Em seu segundo episódio, o Congresso em Foco Podcast recebe a deputada Dandara (PT-MG), vencedora do Prêmio Congresso em Foco na categoria Defesa da Educação em 2023. Com um histórico de liderança em movimentos estudantis, ela se tornou a mais jovem liderança negra no Congresso Nacional. Ela coordena a Frente Parlamentar Mista Antirracismo, e foi relatora da nova Lei de Cotas, aprovada em 2023, além de ter feito parte do Conselho Internacional de Segurança, em Munique, na Alemanha.
Em sua participação, Dandara, alertou sobre a deficiência de dados oficiais a respeito dos resultados alcançados por cotistas. De acordo com ela, esse apagão compromete o debate a respeito do aperfeiçoamento do sistema e da criação de novas ações afirmativas na educação.
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A lei de cotas original foi estabelecida pela primeira vez em 2012, com prazo de validade de 10 anos, sendo então submetida a uma análise do Congresso Nacional a respeito de sua renovação e de eventuais mudanças nas regras. Em 2020, diversos parlamentares apresentaram um novo projeto que tornava permanente a ação afirmativa, devendo passar anualmente por revisões.
Em 2023, o governo patrocinou o projeto, e Dandara foi escolhida relatora. Ao assumir a articulação, porém, ela afirma que faltou o elemento básico para que se possa fazer a avaliação de resultados das cotas. “Não temos dados oficiais do Ministério da Educação (MEC) que mostrem o que foram esses dez anos de aplicação da lei de cotas no nosso país. Tem estudos, às vezes de pesquisadores de universidades, de institutos, uma coisa pontual que o MEC tenha feito, mas não há uma elaboração”, relembrou.
Ela conta que o Tribunal de Contas da União (TCU) também estranhou a ausência de uma base de dados que demonstre não apenas o desempenho dos cotistas a respeito de notas, mas também informações a respeito da permanência desses estudantes nas universidades, tempo de formação, índices de conclusão de curso, participação em atividades acadêmicas, entre outros indicadores.
PublicidadeDandara acredita que houve vontade política na ausência de construção dessa base de dados. “É político, não é por um acaso. Toda ausência de dados é, sem dúvida alguma, proposital, não é por acaso. (…) [A lei de cotas] completou 10 anos em 2022, naquele momento deveria ter sido feita a avaliação, esse balanço, esse aperfeiçoamento, apontado novos caminhos. Mas tanto por falta de vontade política quanto por conjuntura do Congresso Nacional, isso não foi feito”, declarou.
A solução encontrada pela deputada foi incluir em seu texto a obrigatoriedade para que o governo faça o levantamento anual desses dados, que serão utilizados a cada revisão da nova lei de cotas.
O Congresso em Foco questionou a assessoria de comunicação do Ministério da Educação a respeito da declaração da deputada. Em resposta, o MEC encaminhou a seguinte nota:
“O Ministério da Educação (MEC), por meio do Instituto Nacional de Estudos Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), coleta dados dos cotistas no Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade). Com os resultados, é possível avaliar e analisar o desempenho dos concluintes que acessaram a educação superior por meio de programas de reserva de vagas, seja por critério étnico-racial ou renda, com possibilidade de comparação com os outros grupos que participam do Exame. Além disso, o Censo da Educação Superior coleta dados que permitem acompanhar informações de acesso dos cotistas e suas trajetórias. O Inep também desenvolve estudos com base nos números divulgados, como, por exemplo, o disponível no link a seguir: https://cadernosdeestudos.
Debate enfraquecido
Oriunda de movimentos estudantis, Dandara é participante ativa da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, onde foi titular no exercício de 2023. Na entrevista, ela lamentou o caminho que a comissão adotou no último ano, apresentando queda na qualidade dos debates, que constantemente desviam de temas de interesse público. Esse fenômeno, de acordo com ela, é generalizado na Casa.
“Eu adoro quando a gente consegue debater as coisas com profundidade. Ultimamente, na Câmara, não está tendo isso. As coisas estão muito rasas, é uma discussão que descamba para um lado sem um pingo de densidade, pautadas muito superficialmente”, relatou. Esse fenômeno, ao seu entender, se dá em função dos interesses eleitorais de parlamentares. “O que vale não é o debate, é a discussão. É se ele já fez o vídeo para cortar e lacrar nas redes sociais dele”, avalia.
No caso da educação, ela conta que constantemente a discussão se prende a questões ideológicas. “Ano passado, eu não sei quantas vezes na Comissão de Educação, tivemos que ficar debatendo requerimento sobre professor doutrinador, banheiro unissex, de kit gay, mamadeira de pi****. (…) Quem conhece o chão da escola sabe que esse não é o problema da escola pública brasileira”, relembrou.
Com isso, temas como piso salarial de professores, criação de fundos para alimentação escolar ou outros projetos voltados para o aprimoramento do sistema educacional são deixados de lado. Ela defende uma reforma na dinâmica das comissões para que questões práticas sejam priorizadas sobre as ideológicas. “Vamos falar de material didático, vamos debater o chão da escola. Não essas ‘vozes da cabeça’ de quem nunca pisou em uma sala de aula”, demandou.
A entrevista também está disponível via Soundcloud. Confira a íntegra a seguir:
Veja também: no episódio anterior do Congresso em Foco Podcast, o deputado Amom Mandel (Cidadania-AM) trouxe detalhes sobre a expansão do crime organizado na Amazônia.