O que o Congresso Nacional pode fazer para garantir que as promessas feitas na 26ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP26), na Escócia, sejam cumpridas? A conferência pode vir a ser um divisor de águas, marcando uma nova atitude do Legislativo e do Executivo em relação à forma de lidar com o tema da sustentabilidade? Essas e outras questões foram debatidas no Congresso em Foco Talk, nesta quinta-feira (11), pelos deputados federais Marcelo Ramos (PL-AM) e Professor Israel Batista (PV-DF) e João Capobianco, vice-presidente do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), professor e ambientalista que ocupou o cargo de secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente na gestão de Marina Silva. A mediação foi de Vanessa Lippelt, editora do Congresso em Foco.
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O primeiro entrevistado foi o deputado Professor Israel Batista (PV-DF), que abriu sua fala comentando sobre a ausência do presidente Jair Bolsonaro na conferência. Em sua percepção, a atual gestão é vista com preocupação pelas demais potências. Além de limitar a participação da sociedade ao tratar de questões ambientais e comprometer o Fundo Amazônia, o negacionismo ambiental de Bolsonaro não passou despercebido pelo mundo. “Há uma severa crítica ao fato de que o governo tentou desacreditar os fatos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, que aponta um aumento no desmatamento e nas queimadas desde 2019”, ressaltou.
O deputado também alertou para a mudança do papel do Brasil nos últimos anos ao lidar com questões ambientais. “Temos perdido projeção internacional, vivemos nesse momento uma crise de credibilidade muito grave, (…) já não somos mais uma potência verde”. A crise imagética do Brasil ganha força no momento em que Jair Bolsonaro apresenta discursos incompatíveis com a realidade enquanto apresenta mudanças que já foram prometidas em outros momentos.
João Capobianco acrescenta que o discurso assumido pelo presidente destoa do que costuma ser esperado do Brasil ao lidar com questões ambientais, tendo em vista que o país sempre foi protagonista da pauta ambiental no mundo. Além de não atender a demanda do mundo em seu discurso, o vice-presidente do IDS avalia que o governo não apresenta comportamentos que possam compensar o discurso negacionista.
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O papel do Congresso Nacional no avanço da pauta ambiental também foi citado em sua fala. Ao seu ver, apesar do esforço de alguns parlamentares na preservação do meio ambiente, o desempenho geral da Câmara é insatisfatório. “Infelizmente, hoje a Câmara dos Deputados vem sendo inimiga da pauta de sustentabilidade. Projetos absurdos vêm sido aprovados a toque de caixa”, declarou.
Israel Batista concorda que falta empenho para a pauta na Câmara, e considera que a solução está em uma educação voltada à promoção do debate ambiental. “A verdade é que o cidadão não tem informação o suficiente para entender como ele é afetado pela crise ambiental, como ele é afetado pelo aquecimento global, como ele está sendo prejudicado em prol da fortuna de poucos. Os políticos, portanto, não compreendem isso como um elemento da sua pauta que deva ser levado em consideração. A sociedade não cobra isso, isso não dá voto”, explicou.
Outro elemento de peso na Câmara que compromete projetos relacionados à preservação do meio ambiente, para o parlamentar, é a conjuntura da Bancada Ruralista. “A bancada que está ligada ao agronegócio está fora de sintonia com o que há de mais moderno no mundo sobre propostas de agricultura sustentável. O Brasil pode ser um exemplo desse tipo de agricultura. Nossa contribuição para o aquecimento está ligada ao agronegócio, a gente precisa entender isso”.
Capobianco é autor de um Projeto de Emenda Constitucional que estabelece a segurança climática como um direito fundamental no Brasil. Questionado sobre a importância do projeto diante da COP26, o presidente do IDS afirmou que, se aprovado, o projeto pode dar agilidade para outros projetos relacionados à preservação do meio ambiente. “Projetos necessários simplesmente são parados por interesses melhores”, apontou sobre o atual contexto no Congresso Nacional.
Mercado de Carbono
O último a entrar foi Marcelo Ramos, que falou inicialmente sobre a frustração da demora na tramitação de seu projeto que regulamenta o mercado de créditos de carbono no Brasil em pleno andamento da COP26. “É importante a gente entender que quando a gente fala da regulação do mercado de carbono, não estamos tratando apenas de uma questão de natureza de proteção ambiental. Estamos falando de um novo potencial econômico para um país com 15 milhões de desempregados. (…) É uma questão econômica importante”.
Marcelo Ramos destacou que o projeto inicialmente recebeu amplo apoio de órgãos governamentais, e que a Câmara cooperou como pôde com o Ministério do Meio Ambiente (MMA). Mais tarde, ao seu ver, interesses políticos fizeram com que o governo deixasse de apoiar o projeto. “Ao final, ficou claro que o problema do governo não era com o texto [do projeto]. O problema do MMA é que ele se manifesta contra a necessidade e urgência de um mercado regular no Brasil”, exclamou.
Ausência de Bolsonaro na COP26
Assim como Israel Batista, o vice-presidente da Câmara considera problemática a ausência de Bolsonaro na COP26. “A ausência do presidente tem o significado da ausência de alguém que não tem o que dizer, que se sente constrangido de ser questionado”, ponderou.
Durante a COP26, Jair Bolsonaro confirmou seu plano de se filiar ao PL, mesmo partido de Marcelo Ramos, que comentou sobre a decisão. Apesar de ainda não ter chegado a uma conclusão sobre seus próximos passos, Ramos deu uma resposta firme sobre sua postura diante do presidente: “Tem uma decisão que eu já tomei há um tempo, que é imutável e inegociável: eu não estarei no palanque do presidente Bolsonaro”.
Na mesma semana, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) entrou em um momento de crise, com uma debandada de larga escala de servidores às vésperas do Exame Nacional de Ensino Médio (Enem). Israel Batista comentou sobre o episódio. “Perdemos agora 37 servidores do Inep e o ministro da educação viajou por sete dias à Paris. Essa é a imagem do apagão que está sendo protagonizado pelo Ministério da Educação”, narrou. Ao seu ver, a instabilidade em políticas públicas é uma das marcas do atual governo.
Os dois parlamentares foram finalistas da última edição do Prêmio Congresso em Foco, e se pronunciaram sobre a premiação. “Ao mesmo tempo que me sinto honrado, isso não me envaidece, mas sim aumenta minha responsabilidade de bem servir ao Brasil”, declarou Marcelo Barros, vencedor na categoria de melhores na Câmara.