Já há duas semanas, os movimentos sociais dedicados ao controle social sobre a conduta e os gastos públicos vinham se mostrando preocupados com o destino de uma das mais importantes instituições de controle do país, a Controladoria-Geral da União. Ou, simplesmente, CGU.
Nascida em 2003, sob os auspícios da então recém-criada Constituição Federal – erroneamente chamada de Constituição Cidadã –, a CGU foi criada para ser uma típica agência anticorrupção, responsável pelo controle interno dos repasses de recursos federais para outros entes federativos e privados. Em 2006, a grande virada na qualidade dos serviços, com a criação da Secretaria de Prevenção da Corrupção e Informações Estratégicas.
De alguns anos para cá, primeiro durante o julgamento do mensalão e, depois, ao longo deste processo de investigações do petrolão, a CGU vem minguando diante de seguidos cortes orçamentários e de pessoal. Seu chefe de então, o ex-ministro Jorge Hage, chegou a declarar em público que o órgão vinha sofrendo de “penúria”, que comprometia até coisas básicas como o fornecimento de água e luz.
Que o caos administrativo, financeiro e moral está instalado na cúpula do Executivo brasileiro, isso ninguém mais discorda. Mas, a quem interessa esse estado de coisas, principalmente num órgão de controle? Menos fiscalização, menos transparência, menos punições. Decerto, não à sociedade.
Leia também
Pois a CGU acaba de escapar por triz dessa reforma ministerial que, como já comentamos, veio mesmo pífia e atabalhoada. Uma das alterações pretendidas atingiria em cheio justamente a CGU, que teria sua função de auditoria distribuída para a Casa Civil.
Seria um verdadeiro desastre para quem ainda sonha com menos descalabros na administração pública. Não é para menos. Afinal, como é que um órgão interno da Casa Civil, com seu status de ministério perdido, teria força institucional para auditar, processar ou mesmo estabelecer sanções a outros ministérios, que estarão então hierarquicamente superiores à CGU? Evidentemente, não haveria força política para tal. Demitir servidores comprovadamente corruptos, então, nem pensar, pois isso é atribuição exclusiva de um ministro de Estado.
PublicidadeSó o fato de a presidente Dilma e seus assessores terem cogitado uma coisa dessas já evidencia uma grave distorção; infelizmente, apenas uma a mais dentre tantos absurdos veiculados diariamente. Mas o mérito, desta vez, é todo da sociedade civil organizada. Para pressionar pela manutenção da CGU como ministério, várias organizações se articularam e até veicularam uma nota de apoio à CGU pela Rede Amarribo, assinada por nada menos que 79 organizações de todo o país. No documento, as entidades denunciam a precarização paulatina dos serviços da Controladoria que, hoje, tem um orçamento equivalente ao da Secretaria das Mulheres, que acabou sendo aglutinada com outras duas.
No fundo, a questão que se enfrenta não é a de simples cortes para se cumprir metas de gastos públicos. É o próprio desentendimento da presidente do que seja o Estado e de quais as suas verdadeiras funções, que não são a de empreender ou tutelar a vida dos cidadãos. Mas, ao contrário, deve ser a de controlar gastos, promover a transparência pública e, acima de tudo, combater a corrupção em todos os níveis.
Transformar uma instituição de Estado eminentemente técnica e autônoma num departamento qualquer dentro de um ministério seria dar um tiro no pé. Um grande ato de traição contra uma sociedade que já não suporta mais tantos desmandos. E aí fica a dúvida, que também vale para as outras instituições de Estado dedicadas à fiscalização e controle dos gastos públicos: o descontrole que isso causaria é apenas o efeito colateral desse desentendimento ou o seu próprio objetivo?
Como as organizações da sociedade disseram em seu documento: “Que a crise econômica não seja usada como desculpa para reduzir o controle da corrupção!“.
E, acreditem, desta vez foi por pouco.