Andrea Vianna
Se a adoção da súmula impeditiva de recursos enfrenta a resistência da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a medida causa menos polêmica no meio jurídico do que a prima-irmã da nova norma, a súmula vinculante – uma das novidades da reforma constitucional do Judiciário. “A morosidade precisa ser combatida sem restringir o direito do cidadão de se defender com plenitude. Queremos preservar a ampla defesa e o contraditório”, diz o advogado Edson Ulisses de Melo, relator da comissão de reforma processual do Conselho Federal da OAB.
Ao contrário da súmula impeditiva de recursos, que diz respeito a decisões relacionadas a questões que não estão na Constituição, a súmula vinculante obriga os juízes das instâncias inferiores a seguirem os entendimentos já consolidados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em temas constitucionais. Além disso, com ela, o juiz fica impedido de julgar de modo contrário ao entendimento da Corte. Até hoje, porém, a súmula vinculante, nunca foi aplicada.
Caráter preventivo
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“Hoje a súmula vinculante tem um caráter muito mais preventivo. Mas se estivéssemos atravessando um período de instabilidade econômica, de sucessivos planos econômicos, ela seria muito útil para impedir o julgamento de causas idênticas”, observa o juiz federal Flávio Dino, secretário-geral do Conselho Nacional de Justiça. Ele recorda que entre os anos de 1986 e 1994, em que foram editados os planos Collor 1 e 2, Verão e Bresser, ocorreu uma enxurrada de recursos iguais aos tribunais superiores, pedindo o reajuste de expurgos inflacionários desses planos. Contudo, os processos iguais até hoje se multiplicam no Supremo.
Feitiço contra feiticeiro
PublicidadeO Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), que tem aproximadamente 50 mil processos semelhantes em andamento no STF, vem empurrando com a barriga o pagamento de R$ 8,8 bilhões devidos a aposentados e pensionistas que reclamam a revisão de seus benefícios.
A Previdência não vê como despender R$ 2 bilhões, equivalentes ao crédito de aposentados que recorreram aos tribunais para corrigir índices de reajuste manipulados por obra dos planos econômicos da era da hiperinflação.
Antevendo a era das súmulas vinculantes, a Previdência pediu à Advocacia Geral da União (AGU), que a representa na justiça, para não recorrer mais em ações desse tipo. O restante da dívida – R$ 6,8 bilhões – fica por conta dos gastos com atrasados devidos a pensionistas, isto é, filhos ou cônjuges de segurados falecidos.
A campeã de processos no STF é a Caixa Econômica Federal (CEF), que é parte em cerca de 190 mil processos – 44% do total da corte. A maioria deles se refere a correções não efetuadas adequadamente no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) quando da implantação dos planos antiinflacionários.
Tempo perdido
“São todas causas idênticas pedindo reajuste de índices de correção do FGTS ou da aposentadoria. Dos meus 12 anos de magistratura, pelo menos 10 eu passei julgando processos iguais”, recorda o juiz Flávio Dino.
A adoção da súmula vinculante foi um dos itens mais polêmicos da reforma constitucional do Judiciário. Contrário à mudança, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, acabou sendo voto vencido diante da pressão da área econômica do governo. “A súmula vinculante é mal vinda porque representa um instrumento autoritário, onde o Poder Judiciário dá a última palavra em normas gerais da coletividade. Além disso, retira o que a jurisprudência tem de rico, que é a possibilidade de adaptação a partir dos casos concretos. A partir do momento em que o Supremo definir uma orientação geral, isso se consolidará e cristalizará”, observa o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP), presidente da Comissão Especial da Reforma do Judiciário.
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