Apesar de estudar representação de interesses há quase duas décadas, apenas recentemente me tornei lobista voluntária. É isso mesmo! Eu faço lobby pela regulamentação do lobby. Essa atuação tem me permitido sentir na pele, uma série de desafios. O principal é o acesso aos tomadores de decisão.
Idealmente, o lobby deveria ser bem visto e desejado em ambientes democráticos, uma vez que, propicia que os grupos de interesse chamem a atenção para questões importantes, que ainda não figuram na agenda política e garante que os tomadores de decisão recebam informações, ideias, pontos de vista e reivindicações referentes aos temas que já estão em deliberação.
Sendo assim, por que é tão difícil falar diretamente com um tomador de decisão? Acreditariam eles que os grupos de interesse levam apenas visões parciais e que a sua abertura para ouvir opiniões divergentes geraria conflito de interesses que paralisariam o processo decisório? Pode ser.
Mas eu não acredito nisso. De fato, o que ocorre é algo muito mais complexo e difícil de solucionar. Me refiro ao total descaso dos tomadores de decisão quanto ao princípio da isonomia de acesso e tratamento aos grupos de interesse.
Aliado à assimetria informacional, ao déficit de ação coletiva e a indisponibilidade de informações precisas sobre como acessar os tomadores de decisão, falar com um tomador de decisão é uma tarefa que exige capacidade de investigação e, sobretudo, persistência.
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A regulamentação do lobby tem o potencial de garantir a isonomia de acesso e tratamento ao instrumentalizar mecanismos que levem os tomadores de decisão a obrigatoriamente ouvir as partes contrárias sobre determinado tema. Isso significa que é possível incentivar o controle mútuo.
Infelizmente, o PL 4391/21, projeto que tramita em regime de urgência na Câmara dos Deputados e poderá ser apreciado na semana de esforço concentrado às vésperas das eleições, traz apenas um conselho.
Em seu artigo 6º §1º se lê “Aos órgãos e às entidades de quaisquer dos Poderes prezarão pela isonomia de tratamento àqueles que solicitarem audiências sobre a mesma matéria”. A intenção do legislador é boa. Porém, de boas intenções o inferno está cheio…
Caso o texto do PL fosse ligeiramente aprimorado, poderíamos ter um resultado bem diferente. Uma alternativa de redação ao artigo 6º §1º seria: “Os representantes de interesses serão ouvidos pelos agentes públicos em audiência de acordo com agenda organizada e divulgada previamente. Existindo interesses divergentes, sempre que for ouvido representante de interesse de um dos lados, antes de ser proferida decisão por agente público no âmbito de suas funções administrativas e/ou legislativas, este deve propiciar igual oportunidade a representante de interesse contrário.
Se esse dispositivo estivesse em vigência, eu teria conseguido apresentar meu ponto de vista sobre o PL 4391/21 ao deputado federal Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), autor do requerimento de urgência responsável por interromper a tramitação do PL pelas comissões e relator do PL em Plenário. Tenho tentado agendar essa reunião desde junho de 2022, sem sucesso!
Como ele atendeu grupo que defende interesse divergente, como pode ser visto na matéria publicada na página do Partido Republicanos, em respeito ao princípio de acesso e tratamento isonômico aos representantes de interesses, respeitadas as divergências de opiniões, o deputado seria obrigado a me receber. Esse é apenas um, entre os inúmeros benefícios que a regulamentação do lobby garante e é, por isso, que luto, a cada dia, para que ela aconteça por meio do debate entre todas as partes envolvidas e interessadas.
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