Osvaldo Martins Rizzo *
O matemático Antoine Cournot demonstrou, há muito tempo, que o conceito de mercados perfeitos de livre concorrência explica transações comerciais apenas em situações em que muitos agentes de oferta competem entre si. Onde poucos participantes não competem, mas se compõem para fixar preços tem-se o cartel, o oligopólio.
Historicamente, o comportamento dos mercadores é o de burlar as regras usando as brechas das leis; a deficiência da fiscalização e o poder econômico de corromper para anular a competição, criando um cartel para repartir a demanda entre poucos agentes de oferta que impõem ao comprador preços altos e previamente combinados pelo grupo.
Muitos setores da economia brasileira estão oligopolizados, o que se constitui em uma constante pressão inflacionária, combatida pelo Banco Central com a política monetária contracionista baseada nos juros e depósitos compulsórios. Um exemplo da prática criminosa dos cartéis pode ser constatada em vários segmentos dos serviços e materiais de construção.
PublicidadeTodavia, graças à exemplar atuação de órgãos como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), a Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça (SDE) e o Ministério Público (MP), os conluios de fabricantes para surrupiar a sociedade estão sendo combatidos e revelados ao público, e seus responsáveis devidamente processados na forma da lei.
O recente desmonte do cartel paulista da pedra britada constitui-se em um marco histórico na defesa da livre concorrência no Brasil, pois se trata do primeiro caso de oligopólio condenado pelo Cade em que a SDE recorreu a instrumentos como escutas telefônicas, busca e apreensão e acordo de leniência para produção de provas. O cartel – formado por empresas ligadas a grandes grupos econômicos nacionais e companhias multinacionais líderes do setor de fabricação de materiais de construção – detêm a maior parte do mercado. Além das multas milionárias aplicadas às empresas punidas, o MP ajuizou ações penais contra as pessoas físicas dos administradores das companhias cartelizadas envolvidas na prática delituosa.
Algumas dessas mesmas empresas também são investigadas pela SDE como integrantes do cartel do cimento e das concreteiras, em conluio com outras que juntas respondem por cerca de 90% do fornecimento nacional do insumo. A apreensão de provas documentais foi possível a partir da detalhada confissão de um graduado ex-executivo do maior produtor brasileiro de cimento.
Por sua parte, algumas das maiores siderúrgicas instaladas no país foram condenadas pelo Cade ao pagamento de pesadas multas pela prática de conluio e divisão de mercado com relação à venda de vergalhões de aço usados nas estruturas de concreto armado.
No segmento dos serviços de construção, o MP investiga fortes indícios da formação de cartel no mercado das grandes obras públicas, dominado por meia dúzia de empreiteiras que ficam com cerca de 70% do dinheiro desembolsado pelo governo. Favorecidas por exigências técnicas dezarrazoadas nos editais dirigidos das licitações que excluem as demais concorrentes, essas construtoras cartelizadas deixam de provar na prática as suas capacidades técnicas, como demonstra o inaceitável erro de engenharia causador do recente e fatal desabamento da Estação Pinheiros do Metrô paulistano. A ação desse oligopólio explica porque, no Brasil, as obras de construção de aeroportos, metrôs, estádios etc. quase sempre custam mais caro que o previsto. Apesar da falta de apoio político e de estrutura adequada, também os tribunais de contas vêm heroicamente combatendo esse tipo de ilícito.
Segundo publicação da organização-não-governamental Transparência Internacional, em todo o mundo, a corrupção vem a ser o maior problema do setor da construção, superando até mesmo o índice obtido para a indústria de armamentos.
* Osvaldo Martins Rizzo é engenheiro civil e ex-conselheiro do BNDES.
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