Marcos Verlaine*
A última pérola da revista Veja para reforçar a crise e dar-lhe ares mais radicalizados – já que a crise política em curso começa a se dissipar – é a “denúncia” da suposta “doação” de US$ 3 milhões do governo cubano para a campanha de Lula em 2002. Assim, a partir dessa “bomba” e antes de qualquer investigação séria, a mídia grande começa a repercutir a acalentada tese do impeachment de Lula. A direita extrapola os marcos do debate político e parte para a apelação. Afinal, está em jogo a presidência da República!
São mais de cinco meses de fogo cruzado e incessante. Vale tudo para banir qualquer possibilidade de o presidente Lula renovar o mandato em 2006. E mais: vale tudo para inviabilizar qualquer chance de a esquerda mostrar que outro Brasil é possível, que há alternativa para além do consenso imposto pelo “pensamento único” do neoliberalismo.
Como disse José Dirceu: “acharam que entregar minha cabeça bastava”. Os setores conservadores querem mais.
Aproveitando-se da crise, a direita tenta destruir o PT, principal partido de sustentação da campanha presidencial, seja de Lula ou qualquer outra de vertente progressista e avançada. Mas o PT, contrariando os apologistas do “mar de lama”, mobilizou sua militância e demonstrou vitalidade em seu processo de eleições internas (PED). No primeiro turno, participaram do PED mais de 305 mil militantes; no segundo turno, foram cerca de 230 mil. O partido tem 800 mil filiados.
Já que não é possível destruir o PT, querem comprometer, inviabilizar e, por fim, destruir um de seus principais articuladores, o deputado José Dirceu. Não interessa se faltam provas que demonstrem a existência do chamado mensalão. Se não há fatos, dane-se; vale a versão.
Bem, mas destruir Dirceu não é o suficiente, pois pesquisas demonstram que Lula é um poderoso candidato à reeleição. Tem popularidade, mantém bons índices de aceitação popular e, na ótica do setor financeiro nacional e internacional, é o candidato com mais chances de vencer as eleições de 2006. Mas assim não é possível, “como pode Lula manter essa popularidade se não lhes damos trégua?!”, devem pensar os apologistas da crise.
PublicidadeEntão sacam o Severino, “afinal ele estava com o governo”, maquinaram a direita tucano-pefelista e seus aliados de última hora. Mas isso também não deu certo. O governo elegeu um aliado, perderam mais uma chance de mostrar a essa "raça" seu verdadeiro lugar, pensaram com seus botões. “Mas vamos continuar fustigando, porque a qualquer momento pode explodir uma bomba, basta que estejamos prontos para detoná-la”, planejam.
Já perderam duas chances: a primeira foi quando o Duda Mendonça disse que abrira uma conta no exterior para receber por seus serviços prestados à campanha de Lula; a segunda foi a denúncia de que o filho de Lula teria se beneficiado de um contrato de R$ 5 milhões com a Telemar, lembram-se com melancolia. “Meu Deus, como pudemos ter perdido essas chances”, lamentam-se, desolados.
Então sacam mais uma do arsenal oposicionista: o Lula recebeu US$ 3 milhões do governo de Cuba. E claro, o veículo não poderia ser outro senão a Veja, useira e vezeira do mau jornalismo e panfleto do capital especulativo nacional e internacional. E pior: porta-voz do ódio de classe que a elite econômica tupiniquim nutre pelo povo brasileiro e os movimentos sociais.
Teria sido uma operação urdida por Havana; a grana foi despachada em caixas de bebidas e passou por Brasília, Campinas até chegar ao comitê de campanha em São Paulo.
Pergunta: como pode um montante desses não passar pelas mãos dos principais articuladores da campanha de Lula? Essa “bolada” foi manipulada por ex-assessores de Palocci, quando o titular da Fazenda era prefeito de Ribeirão Preto.
Poupem o povo brasileiro dessa bobagem. Respeitem nossa inteligência!
Obstáculos
A tese do impeachment tem vários obstáculos pela frente, caso a direita insista que esse seria o melhor caminho para a solução da crise. Senão, vejamos:
– a popularidade de Lula continua elevada, e sem povo nas ruas não dá para legitimar a arriscada empreitada;
– o recurso não tem apoio da sociedade e dos movimentos sociais, como a OAB e a CNBB;
– o presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB/SP), não vai permitir a tramitação de um pedido de impedimento sem as devidas fundamentações, e
– a oposição não tem os 342 votos necessários na Câmara para aprovar a abertura do processo.
*Marcos Verlaine é jornalista, foi correspondente do portal Vermelho em Brasília e integra a equipe de profissionais do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar).
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