Lúcio Lambranho, Edson Sardinha e Eduardo Militão
Os terceiros secretários da Câmara na atual legislatura utilizaram a cota de passagens da Câmara para viagens de parentes. O atual ocupante do cargo, Odair Cunha (PT-MG), usou os créditos para bancar viagens da mulher pelo Brasil. O antecessor, Waldemir Moka (PMDB-MS), viajou com a mulher e as três filhas para a Europa e transportou o ex-deputado José Borba, um dos réus do mensalão, com a cota da Câmara enquanto ocupava a Terceira Secretaria.
Moka ainda debitou na conta da Câmara uma passagem de ida e volta com a mulher para Nova Iorque. Entre as atribuições da terceira-secretaria está a distribuição das cotas de passagem aérea para os 513 deputados.
O Ministério Público Federal encaminhou orientação à Câmara na última semana, reiterando que a cota não pode ser usada por terceiros, tampouco para qualquer atividade que não o exercício do mandato.
Há duas semanas, Odair Cunha disse que a cota só poderia ser usada para atividades do mandato. “A lei diz que é para atividade parlamentar. Por exemplo, se ele vem trazer um vereador, um prefeito para alguma reunião na Câmara, alguma audiência pública que tratar de algum tema específico, ele pode dar a passagem para esta pessoa porque aí está uma atividade parlamentar”, exemplificou o petista, em entrevista ao portal G1.
Família na Europa
No dia 9 de novembro de 2007, foram emitidos dez bilhetes, no valor total de R$ 53,02 mil em nome de Moka, da mulher, Geane Oliveira, e de três filhas do deputado, Welluma, Mariana e Irina Britto. O voo que levou a família à Europa partiu de São Paulo com destino a Milão, na Itália. O regresso à capital paulista se deu pelo aeroporto de Londres.
A Câmara ainda pagou a viagem, de ida e volta, de Geane a Nova Iorque. As passagens, no valor de R$ 1,8 mil, para a mulher do então terceiro secretário foram emitidas em 6 de agosto de 2008.
No dia 29 de abril de 2008, Moka cedeu parte de sua cota parlamentar para que o ex-deputado José Borba viajasse de Brasília a Londrina, com escala em Guarulhos e Curitiba. O bilhete custou à Câmara R$ 919,12.
Líder do PMDB na Câmara quando estourou o escândalo do mensalão, em 2005, Borba renunciou ao mandato para escapar do processo de cassação. Depois de trocar o PMDB pelo PP, Borba se elegeu prefeito de Jandaia do Sul (PR) em outubro do ano passado.
Em resposta encaminhada ao site, Moka admitiu ter usado o benefício da Câmara para viajar com a família para a Europa e para transportar o ex-colega. Por meio de sua assessoria, disse que cedeu a passagem a José Borba porque o paranaense é “ex-deputado e ex-líder do seu partido na Câmara”.
Em entrevista ao Congresso em Foco no início de março, Moka declarou que seu papel como terceiro secretário se restringia a garantir o repasse da cota mensal aos deputados. “A responsabilidade pela emissão das passagens aéreas é dos deputados”, alegou. “A terceira Secretaria só repassa os créditos para os deputados que são descontados nas companhias aéreas”, disse, na ocasião, o deputado do PMDB.
Como integrante da Mesa Diretora, ele tinha direito a receber, além do valor que cabe à sua bancada estadual, um acréscimo equivalente a 70% do que recebe um representante de Roraima, estado cujos parlamentares dispõem de maior ajuda para custear suas viagens.
Como ocorre a cada semestre, o benefício sofreu um reajuste no início do ano. Caso continuasse na Mesa Diretora, Moka teria uma cota mensal de R$ 27.054,87 em passagens aéreas para exercer o mandato. O valor é suficiente para bancar nove passagens, de ida e volta, à Europa todos os meses.
Viagens da mulher
O atual terceiro secretário, Odair Cunha, também cedeu 28 passagens da Câmara para que sua mulher, Ivanilda Vilas Boas Cunha, viajasse. Pela TAM, a esposa do deputado viajou 13 vezes. Oito entre Brasília e Belo Horizonte e outras quatro entre a capital federal e São Paulo. As passagens foram emitidas entre fevereiro e 2007 e agosto de 2008.
Outros 11 bilhetes foram emitidos em nome de Ivanilda pela Varig, entre fevereiro e novembro de 2008. Os trechos são Recife-Brasília, Recife-Belo Horizonte. Também há viagens entre Belo Horizonte e São Paulo e de Brasília até a capital paulista. Pela Gol, foram mais quatro passagens para a mulher do terceiro secretário. Três bilhetes entre Brasília e Belo Horizonte e outro entre a capital federal e Campinas (SP).
Procurado pela reportagem desde quinta-feira para comentar o assunto, Odair Cunha não se pronunciou até o momento da publicação. O Congresso em Foco enviou e-mail e telefonou, mas o terceiro secretário não se pronunciou.
O site aguarda explicações de Odair Cunha desde 5 de março, data da publicação de reportagem sobre o uso de uma passagem do deputado Carlos Abicalil (PT-MT) por Marco Antônio Bogéa, colaborador do empresário Fernando Sarney, investigado pela Polícia Federal.
Até o início da semana passada, o terceiro secretário resistia a mudar as regras sobre o uso de passagens aéreas pelos deputados. Embora admitisse que o benefício só poderia ser usado para “atividade parlamentar”, ele se recusava a propor limites para o conceito. “A atividade parlamentar é muito vasta”, disse ao portal G1.
A mãe do deputado, Alice Cunha, também ganhou duas passagens para viajar entre Brasília e Belo Horizonte, ida e volta, em novembro de 2007. Um dos bilhetes foi gerado por milhagem e outro custou para Câmara R$ 238,62.
Conforme mostrou o Congresso em Foco, o terceiro secretário é um dos cinco integrantes da Mesa que usaram a cota em viagens internacionais. Odair alega que cedeu as milhagens acumuladas em uma companhia aérea a um padre que voltava de Buenos Aires após participar de discussões sobre direito canônico. A taxa de embarque, no entanto, foi paga com a cota da Câmara.
Apenas em 2008, a Casa gastou R$ 78,5 milhões em passagens aéreas. O valor não inclui o que os parlamentares acumulam de milhagem. Mas esses bônus não são usados para abater o valor da cota mensal. Em geral, são convertidos em desconto para os parlamentares fazerem suas viagens particulares.
“A milhagem é um prêmio que cada deputado ganha nas companhias aéreas. Não vou dizer que o valor é baixo ou alto, mas acho que esse é um critério justo”, defendeu o antecessor de Odair, Waldemir Moka, em entrevista ao Congresso em Foco no mês passado.
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