Os parlamentares também devem ser afetados com a reforma da Previdência em tramitação no Congresso. O governo propõe o fim do regime especial de aposentadoria dos congressistas e que eles passem a receber, no máximo, o teto do INSS, fixado em R$ 5,8 mil. Mas a realidade de hoje é bem diferente. Atualmente, 499 ex-deputados federais ganham, juntos, R$ 7,18 milhões mensais em aposentadorias, uma média de R$ 14,39 mil por beneficiário – quase três vezes o limite proposto (veja a lista completa dos aposentados e seus respectivos benefícios mais abaixo).
Entre eles, apenas sete (1,4%) recebem abaixo do teto do INSS. Um grupo maior, formado por 17 beneficiários, tem direito a mais de R$ 33 mil por mês, valor pago aos parlamentares no exercício do mandato. Os dados não consideram os valores repassados àqueles que se aposentaram pelo Senado e foram extraídos da folha de pagamento da Câmara, referente a fevereiro, obtida pelo Congresso em Foco.
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Entre os que ganham o teto estão parlamentares que deixaram o Congresso no último dia 31 depois de vários mandatos, como Miro Teixeira (Rede-RJ), deputado por 11 vezes, Simão Sessim (PP-RJ) e Bonifácio de Andrada (DEM-MG). Esses três, por exemplo, chegaram à Câmara ainda na década de 1970 e permaneceram na Casa por pelo menos 40 anos. Para receber o benefício integral é preciso acumular 35 anos de atividade (ou seja, nove mandatos na Câmara).
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O rol de beneficiários também tem políticos que frequentaram o noticiário policial recentemente, como Roberto Jefferson (PTB-RJ), Valdemar Costa Neto (PR-SP), que cumpriram pena pelo mensalão, e Nelson Meurer (PP-PR), primeiro condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na Operação Lava Jato, entre outros. O ex-deputado e ex-ministro da Casa Civil José Dirceu (PT-SP), sentenciado pela Justiça em ambos os esquemas, também é aposentado pela Câmara.
PublicidadeEntre os que recebem R$ 33,7 mil está o ex-presidente da Casa Henrique Eduardo Alves (MDB-RN), que foi deputado entre 1971 e 2015. Condenado em junho do ano passado por fraudes no FI-FGTS da Caixa Econômica e alvo de outros processos, ele recebe R$ 33.763 por mês. Entre 2017 e 2018, ele passou quase um ano preso em razão da Lava Jato.
Quem está na cadeia e começa a desfrutar do benefício da Câmara é o ex-deputado Geddel Vieira Lima (MDB-BA), que no próximo dia 14 de março completa a idade mínima de 60 anos para a aposentadoria parlamentar. Seu nome já aparece na folha de pagamento de fevereiro, apto a receber R$ 20.354 por mês. Geddel está preso desde setembro de 2017, após a Polícia Federal (PF) encontrar mais de R$ 51 milhões em espécie em um imóvel ligado a ele.
O valor de cada aposentadoria dos congressistas é calculado sobre o tempo de mandato. A cada ano cumprido na Casa, o deputado ou senador acumula 1/35 do salário (R$ 964) para a futura aposentadoria. No caso dos senadores, basta um mandato (oito anos) para ter direito a uma aposentadoria de R$ 7.717, valor quase R$ 2 mil acima do teto do INSS. Para deputados, em geral, só compensa aderir ao plano com no mínimo dois mandatos.
Extinção lenta
O regime com o qual os parlamentares contribuem hoje é o Plano de Seguridade Social dos Congressistas (PSSC). A adesão ao plano é opcional. Para receber aposentadoria atualmente, o parlamentar precisa alcançar 60 anos de idade e 35 de contribuição, seja para a previdência parlamentar ou para o regime geral do INSS, por exemplo.
O PSSC foi criado em 1999 após a extinção do antigo, o Instituto de Previdência dos Congressistas (IPC), que foi liquidado naquele ano e repassou sua dívida à União. São os cofres da União que arcam com os compromissos desde então.
Apesar de extinto há 20 anos, este programa antigo ainda pesa no erário: a fatia prevista para cobrir o IPC no Orçamento da União em 2019 é de R$ 161,25 milhões, somando os repasses a ex-deputados e ex-senadores. É o IPC que ainda responde pela maioria dos benefícios: dos 499 ex-deputados aposentados, 433 (ou 86,77%) estão vinculados ao plano antigo, ou seja, contrataram a aposentadoria especial ainda no século passado. Há quarto anos, o Congresso em Foco mostrou que o IPC já havia engolido mais de R$ 2 bilhões em dinheiro público desde a extinção.
Esse quadro demonstra que a reforma do governo Bolsonaro, mesmo se aprovada nesses termos, ainda está longe de eliminar os desembolsos do programa. O texto determina que todos os políticos passem para o regime geral do INSS, mas o PSSC e o antigo IPC continuarão pagando aposentadorias até o último beneficiário vivo.
Brechas na reforma
A proposta da equipe econômica dá um prazo de 180 dias (seis meses), contados a partir da aprovação da reforma, para que os atuais deputados e senadores decidam se vão permanecer ou não nos regimes previdenciários aos quais se encontrem vinculados.
Outro trecho do projeto prevê “a reinscrição do ex-segurado que vier a ser titular de novo mandato, ou a concessão de aposentadoria, quando cumpridos os requisitos exigidos na data de promulgação”. Ou seja, qualquer deputado ou senador que voltar ao cargo e tiver contribuído com o PSSC no passado, em algum momento, poderá retornar ao plano ou receber a aposentadoria especial, se já tiver alcançado os requisitos de idade mínima e tempo de contribuição.
O deputado Jerônimo Goergen (PP-RS) afirma que apresentará uma emenda para corrigir as brechas que ele enxergou no projeto da reforma “Temos que fechar essa porta para valer, senão o rombo nunca vai ter fim”, disse o parlamentar ao Congresso em Foco.
Parlamentares recém-empossados, eleitos com a plataforma de economia de recursos públicos, têm anunciado publicamente que renunciaram ao plano e ficarão com o regime do INSS. A renúncia ao PSSC não é incomum, porque a alíquota de contribuição (11%) espanta alguns políticos, que consideram o plano caro. Há caso de deputados que aderiram ao plano e, logo no mês seguinte, desistiram, ao ver o desconto no salário.