Presidente da Frente Parlamentar pela Reforma Administrativa, o deputado federal Tiago Mitraud (MG) admitiu ter baixas expectativas de que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 32/20 passe na Casa até o final deste ano. Mais do que o fato de este ser, ou não, um ano eleitoral, o entrave, na avaliação dele, é o próprio presidente da República, Jair Bolsonaro, que, completa, também pouco contribuiu com a efetividade de um programa de privatização dos “mantos sagrados” como definiu o parlamentar, citando a Petrobrás e o Banco do Brasil.
“Jair Bolsonaro nunca foi um liberal. O entrave é justamente esse, nós termos um presidente que não é liberal, um presidente que logo no início despriorizou uma agenda liberal para fazer acordos com setores do Congresso que nunca quiseram reformas verdadeiramente liberais”, disse.
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Recém empossado líder do Novo, Tiago Mitraud conversou com o Congresso em Foco sobre as expectativas para este ano, o último da legislatura que marcou a estreia do partido na Câmara. As estratégias para avançar nesses dois temas, isto é, enxugamento da estrutura funcional do Estado e privatizações, fizeram parte da conversa.
“Onda de greve foi gerada pelo próprio governo”
Mitraud também criticou movimentos grevistas encabeçados por parte do funcionalismo público na cobrança por reajustes salariais.
“Essa onda de greve foi gerada pelo próprio governo. Agora, o pessoal esquece o momento de crise econômica, esquece que a carreira do funcionalismo já tem salários muito acima da média aqui no Brasil, especialmente essas carreiras que estão ameaçando entrar em greve, dos auditores públicos, do Banco Central, que fazem parte da elite salarial. Após um período de pandemia onde muitos perderam emprego, quem está na elite do funcionalismo exigir aumento é uma insensibilidade”.
A série de ameaças de greve foi iniciada em janeiro por, dentre outras categorias, auditores da Receita Federal, médicos peritos do Instituto de Seguridade Social (INSS) e servidores do Banco Central, após o presidente Bolsonaro prometer reajuste apenas para as carreiras da segurança pública federais. A lei orçamentária de 2022 trouxe uma cifra de R$ 1,7 bilhão voltada à reestruturação salarial, mas não especificou de que forma seria usada.
Confrontado com números do Instituto de Pesquisas Econômicas (IPEA) de que a média salarial de um servidor da União era de R$ 6 mil, Tiago Mitraud rebate: “Seis mil reais não é um nível de renda médio do brasileiro, é um nível de renda alto. A renda média do Brasil é baixa, então quem tem média de salário de R$ 6 mil e estabilidade está acima da média”.
Durante a conversa o deputado também destacou as prioridades da sigla, que sinalizam para uma tentava de retomar o discurso do combate à corrupção e aos privilégios políticos, tema familiar às eleições de 2018.
“O Novo estará focado nas reformas não só na área econômica, mas em outra que foi deixada de lado esses anos que é o combate à corrupção e tem a PEC da 2ª Instância e a PEC do Foro Privilegiado”, completou.
“A reforma administrativa não é só a PEC 32”
Enquanto dá por quase frustrada a votação da PEC 32/20 ainda neste ano, Tiago Mitraud acredita em uma “corrida por fora” e esmiúça as matérias sobre as quais o partido Novo deverá exercer pressão para fazer caminharem na Casa.
“A reforma administrativa vai muito além da PEC 32. Ela é uma peça importante desse quebra-cabeças, mas é só um dos projetos que precisa ser aprovado”, disse citando ao menos três que de acordo com o deputado têm chances reais de irem à plenário neste primeiro semestre.
São eles o PL dos supersalários (PL 6786/16); o PL de modernização – ou padronização – dos concursos públicos (PL 252/03); e o PL que institui a Lei da Meritocracia (PLP 409/14).
Tiago Mitraud destaca, no entanto, que dois exigem articulação das comissões de Constituição e Justiça do Senado – no caso dos supersalários – e da Câmara – no caso do PL dos concursos.
“O que está mais avançado é o dos supersalários. Agora o texto está com Davi Alcolumbre (DEM-AP), na CCJ do Senado, e falta designar o relator. Então é o mais avançado, mas tem a pressão do judiciário para segurar a tramitação dele. Mas se for colocado em votação ele é aprovado pela pressão da sociedade”, avaliou.
O líder do Novo também adianta ter expectativa para o envio, ainda este semestre, de propostas do Ministério da Economia para reformulação de carreiras. “Uma vez que a legislação brasileira está muito defasada em relação à sua gestão pública a gente precisa de outros projetos e o Ministério da Economia já sinalizou a intensão de enviar projetos para a reformulação do sistema de carreiras e do sistema remuneratório”, completou.
“Nem uma fração do que foi privatizado nos anos 1990″
Durante a entrevista, o líder do Novo na Câmara, Tiago Mitraud, críticou acidamente a política de privatizações do governo Bolsonaro. De acordo com ele, uma vez eleito, Bolsonaro não demorou a abandonar o discurso liberal. Entretanto, ao mesmo tempo em que lamentou o fracasso em privatizações de grandes empresas como Banco do Brasil e Petrobras, o deputado reconheceu avanço no repasse de estatais menores.
Mitraud comparou as ações do governo ao período Fernando Henrique Cardoso (1995-2003). “Bolsonaro, que se elegeu com um discurso liberal, não conseguiu privatizar nem uma fração do que foi privatizado nos anos 1990″.
Apesar disso, reconheceu avanços, “tímidos” como classificou, e observou que, na ausência de um programa amplo de privatizações, as ações têm sido feitas em volume, mas de maneira pontual, sem que ganhem destaque.
“Tem muita coisa acontecendo até abaixo do radar, como a alienação de vários imóveis da União que já estão há muito tempo em desuso, algumas companhias como a CBTU sendo fracionadas para facilitar… Então, tem algumas questões menores. E das grandes estatais, a Eletrobras e Correios, onde eu vejo possibilidade de avançar. Agora, é um programa tímido, e eu acredito que o mínimo que deveria ser feito. A gente ainda não discute os mantos sagrados de Petrobras, Banco do Brasil, Caixa Econômica que, a meu ver, deveriam fazer parte de um plano de privatizações”, disse.
Ele também apontou para a falta de vontade do Congresso discutir este assunto, fazendo com que a pauta de fique restrita, às concessões de infraestrutura, algumas subsidiárias de estatais.
O ano de 2021 encerrou em meio a expectativas para o andamento da privatização dos Correios e da Eletrobras. Ambas entraram na agenda de prioridades do governo para este ano divulgada no início da semana.
A Eletrobras é a que se encontra com os processos para abertura ao capital privado mais avançada, entretanto, a capitalização da empresa está sob análise do Tribunal de Contas da União (TCU). O órgão apura um erro bilionário no cálculo de outorga da empresa, que levariam a uma subvaloração da venda.
Já a capitalização dos Correios esbarra na falta de base no Senado. A Câmara havia concluído a votação da matéria em agosto do ano passado, mas o texto não seguiu para votação na Casa vizinha.
Índice de governismo do Novo
O Novo obteve registro oficial em 2015 e nas eleições seguintes fez-se sob bandeiras do reformismo para um Estado “enxuto” e do liberalismo econômico. A sigla chegou a ter candidato à Presidência em 2018 – João Amoedo, que após ficar em quinto lugar na disputa, declarou apoio a Jair Bolsonaro. Mais do que Bolsonaro, no entanto, o grupo se fiava nas promessas de Paulo Guedes, já anunciado, à ocasião, ministro da Economia.
Em março de 2021, uma diretriz partidária enviada a todos os filiados e publicada em rede social, anunciava o rompimento com o governo e que, a partir de então, a sigla seguiria de forma “independente” na Câmara dos Deputados.
Quase um ano depois, em fevereiro de 2022, o Novo registra um índice de governismo de 77%, conforme levantamento do Radar do Congresso. Mitraud foi o integrante da bancada que menos votou com o governo, mas ainda assim, manteve-se próximo da média, acompanhando a situação em 76% das vezes.
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