (PSB-RR)
Esperidião Amin (PP-SC)
Efraim Filho (UNIÃO-PB)
Dr. Hiran (PP-RR)
Wellington Fagundes (PL-MT)
Giordano (MDB-SP)
Lucas Barreto (PSD-AP)
Senadora Margareth Buzetti (PSD-MT)