Travada pela pandemia, a instalação das comissões da Câmara deve ser discutida nesta semana pelo presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ) com líderes partidários. Depois de um semestre com votações restritas ao Plenário, onde a pauta é definida pelo presidente após ouvir o colégio de líderes, começa a haver pressão pelo retorno das comissões temáticas. Esses colegiados discutem em profundidade projetos de lei, propostas de emenda à Constituição e requerimentos, além de realizarem audiências públicas para colher sugestões técnicas sobre as matérias.
Essa discussão chegou a ser iniciada há algumas semanas, segundo a líder do PCdoB, Perpétua Almeida (AC), porém quando Brasília mostrou números avançados de covid-19, o presidente recuou.
O Pros, que pretende compor um novo bloco com PSL, PTB, PSC e Solidariedade, sinalizou que vai aguardar uma decisão sobre os colegiados para se articular. “A gente deixou um timing de esperar o que o presidente Rodrigo vai fazer”, disse o líder do Pros, Acácio Favacho (Pros-AP). A ideia de compor um novo bloco com menos siglas visa garantir mais possibilidades regimentais na apresentação de emendas e requerimentos e ampliar a força na discussão dos projetos dentro da Casa.
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Nos bastidores, a avaliação é de que algumas siglas acabaram escanteadas dentro do blocão, que hoje integra partidos do chamado Centrão (PL, PP, PSD, Solidariedade, PTB, Pros e Avante), de centro e direita e com alguma identidade com o governo Jair Bolsonaro. O bloco é liderado por Arthur Lira (PP-AL). Em busca de independência, DEM e MDB deixaram o bloco na semana passada.
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As comissões temáticas não foram sequer instaladas em 2020, em um recorde na história da Casa, conforme mostrado pelo Congresso em Foco em maio. Diferentemente do Senado, onde os presidentes das comissões têm mandato de dois anos, na Câmara, os presidentes são eleitos anualmente e, para início dos trabalhos, é preciso indicação dos membros pelos partidos. Com esse limitante, os órgãos ainda não se reuniram este ano.
PublicidadeO processo de escolha dos nomes a integrar e comandar as comissões envolve tamanho de bancadas, negociação entre as legendas e acordos firmados em anos anteriores. As comissões mais cobiçadas são a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e a de Finanças e Tributação (CFT), pelas quais passa a maioria das proposições. Em 2020, quando a articulação já estava em curso, esse processo foi interrompido devido à decretação da situação de calamidade pública e às medidas de isolamento social.
No Plenário, foi implantado um sistema de deliberação remota que permite trabalho semi-presencial, com a presença física do presidente Maia e de líderes partidários. Os demais deputados costumam participar por videoconferência de seus gabinetes ou residências. À época, ficou acordado que as votações em Plenário seriam apenas de matérias consensuais e relacionadas ao combate à pandemia. No entanto, partidos de esquerda, como o Psol, se queixam da votação de matérias sem relação direta com a pandemia, como a nova lei do gás.
“Fiquei chocada com a inclusão dessa matéria na pauta. nunca discutimos uma lei geral do gás ainda mais em momento de pandemia em nenhum colégio de líderes”, protestou a líder do Psol, Fernanda Melchionna (RS), na votação da urgência do projeto na semana passada.
Apesar de o foco das discussões ser nas comissões permanentes, alguns líderes defendem que as temporárias também voltem a funcionar. “Eu daria prioridade para as comissões temporárias dos temas mais relevantes, como Reforma Tributária, segunda instância, Código brasileiro de energia elétrica, código de processo penal”, disse o líder do Novo, Paulo Ganime (RJ). Das permanentes, ele defende instalação da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC). Segundo o líder, o estado de calamidade pública afrouxou os processos de contratações públicas e o mecanismo de fiscalização precisa ser resgatado.
Retorno híbrido
Quando se debate a possibilidade de retorno das comissões, é feita uma ponderação para a redução na quantidade de reuniões, que costumavam ocorrer semanalmente entre terça e quinta-feira. Líderes também defendem que essa retomada ocorra nos mesmos moldes das sessões remotas em Plenário.
“Acreditamos que é muito importante o retorno. Não precisa, necessariamente, nós termos a presença dos parlamentares. Mas pode ser híbrida, da forma como estão sendo as sessões do Plenário. Existe a expectativa de que no mês de agosto elas possam ser instaladas”, disse o líder da Oposição, deputado André Figueiredo (PDT-CE). Ainda que não haja o retorno de todas as comissões, o líder acredita que pelo menos aquelas de mais peso possam voltar a funcionar, como a CCJ e a CFT.
Outro colegiado que deve ser instalado proximamente é a Comissão Mista de Orçamento (CMO), composta por deputados e senadores, e que foi apontada pelo DEM e MDB como razão para a composição em bloco. A CMO é a responsável por examinar a Lei Orçamentária Anual (LOA), que compreende o orçamento fiscal dos Poderes da União, seus fundos, órgãos e entidades da administração direta e indireta. A presidência em 2020 cabe a um deputado.
Apesar da expectativa de retorno, há empecilhos técnicos. O sistema eletrônico da Casa precisaria ser aprimorado para garantir, entre outras coisas, o sigilo do voto. A votação dos presidentes das comissões, por exemplo, é secreta. Além disso, não há certeza sobre a possibilidade de realizar várias sessões simultâneas por videoconferência.
Na visão do líder do Pros, no período de pandemia, a Câmara aprimorou o sistema e a possibilidade de discutir e deliberar matérias de forma semi-virtual. “Acho que já chegou o momento de o presidente Rodrigo colocar as comissões para funcionar. Pode até não ser da forma como estava funcionando e naquele número que nós estávamos fazendo, para a gente ter um pouco mais de segurança, mas o calendário da Câmara não pode ficar estagnado o ano todo”, ponderou o deputado Acácio Favacho.