O deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) deverá ser aclamado presidente da Câmara em fevereiro do próximo ano. De braços dados com Arthur Lira e com o governo Lula, conseguiu a desistência dos concorrentes e virou unanimidade. O domínio político do Centrão — e da política baseada em verbas de emendas parlamentares — parece não ter mais barreiras para se consolidar.
Enquanto os chefes do governo e da Câmara zelavam por seus interesses em Brasília, as redes sociais reverberavam algo bem diferente dessa pasteurização política. A ideia de mobilização nacional para mudar a Constituição e acabar com a chamada escala 6×1 de trabalho foi ganhando corpo nas redes sociais. Viralizou, provocando um curto-circuito no governo, no Congresso e nos partidos políticos.
Começou tímida, no ano passado, como plataforma eleitoral de um candidato a vereador pelo Psol do Rio, Ricky Azevedo. Como milhares de trabalhadores, ele se queixava de não ter tempo — para o lazer, para estudar, para o ócio. Lançou o Movimento Vida Além do Trabalho, com o objetivo de mudar a legislação trabalhista, a CLT. Em maio, a colega de partido em Brasília Erika Hilton transformou a ideia em proposta de emenda constitucional. O barulho das redes cresceu e, inevitavelmente, chegou aos ouvidos dos congressistas.
Parlamentares, geralmente, não gostam de contrariar o eleitor. Sobretudo em situações como essa: um projeto altamente popular, mas com enormes dificuldades de aprovação — não custa nada aderir. O projeto de Erika Hilton conseguiu rapidamente o número de assinaturas necessário para começar a tramitar. O ruído poderá ficar ensurdecedor.
A proposta pode significar aumento de custo para muitos setores na economia, apesar de inúmeros estudos e experiências internacionais que atestam sua viabilidade e os ganhos de produtividade que compensariam os dias de folga. Alguns números favorecem os argumentos dos defensores. Segundo pesquisa do Instituto Locomotiva, de agosto do ano passado, seis em dez brasileiros disseram não ter qualquer momento de ócio ou tempo livre. Apenas um quarto dos entrevistados esse que se dedicava diariamente à atividade física, e 15% afirmaram que liam livros.
A bandeira do vereador Ricky, empunhada pela deputada Erika, é uma provocação à esquerda, ainda apegada às regras do trabalho herdadas de Getúlio Vargas, apesar da revolução tecnológica; e à direita, vendedora de sonhos de enriquecimento individual. A forma como mobilizou a sociedade e chegou aos parlamentares contrasta com o momento, em que a política se amoldou às feições amorfas do Centrão. Amanhã, feriado do dia da República, há manifestações programadas para várias capitais. O barulho pode sair do celular e ganhar a rua.
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