Alex Canziani*
O contingenciamento reduziu em quase 20% os gastos discricionários do governo federal com a educação, o que vai aumentar a pressão sobre o financiamento das universidades públicas. A crise já havia se instalado em várias instituições federais com a restrição orçamentária do início do ano e tende a se agravar por outros movimentos. O Supremo Tribunal Federal (STF) deve decidir em breve contra a cobrança de mensalidades para cursos de pós-graduação lato sensu nas universidades públicas, enquanto governadores e prefeitos cobram maiores repasses da União para o ensino básico.
Acossados pela Lei de Responsabilidade Fiscal, prefeitos e governadores querem que o Planalto complemente o pagamento do piso nacional dos professores. As transferências da União para Estados, DF e municípios financiar a educação básica totalizaram R$ 23,9 bilhões em 2014.
Os recursos destinados ao ensino superior mais que dobraram nos últimos doze anos, mas as instituições públicas não conseguiram cumprir metas acordadas de ampliar a relação de alunos por professor e ampliação da taxa de conclusão dos cursos. A situação, que já estava longe da ideal, se agravou com a redução nos repasses de recursos no início do ano, levando algumas universidades a suspenderem suas atividades.
O Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), igualmente, não cumpriu o objetivo de aumentar significativamente o número de estudantes entre 17 e 24 anos no ensino superior privado. O investimento no Fies aumentou mais de 600% entre 2010 e 2014, mas o número de universitários na rede privada no período aumentou apenas 13%.
No ano passado, o Brasil registrou 7,3 milhões de estudantes matriculados em cursos de graduação no ensino superior, sendo 73,5% nas instituições particulares e 26,5% em instituições públicas. Para ajudar a financiar seu custeio, algumas instituições públicas cobram mensalidade por cursos de especialização e MBA, mas o STF já foi instado a declarar a inconstitucionalidade da cobrança. Algumas sentenças isoladas da Justiça de primeira instância e tribunais federais já se manifestaram nesse sentido.
Para “driblar” a restrição constitucional, algumas universidades criaram fundações públicas de direito privado que assumem a responsabilidade por uma série de cursos de pós-graduação ofertados por elas. Muitas instituições alegam que os cursos de especialização não seriam “regulares” e a cobrança poderia ser institucionalizada por meio das fundações.
Por essa razão, a Câmara instalou na última quarta-feira (15) uma comissão especial para apreciar a PEC 395/14, que deixará inequívoca a possibilidade de cobrança por cursos de especialização, mantendo a gratuidade para cursos de graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado.
Essas propostas enfrentam resistência no meio acadêmico e mesmo na opinião pública em geral. Mas a crise financeira e os enormes gargalos na educação brasileira impõem que coloquemos esse debate na mesa.
Países desenvolvidos com bons resultados em educação pública superior adotam diferentes modelos de financiamento. Alguns países da Europa, como Portugal e Inglaterra, cobram mensalidades; enquanto noutros, como a França e os países nórdicos, o ensino é totalmente gratuito e os estudantes ainda contam com fortes subsídios para o transporte, moradia e alimentação.
Na Alemanha, a cobrança de mensalidades em universidades públicas foi adotada por dez anos, mas começa a ser abandonada, porque os custos administrativos não compensaram a arrecadação com mensalidades.
Nos Estados Unidos, os cursos são pagos – e caros. Na nação mais rica do mundo, a queda do financiamento público estadual está levando as universidades a aumentarem o valor das mensalidades e até o desconto para residentes (In-State Tuition) está desaparecendo.
A tendência na maioria dos países tem sido adotar o modelo estadunidense, que já apresenta sinais de esgotamento nos próprios EUA, conforme aponta a revista The Economist.
A alta demanda por diplomas de curso superior em países desenvolvidos provoca o debate sobre o modelo de financiamento – público, privado ou uma combinação equilibrada de ambos. Em qualquer situação, a educação superior tende a aumentar seus custos e esse é um problema ainda não equacionado, que nem mesmo a cobrança de mensalidades sozinha soluciona.
Outra proposta em discussão no Congresso é a criação dos fundos patrimoniais (endowment), nos quais ex-alunos (alumni), empresas e cidadãos são estimulados a fazer doações em dinheiro, terrenos e até bibliotecas inteiras para as instituições que servem suas comunidades. O Brasil tem pouca tradição na captação de recursos privados e a criação dos fundos de investimentos, como acontece nos EUA, seria um auxílio.
Do ponto de vista do retorno à sociedade, a educação superior brasileira proporciona grandes avanços e retorno econômico em áreas de ponta. Ao mesmo tempo, produz grandes massas de estudantes mal preparados. Portanto, a discussão sobre a cobrança de mensalidades em universidades públicas deve, além de passar pelo aspecto financeiro, focar também na qualidade dos cursos oferecidos.
Uma nação que se pretende desenvolvida e plena de oportunidades para seus cidadãos precisa investir em conhecimento e tecnologia, mas o Brasil enfrenta restrições orçamentárias para o desenvolvimento de atividades de ensino e pesquisa de excelência em suas universidades. O desafio é enorme. Precisamos deixar o ringue e dialogar na busca de alternativas para financiar a inovação e a formação de massa crítica humana capaz de aumentar a nossa capacidade de competir e gerar riquezas.
*Deputado federal pelo PTB do PR, é presidente da Frente Parlamentar da Educação no Congresso Nacional.
Deixe um comentário