O deputado Carlos Chiodini (MDB-SC), presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Americanas, entregou nesta terça-feira (5) o relatório que analisa a fraude que registrou um rombo contábil da ordem de R$ 20 bilhões causado pela diretoria da varejista. O relatório, que não apresentou culpados diretos, será votado pelo colegiado da Comissão ainda nesta terça. A CPI não será prorrogada.
- Leia o relatório na íntegra aqui.
A CPI começou em 6 de junho e ouviu ao todo 34 pessoas. Além de membros da diretoria nova e antiga da empresa, foram ouvidas entidades, especialistas do mercado, Ministério Público e Polícia Federal. A CPI ouve nesta terça a ex-diretora da empresa Anna Christina Ramos Saicali.
“Em todas as oitivas surgiram vários fatos dos atuais administradores que colocam todo o ônus na diretoria anterior e, coincidentemente, todos com habeas corpus. Eles se resguardaram o direito de não se incriminarem e não houve o contraditório com esse pessoal, o que gerou um impasse”, disse Chiodini ao justificar a falta de culpados no documento.
Leia também
O deputado concluiu com a investigação que há indícios da fraude ter sido estruturada pela antiga diretoria, porém ele mesmo admitiu que a acusação é muito ampla porque a companhia teve dezenas de diretores ao longo das últimas décadas.
“Seria inconsequente da minha parte dizer é tal pessoa ou generalizar dizendo que são todos, mas algumas pessoas desse grupo [de diretores] fizeram acordo de delação e vão, no âmbito do inquérito do MP [Ministério Público], trazer mais informações”
Aprimoramento
O relatório traz então sugestões de aprimoramento do mercado financeiro e do segmento de varejo, alegando que é necessário melhorar e atualizar a legislação atual, equipando-a com modelos internacionais para gerar governança ética das empresas.
As fraudes foram avaliadas da seguinte maneira:
1 – Houve a não escrituração contábil das operações de risco sacado.
As operações de risco sacado, também conhecidas como “forfait” ou “confirming”, consistem em uma modalidade de antecipação de recebíveis comumente utilizadas nas transações comerciais realizadas por empresas varejistas. Trata-se de operação financeira em que o sacador emite um título de crédito para efetuar um pagamento ao sacado e o vende a um intermediário financeiro em troca de um pagamento antecipado, normalmente inferior ao valor nominal do título.
2 – Em contratos de Verba de Propaganda Cooperada (VPC).
Vários contratos de verba de propaganda cooperada (VPC) e similares foram fraudulentamente criados para melhorar artificialmente os resultados da companhia.
Esses lançamentos teriam totalizado, em números preliminares e não auditados, o saldo de R$ 21,7 bilhões em 30 de setembro de 2022. No mesmo sentido, as contrapartidas contábeis associadas a esses contratos considerados fraudulentos e sem lastro financeiro associado, teriam sido lançadas, em sua maioria, na conta “fornecedores”, gerando um saldo de R$ 17,7 bilhões em 30 de setembro de 2022.
“Nesse sentido, foram apontados indícios da ocorrência de falsidade documental, em que os ex-diretores da companhia teriam, supostamente, ‘criado’ documentos para apresentar às auditorias. Segundo se fez constar, ‘eram lançados no sistema redutores de custo inexistentes’, assim como ‘redutores da conta fornecedor eram realizados pela contabilização de VPC (verba propaganda cooperada’), sendo que ‘quando a auditoria solicitava a documentação de suporte, eram criados contratos, cartas de VPC falsas, para atendimento à auditoria'”, descreve o relatório.
O documento sugere os seguintes incrementos:
- A inserção da figura do informante como um dispositivo legal, porém válido ao setor privado;
- O direito ao auditor cadastrado na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) de acessar dados do Banco Central para saber qual é o real endividamento das empresas;
- A tipificação da fraude dentro do código penal e
- Enquadramento da fraude e do prejuízo gerado como infidelidade patrimonial.
Tramitação
A Câmara dos Deputados instalou no dia 17 de maio a CPI das Americanas, cuja relatoria ficou com o deputado Carlos Chiodini (MDB-SC). Em recuperação judicial, as Lojas Americanas declararam dívida de R$ 40 bilhões, além da suspeita de fraude de R$ 20 bilhões.
A CPI foi originalmente protocolada pelo líder do PP na Câmara, André Fufuca, do Maranhão. A leitura do requerimento para instalação do colegiado foi feita pelo presidente da Casa, Arthur Lira, do PP, Alagoas, no dia 26 de abril. A CPI terá 27 membros titulares e 27 suplentes.
Histórico
O escândalo contábil da Americanas, considerado a quinta maior varejista do Brasil em 2022, veio à tona no dia 11 de janeiro, quando a empresa informou que havia descoberto inconsistências em lançamentos contábeis no valor de R$ 20 bilhões.
Com isso, o então presidente da companhia, Sergio Rial, e o diretor de relações com investidores, André Covre, deixaram a companhia, menos de dez dias após assumirem os cargos. Então, a companhia viu as ações caírem vertiginosamente na bolsa de valores brasileira, com perdas de mais de R$ 8 bilhões em valor de mercado em dois dias.
A companhia surgiu no Rio de Janeiro, em 1929. Um grupo de norte-americanos criou a loja de departamentos. A empreitada ganhou peso a partir da década de 80, quando passou a ser comandada pelos sócios Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira.