A Aliança Nacional LGBTI+ e a Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas (Abrafh) entraram com uma ação contra o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) em que cobram dele indenização no valor de R$ 5 milhões por danos morais coletivos, além da suspensão de suas contas nas redes sociais, bem como a exclusão dos selos de verificação de seus perfis na internet.
As duas entidades acusam Nikolas de ter cometido transfobia e propagado discurso de ódio contra pessoas trans durante o discurso feito no plenário da Câmara, em 8 de abril, no qual se fantasiou com uma peruca e se apresentou como “deputada Nikole” para dizer que “as mulheres estão perdendo seu espaço para homens que se sentem mulheres”.
Veja o discurso do deputado:
“A fala proferida e a performance do deputado configuram o crime de transfobia, seguido de evidente discurso de ódio e tem o condão de incitar a violência contra a população LGBTI+ que já sofre extremamente no Brasil com a violência conforme tantos anuários relatam”, alegam as advogadas Amanda Souto Baliza e Maíra Calidone Recchia Bayod, autoras da ação, ajuizada na 12ª Vara Cível de Brasília.
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O Brasil é o país onde mais pessoas trans são assassinadas. Dossiê divulgado na última quinta-feira (11) pelo Observatório de Mortes e Violências contra LBGTI+ no Brasil denuncia a ocorrência de 273 mortes dessas pessoas de forma violenta no país, em 2022. Desse total, 228 foram assassinatos, correspondendo a 83,52% dos casos; 30, suicídios (10,99%); e 15 mortes por outras causas (5,49%).
“Discursos como este fomentam a faceta desrespeitosa e criminosa contra transgêneros, incitando esse tipo de discriminação e preconceito, bem como a violência contra a população LGBTI+, além da já conhecida prática de violência política de gênero. Assim é que, independentemente da responsabilidade criminal e ética a ser apurada nas esferas competentes, se faz necessário manejar a presente ação para requerer a reparação de dano moral coletivo e dano social infligidos à comunidade LGBTQIA+, e à sociedade brasileira de modo geral, em razão das graves ofensas transfóbicas vociferadas pelo réu, com a responsabilidade de quem porta a imagem pública de deputado federal”, afirmam as advogadas.
“Não se deve permitir que a população brasileira seja exposta a falas criminosamente transfóbicas proferidas na maior esfera do poder legislativo do país, mediante grave violação de valores fundamentais historicamente conquistados, exclusivamente para que o parlamentar costumeiro incitador de ódio, ganhe mais seguidores e likes nas redes sociais, o que, aliás, piora sobremaneira o alcance das ofensas”, acrescentam.
Segundo a ação, Nikolas Ferreira teve grande crescimento no número de seguidores nas redes após a divulgação do vídeo do discurso transfóbico. Procurado pelo Congresso em Foco, o deputado informou que ainda não foi notificado sobre a ação.
“Até o presente momento não recebemos nenhuma citação dessa suposta ação, portanto não conhecemos o conteúdo da mesma. Caso sejamos intimados, iremos nos defender no processo para buscar que a justiça seja feita contra mais essas tentativa de nos censurar”, respondeu o parlamentar mineiro por meio de sua assessoria de imprensa.
As associações pedem, em caráter liminar, a suspensão das contas do deputado ou a imediata remoção das postagens por ele veiculadas relacionadas à sua fala. Pedem também que o deputado publique uma retratação. E solicitam, ainda, que o montante de R$ 5 milhões seja destinado a entidades de acolhimento e promoção de direitos da comunidade atingida, LGBTI+, a projetos que beneficiem a população LGBTI+ ou alternativamente, a reserva dos valores no Fundo de Direitos Difusos para projetos que integrarem seu rol nesta temática.
No mês passado o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) condenou Nikolas Ferreira, em primeira instância, por transfobia e impôs indenização no valor de R$ 80 mil. O processo foi movido pela deputada trans Duda Salabert (PDT-MG) pela forma com que ele se dirigiu a ela quando ambos eram vereadores em Belo Horizonte.
Ainda em abril, o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania defendeu que Nikolas Ferreira fosse julgado no Conselho de Ética e no Supremo Tribunal Federal por homotransfobia devido ao discurso feito por ele no Dia Internacional da Mulher.
Em nota técnica, o ministro Silvio Almeida e outras duas secretárias da pasta recomendam que seja dada continuidade ao processo de perda de mandato do deputado na Câmara e às investigações do Ministério Público Federal relativas ao episódio.
“Não foi cometido apenas crime de homotransfobia. Nikolas Ferreira também violou o Regimento Interno da Câmara dos Deputados, sob a Resolução nº 17 de 1989, e o Código de Ética e Decoro Parlamentar de sua Casa Legislativa, sob a Resolução nº 25 de 2005”, diz trecho do documento ao qual o Congresso em Foco teve acesso. “A não responsabilização configura uma ameaça à estabilidade democrática, que se apresenta em diversas partes do mundo, com especial incidência sobre o Brasil”, acrescenta.
Nikolas Ferreira recebeu 1,47 milhão de votos em outubro, o que fez dele o deputado mais votado da atual legislatura. (Por Edson Sardinha)