A implementação do piso nacional da enfermagem, uma reivindicação da categoria que se estende há mais de um ano entre idas e vindas no Congresso Nacional, se transformou em pólvora nas discussões entre os líderes parlamentares após o adiamento da sessão do Congresso Nacional, que seria realizada nesta terça-feira (18). Defendido tanto por aliados do governo quanto pela oposição, o novo piso foi usado como argumento para que a reunião do Congresso fosse adiada e, com isso, postergasse a leitura do requerimento de abertura da CPMI dos atos golpistas de 8 de janeiro.
O adiamento se deu por recomendação dos líderes governistas, que avisaram Pacheco sobre a iminência da chegada do projeto de lei do Congresso Nacional que regulamenta a implementação do piso salarial da enfermagem. Sem uma sessão prévia na Comissão Mista do Orçamento (CMO), o projeto não poderia ser levado a votação na sessão conjunta. Aguardar a reunião da comissão poderia dar celeridade à aprovação da lei do piso. O governo depende da aprovação do novo arcabouço fiscal, que ainda não chegou na Casa, para pagar o piso.
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Para a oposição, o pedido do governo baseado no piso da enfermagem foi uma cortina de fumaça, utilizando um projeto de interesse comum entre o Legislativo e a sociedade para evitar a CPMI. “Esse adiamento claramente é uma manobra do governo, que pretende aproveitar esse período de tempo para tentar cooptar senadores para que retirem as suas assinaturas, demonstrando um medo, um temor e um pavor que para nós parece inexplicável”, disse em coletiva de imprensa o líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN).
Marinho avalia que o interesse de Pacheco no adiamento foi em dar um gesto de agrado à maioria que o elegeu como presidente do Senado, mas ressalta que esta não deixa de ser uma competência privativa dele. Altineu Côrtes (PL-RJ), líder da oposição na Câmara, já considera que o senador mineiro descumpriu o acordo realizado na reunião de líderes de segunda-feira.
O adiamento se deu em um momento crítico para os parlamentares do PL. Na mesma data, o Supremo Tribunal Federal (STF) avalia as denúncias encaminhadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) pedindo a abertura de inquérito para investigar 100 supostos envolvidos nos atos de 8 de janeiro. Essas investigações podem atingir os três deputados que já se encontram em investigação no caso, o que inclui André Fernandes (PL-CE), propositor da CPMI.
A participação em uma CPMI, em especial na coordenação do colegiado, pode servir de proteção a esses parlamentares contra eventuais sanções vindas do STF. Com o adiamento, porém, o governo ganha uma semana a mais para tentar convencer parte dos signatários do requerimento a retirar suas assinaturas. O governo já teme que a instauração da CPMI possa obstruir a investigação que ocorre na justiça, além de servir como palanque garantido para a oposição.
Pacheco já afirma que o adiamento da sessão não compromete a leitura do requerimento. “Hoje faz 100 dias desses acontecimentos repugnantes que nós vivemos, e é natural que haja uma CPMI, bem como uma CPI em qualquer uma das casas”, apontou. O presidente do Senado garante que será feita a leitura do requerimento na próxima sessão.
Piso da enfermagem: a trajetória
A falta de implementação do piso da enfermagem tem sido alvo de críticas. Profissionais de enfermagem de diversos estados brasileiros têm realizado protestos contra a demora do governo em apresentar as medidas provisórias que garantem os recursos para tornar possível a implementação do piso salarial da categoria. Apesar de haver aceno positivo por parte do presidente Lula, o líder da Frente Parlamentar da Enfermagem, deputado Célio Studart (PSD-CE), considera que a implementação do piso da enfermagem não é prioridade do governo nesse momento.
A criação do piso salarial da enfermagem foi resultado de dois anos de articulação da categoria no Congresso Nacional, que precisou não apenas trabalhar junto ao parlamento para criar a lei para o piso. A aplicação foi suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que julgou necessária a especificação de uma fonte de custeio para os novos salários. A proposta do texto não vingou, e a lei do piso segue suspensa.
Para que o piso possa ganhar validade, é necessário que o governo publique uma medida provisória que garanta repasses ao setor filantrópico, estados e municípios para custear os aumentos salariais dos profissionais de enfermagem. Para isso, foi criado um grupo de trabalho interministerial para negociar de um lado com a categoria e do outro com representantes dos setores contratantes na elaboração da medida.
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