O Partido dos Trabalhadores encerrou o ciclo eleitoral municipal deste ano com alguma vantagem em relação ao último pleito. Em 2020, o partido elegeu 183 prefeitos, nenhum em capital. Em 2024, ligeiramente melhor, a sigla conquistou 252 prefeituras, com Fortaleza sendo a única capital petista. Apesar da melhora, o partido amargou o pior desempenho de sua história em seu berço: São Paulo.
O coordenador do Grupo de Trabalho Eleitoral do PT, o senador Humberto Costa (PE), fez um balanço ao Congresso em Foco do desempenho petista e reconhece que, apesar do crescimento, a expectativa era de um resultado melhor. O parlamentar explica que o partido passa por uma reconstrução de imagem e avalia que o recado ao partido foi claro. “A gente nesta eleição recebeu alguns sinais da sociedade que nos fazem pensar na necessidade de atualizar o nosso discurso, de repensar nossos objetivos estratégicos, nosso projeto”, pontuou ele.
Para ele, não é hora de o partido se dividir em ataques internos, a exemplo do que ocorreu nesta semana entre o ministro das Relações Institucionais, Alexandre de Padilha, e a presidente da legenda, a deputada Gleisi Hoffmann. “É difícil querer responsabilizar alguém pelo resultado. Primeiro, porque não foi o desastre como muita gente quer fazer crer, segundo, porque tudo que nós fizemos foi construído a várias mãos.”
Leia também
Confira a entrevista:
Congresso em Foco – O PT encerrou a corrida eleitoral de 2024 com 252 prefeituras, destas apenas uma é capital, Fortaleza, com Evandro Leitão. O desempenho foi satisfatório?
Humberto Costa – Nós estabelecemos como meta ter um resultado melhor do que o que tivemos em 2020, o que foi possivelmente o nosso fundo do poço. Não quisemos estabelecer metas, até porque se a meta não fosse cumprida em uma prefeitura a leitura seria que o PT não conseguiu cumprir a sua meta. Obviamente que nós tivemos um crescimento. Foi um crescimento moderado. Gostaríamos que fosse maior, mas foi um crescimento, tanto no número de prefeituras, como no número de vereadores. Nós não tínhamos nenhuma prefeitura nas capitais, ganhamos uma. Fomos para o segundo turno em quatro (capitais), batemos na trave em outras. Então, eu diria que nós tivemos um resultado de crescimento moderado. Agora, obviamente que a gente gostaria, tinha uma expectativa de que pudesse ser melhor.
Mas também é explicado o aspecto do crescimento ter sido moderado, porque o PT desde 2012, depois mais à frente se agravando em 2016 com o impeachment (da presidente Dilma Rousseff), vem sofrendo um processo permanente de tentativa de deslegitimação. Vivemos aí esse processo da (Operação) Lava Jato, depois o governo de (Michel) Temer, depois o governo de (Jair) Bolsonaro, os processos contra Lula, a prisão dele. Então, nós estamos num processo de reconstrução da imagem, um processo de recuperação política e isso explica que o resultado não foi o que nós esperávamos, mas não pode ser qualificado como uma derrota como alguns querem dizer. Eu vejo, assim, terminou dentro da expectativa, embora nós gostaríamos que fosse melhor.
O Ceará é um importante reduto para o partido, o ministro Camilo Santana fez um governo de grande aprovação popular e ele participou junto de Evandro Leitão da campanha municipal. A vitória contra André Fernandes (PL) foi apertada. Como avalia o cenário de Fortaleza?
Olha, eu acho que dentro dessa condição de o PT ter sofrido aí muitos estigmas, é uma coisa explicada, mas não foi pouca coisa o que a gente fez. Nós pegamos uma pessoa desconhecida do grande público, que era parlamentar (foi deputado estadual), tinha sido secretário (do Trabalho e Desenvolvimento Social do Ceará, durante a gestão de Cid Gomes), presidente da Assembleia (Legislativa do Estado do Ceará).
Nós pegamos esse candidato que era desconhecido, que não tinha experiência de governar uma cidade e a gente conseguiu chegar no segundo turno, ultrapassamos o próprio prefeito (José Sarto, do PDT) – que em tese era de um campo comum – e fomos pro segundo turno e ganhamos por uma diferença pequena, mas a vitória é a vitória. Fizemos um bom número de prefeituras no Ceará, inclusive de algumas cidades de médio porte e, portanto, eu acho que o resultado lá foi bastante satisfatório.
Logo no dia seguinte do segundo turno, o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, avaliou que o PT “não saiu do Z4” e foi repreendido pela presidente do partido, a deputada Gleisi Hoffmann (PR). Há algum mal-estar ou divisão dentro da sigla pelo resultado final das eleições municipais?
Não, porque eu acho difícil querer responsabilizar alguém pelo resultado. Primeiro, porque não foi o desastre como muita gente quer fazer crer, segundo, porque tudo que nós fizemos foi construído a várias mãos.
Todas as correntes tiveram participação nos debates, os candidatos atenderam a uma diversidade política enorme dentro do PT. Por exemplo, o candidato em Cuiabá que foi para o segundo turno (Lúdio Cabral), dentro das correntes do PT, não é ligado à corrente majoritária. Natália Bonavides, lá de Natal, também não é, na Paraíba, o candidato que a gente colocou (Luciano Cartaxo), embora não tenha tido sucesso. Então, todo mundo teve espaço para para dizer assim para atuar nessa eleição. Os recursos todos eles foram distribuídos da forma mais democrática possível, não dá para você querer atribuir uma responsabilidade a alguém especificamente.
E o mais importante é que são as condições. O PT é um partido que está aí no processo de recuperação. A gente nessa eleição recebeu alguns sinais da sociedade que nos fazem pensar na necessidade de atualizar o nosso discurso, de repensar nossos objetivos estratégicos, nosso projeto. Tem muitas coisas objetivas, não é um problema da direção do partido, a condução do partido. Não foi isso.
Em outras capitais, o PT acabou se aproximando de legendas aliadas, como é o caso de Belém, que elegeu Igor Normando (MDB). Como o senhor enxerga essa coalizão, como a própria presidente Gleisi define?
Olha eu é um ponto difícil a gente pensar nisso, porque acabamos de sair da eleição. Geralmente, esse é um processo que deixa mágoas, deixa alguns processos de radicalização, isso pode ter alguma interferência ou alguma influência. Mas eu acredito que esses resultados aí nos deram também uma possibilidade de uma linha de que é importante reforçar esses vínculos com os nossos aliados. Inclusive, para efeito das eleições de 2026.
O senhor enxerga uma relação entre a eleição municipal e a nacional? É possível enxergar tendências para o próximo pleito?
Eu acho que essa eleição teve alguns aspectos muito particulares e muito, digamos assim, vinculados às questões locais. Basta ver a quantidade de gente que se reelegeu, significa que o voto das pessoas foi muito em cima de quem as pessoas consideravam que podia fazer melhor para elas, ou que teriam feito o melhor nesse período. Aí entra a questão das emendas parlamentares, entram os programas do governo que atende a todos indistintamente. Então, eu acredito que não nessa eleição especificamente não saiu uma grande sinalização além da sinalização de que o PT e o governo precisam olhar com atenção para algumas coisas.
Mas, por exemplo, 2000 foi uma eleição muito claramente apontando para uma perspectiva de 2002, quando o Lula ganhou. Nós ganhamos em várias cidades importantes no ano 2000 e ali tinha muito forte um sentimento de ser contra o governo federal. Eu acho que nessa agora não foi muito bem isso, uma disputa plebiscitária, vamos dizer.
Em outras eleições, em fevereiro, Câmara e Senado irão eleger seus próximos presidentes. Na Câmara, há um clima de disputa, de reviravoltas, mas no Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) disfruta de um favoritismo. A bancada petista já tem algum entendimento de como irá se posicionar?
A bancada teve uma conversa com o próprio Davi e existem outras pessoas que estão se apresentando como pré-candidatos, que tem demandado uma conversa com a gente. Provavelmente nós vamos ter essa conversa também.
Agora, o PT está muito mais preocupado em saber como é que o futuro presidente ou a futura presidente, quem for, vai se colocar em relação a uma série de coisas. A pauta do governo, qual vai ser o tratamento que vai ter. Lógico que o Congresso não é uma reprodução do que o governo quer, mas nós precisamos saber se a gente vai ter aqui a frente da presidência alguém que vai ter uma postura de oposição ou não. Alguém que vai se comportar como o chefe de Poder. Qual a posição dessas pessoas sobre a questão da democracia, o estado democrático de direito, a independência entre os Poderes? A extrema direita quer ficar fazendo julgamento de ministro do Supremo. Então, para nós, é muito sobre como é que vai lidar com essa agenda da extrema direita de mais armas, mais punição.
O líder da oposição, Rogério Marinho (PL-RN), ao anunciar o apoio do PL a Alcolumbre, reclamou que durante o período de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) à frente da Casa não houve respeito à proporcionalidade. O senhor concorda?
Não acho, não. Inclusive aqui na Câmara tem uma questão aí que é o seguinte, a Constituição fala de proporcionalidade, nos cargos, na Mesa, nas comissões, nas relatorias, por isso tudo e tal. Mas, como lá está escrito sempre que possível, algo nesse sentido, abre o espaço para se tornar normal você não cumprir a proporcionalidade.
O que aconteceu, não só naquele momento na eleição do Davi Alcolumbre (em fevereiro de 2019), é que nós que tínhamos uma candidatura, que era a do Renan (Calheiros, do MDB-AL), ficamos fora de tudo. É parte do jogo. Quando o Pacheco foi candidato, esses partidos poderiam ter feito parte de uma composição, como vão fazer agora, mas queriam marcar uma posição.
Então, Pacheco também na hora de montar a Mesa e as comissões, ele olhou para os que estavam com ele. Então, não dá para fazer essa acusação. Outra coisa, acho que o Pacheco foi muito firme na defesa de algumas coisas que não agradam a extrema direita, como a defesa da independência entre os Poderes, a condenação do golpismo, do golpe que se tentou dar (em 8 de janeiro de 2023), não se colocando contra o tempo inteiro essas tentativas de desmoralização do Supremo. É isso que eles não gostam no Pacheco.
O diálogo com o Davi Alcolumbre é aberto, há uma boa relação com a bancada petista?
O diálogo sempre houve, agora é inegável que houve uma série de coisas que nós ficamos com pé atrás, algumas pautas aí da extrema direita correram soltas na própria CCJ (Comissão de Constituição e Justiça, cujo presidente é Alcolumbre). A gente até conversando com ele colocou isso. Não somente você tem uma concentração muito grande de relatorias nas mãos aí de todo mundo da extrema direita de tudo, poucas vezes se entrega uma relatoria importante para alguém que é da base do governo e o pior: geralmente se dá a relatoria para quem já tem uma posição claramente formada.
Se tinha alguma dúvida de que entregar o projeto que tratava do marco temporal para o Marcos Rogério (PL-RO), você está esperando o quê? Não tem nenhum espaço de negociação. Porque o relator tem também que buscar o caminho da média. O que é da média? Eu tenho uma posição, mas vou ouvir o outro lá ‘Está bom? Pode ser isso aqui, pode ser aquilo ali?’ Ele deixou rolar esse debate sobre o marco temporal, deixou rolar esse debate sobre (autonomia) Banco Central, deixou rolar o debate sobre essa questão e armamento, aquele projeto que trata de criminalizar o usuário de droga ou dependente de droga, passou lá naquela comissão castração química.
Dentre os outros senadores que querem concorrer, o Congresso em Foco apurou que há um interesse do líder Otto Alencar (PSD-BA), além da senadora Eliziane Gama (PSD-MA), ainda que o PSD não tenha divulgado seu posicionamento. A bancada tem sido procurada? Seriam nomes mais interessantes para os petistas?
Olha, a gente conversa com qualquer nome, agora o nome tem que se apresentar. Nós conversamos com o Davi porque ele disse claramente que é candidato e disse claramente que quer o PT apoiando a candidatura dele. Se o Otto assumir que é candidato, sentar com a gente nós vamos ouvir e vamos avaliar também. Eliziane procurou a gente para fazer uma conversa. Provavelmente a gente vai fazer. Então, não tem uma posição fechada do PT em relação a isso.
Agora, qualquer um que for discutir, a gente quer saber de algumas coisas: como vai tratar a pauta do governo? Vai ter uma pauta própria aqui do Senado e o presidente do Senado? Como é que vai lidar com temas como esses que eu falei – Estado de Direito, independência entre os Poderes, essas coisas todas. Anistia os golpistas, tudo isso tem que entrar nessa roda. E também qual é o espaço que o partido vai ter dentro de uma gestão comandada por aquela pessoa.
O PT se sente confortável em dividir o apoio a Alcolumbre com o PL?
Obviamente que não, mas se o critério for o da proporcionalidade, pode existir. Mas eu acho que a posição do PL, como tem sido cogitado aí na primeira vice-presidência, muito contraditória. Porque o primeiro-vice, na ausência do presidente, é quem vai falar pelo Senado Federal.
Eu fico me perguntando, se tivesse um vice-presidente do PL no 8 de janeiro, porque o Pacheco estava fora, o vice-presidente era o Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), que foi quem participou de todas as articulações políticas em defesa da democracia ali, como é que fica? Não, mas vai botar extrema direita aqui que tem bons modos, mas a gente sabe como eles funcionam.
O PT negocia o apoio visando um cargo da Mesa?
Lógico que pelo fato de o PT ser o partido do presidente da República, nos governos de Dilma e Lula passados, o PT sempre teve a primeira vice-presidência, seria uma decorrência natural. Mas veja bem, uma coisa é isso seria uma decorrência natural, é uma aspiração legítima. Mas mais importante do que isso é que a gente não tenha um vice-presidente que seja de oposição, pelo menos algum que consiga construir convergência.