Após a conclusão do processo eleitoral de 2024 começou a se firmar a possibilidade do presidente Lula realizar uma nova reforma ministerial. Estabelecido o peso político dos novos atores saídos das eleições, impõe-se a adequação de estratégias que fortaleçam o atual presidente para o jogo eleitoral de 2026, seja objetivando sua reeleição ou elegendo um sucessor de sua preferência.
As especulações sobre mudanças na direção dos Ministérios não se transformaram em certeza até o final do ano passado. Urge melhorar a aprovação do governo, visto que já transcorreu metade do mandato de Lula e as pesquisas mostram que o descontentamento da população com o governo é crescente. O empate entre aprovação e desaprovação manifestado em dezembro de 2024 deu lugar a um aumento da desaprovação em janeiro de 2025. A intenção é entregar resultados que modifiquem positivamente a percepção da população e para isso é necessário sintonia e eficácia das pastas ministeriais, assim como o apoio da base partidária no Congresso.
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A cooperação dos aliados nos ministérios também facilita o acesso do presidente aos municípios, que se constituem em palco de campanhas durante as eleições. Partidos de centro-direita e direita saíram fortalecidos das eleições municipais em um ranking liderado pelo PSD, seguido pelo MDB, PP, União Brasil, PL e Republicanos. Somados esses partidos têm o controle de mais de quatro mil municípios, enquanto o partido do presidente ficou em 9º lugar com 252 prefeituras, pouco mais da metade das prefeituras do Republicanos e cerca de um quarto do número de prefeituras do PSD. Abrir espaço de campanha em âmbito local é uma necessidade incontornável.
A reforma que Lula fará, leva em conta o peso de atores partidários centrais para as decisões que ocorrem no Legislativo, os mesmos partidos que mostraram força eleitoral durante as eleições municipais. Nos dois maiores blocos partidários na Câmara dos Deputado as cadeiras de partidos de direita e centro-direita somam 307 votos, onde os partidos União Brasil (59), PP (50), Republicanos (44), Podemos (14), PSD (44) e MDB (44) têm número suficiente para, juntos, bloquearem as propostas do Executivo. Esses são os atores que o presidente precisa agradar, partidos que compõem o chamado centrão – agente suprapartidário informal, cujos membros manifestam um apetite insaciável por verbas e cargos.
Não é a primeira vez que Lula tenta acomodar os interesses do centrão, em 2023 ocorreu a troca de Daniela Carneiro (Ministério do Turismo) por Celso Sabino (União Brasil), de Ana Moser (Ministério dos Esportes) por André Fufuca (PP) e Silvio Costa Filho (Republicanos) ocupou o lugar de Márcio França (PSB) no Ministério de Portos e Aeroportos. Desde a estruturação ministerial montada no início do mandato que acompanhamos a batalha do governo eleito para agradar gregos e troianos do espectro político partidário. Em janeiro de 2023, o relatório do deputado Isnaldo Bulhões (MDB) à MP 1.154/2023 frustrou expectativas do Ministério do Meio Ambiente e Mudanças do Clima e do Ministério dos Povos Indígenas, retirando-lhes atribuições que desagradavam os partidos do centrão.
No presidencialismo brasileiro as decisões de governo são compartilhadas com os partidos que formam a coalizão governamental. Na configuração desse arranjo a distribuição de pastas ministeriais aos partidos da coalizão é elemento básico para selar o compromisso necessário ao apoio partidário no Congresso. A reforma ministerial que se avizinha visa dar maior espaço aos partidos que contam para o êxito da agenda do presidente, mesmo que sob o custo do “abrandamento” de bandeiras caras ao seu eleitorado de esquerda.
A tarefa de conciliar interesses, que não é trivial, fica muito mais difícil em um cenário em que cresceu a representação de partidos que têm orientação fisiológica e que não simpatizam com a agenda partidária de centro-esquerda. Partidos que se auto denominam como liberal-conservadores ou que se alinham com gosto a essa agenda, cobram caro pelo apoio almejado na composição governamental.
A reforma ministerial é um investimento do presidente em um casamento arranjado onde não há confiança na fidelidade dos parceiros. O retorno de Lula ao poder se deu em um cenário de fortalecimento da direita do espectro político, o que lhe impõe dividir decisões em coalizões heterogêneas onde os parceiros mais fortes determinam o alcance de suas realizações. Em um contexto em que o Legislativo se fortaleceu diante do Executivo, onde importantes recursos de emendas parlamentares estão sob o controle do presidente da Câmara dos Deputados, Lula realizará uma reforma que “cortará na própria carne”. Diminuirá o espaço do PT para beneficiar atores partidários de peso no Congresso Nacional e realocará membros do próprio partidos nas pastas que ficarão com o PT.
Na Secretaria de Comunicação a mudança já foi realizada com a substituição de Paulo Pimenta pelo publicitário Sidônio Palmeira. Ao que tudo indica essa iniciativa foi antecipada pelo presidente em virtude da crise instalada em torno da fiscalização das transferências via pix, que acabou por ser creditada às deficiências, já amplamente apontadas por especialistas, do setor de comunicação do governo. Essa escolha já dá um indicativo de que o partido do presidente não será poupado diante da necessidade de escolhas estratégicas que possam favorecer a aprovação e visibilidade das ações do governo.
Novas mudanças são aguardadas para depois da eleição dos novos presidentes da Câmara e do Senado, no dia 1º de fevereiro de 2025. Hugo Motta (Republicanos-PB) e Davi Alcolumbre (União-AP), respectivamente, serão os prováveis vencedores. De certo, é de público que a estrutura ministerial será readequada e receberá aliados importantes do centrão, inclusive o futuro ex presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), aparece como uma possibilidade de reforço na Esplanada dos Ministérios. As pastas do Desenvolvimento Agrário, da Agricultura, do Desenvolvimento Social, das Relações Institucionais e até mesmo a Secretaria-Geral da Presidência estão sob especulação de que podem entrar na dança das cadeiras.
Um grande problema que a renovação da equipe terá que enfrentar é a inflação do preço dos alimentos, que tem o poder de corroer a aprovação do governo. Na agenda econômica estão matérias de cunho tributário, ambiental, a regulamentação das big techs, entre outras, que estarão cercadas de fortes lobbys no Congresso Nacional. Se o investimento político, que implica a adequação da agenda aos interesses dos parceiros de coalizão, vai assegurar a fidelidade necessária para aprovar reformas importantes para a sociedade e para melhorar a aprovação do governo, só o tempo dirá.
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