Guillermo Rivera |
Não bastasse a grave crise política do governo, a polêmica em torno de um projeto nacional de saneamento no Congresso Nacional, uma das prioridades para o mandato de Lula, emperrou no plenário da Câmara. A proposta que tinha o potencial de investir, ao longo de 20 anos, R$ 178 bilhões em saneamento para que todos os 180 milhões brasileiros tenham acesso à água tratada e serviço de esgotos parou em virtude da briga entre estados e municípios, e levou o governo federal a retirar, na semana passada, o pedido de urgência constitucional. Publicidade
A falta de consenso sobre quem seria o responsável pelos serviços – o governo federal quer repassar a competência para os municípios, mas os estados, que são os maiores concessionários, resistem – e a viabilidade de se implementar subsídios cruzados – por meio dos quais os lucros nos municípios mais ricos bancam investimentos em regiões deficitárias – fez com que o governo federal recuasse das suas pretensões. Leia também Publicidade
Embora o governo venha debatendo a proposta desde 2003, as divergências quanto à política nacional de saneamento são evidenciadas em números: 862 emendas de deputados foram apresentadas aos dois projetos de lei do tema, um do Executivo, o PL 5296/05, e outro da deputada petista Maria do Carmo Lara (MG), o PL 1144/03. A maior parte deles, contudo, visa a fazer pequenas alterações à proposta. Os projetos, tramitando em conjunto, ganharam o carimbo de prioritários em 19 de maio e passaram a obstruir os trabalhos dos deputados desde 12 de julho. PublicidadePerderam a prioridade na quarta-feira passada, na semana em que a Câmara promoveu a 6ª Conferência das Cidades, da Comissão de Desenvolvimento de Urbano (CDU). Os projetos, agora, voltam a tramitar numa comissão especial de saneamento, que hoje escolhem seus vice-presidentes. Discussões idênticas Os dois nós do projeto do governo são conhecidos do setor. O mais complexo de desatar é a titularidade, constante no 1144/03: trata-se de saber quem irá arcar com os custos da instalação e da manutenção do saneamento em cada localidade – se a União, os estados ou os municípios. O governo federal exige que esses serviços sejam desempenhados pelos municípios. Durante a tramitação do projeto, os secretários estaduais dessa área, entretanto, reclamaram constantemente de não terem suas reivindicações atendidas pelo governo federal. A briga sobre a titularidade está no Supremo Tribunal Federal (STF) desde 1998, e a tendência é que o tribunal dê ganho de causa aos municípios. “No primeiro dia em que recebi o projeto, procurei o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Nelson Jobim, para ver como fica a titularidade. Ele entendeu, em um primeiro momento, que a titularidade é municipal”, conta o deputado Julio Lopes (PP-RJ), relator do projeto. Segundo Julio Lopes, titular da Comissão de Desenvolvimento Urbano (CDU), a competência sobre a gestão do saneamento nos centros metropolitanos é também uma preocupação. Lopes observa que nestes centros há a confluência de vários municípios e, portanto, o saneamento não pode se tornar uma questão municipal. “Há uma interseção de vários municípios”. A solução provisória apontada pelo deputado seria fazer prevalecer o interesse dos consórcios ou companhias já estabelecidos. O relator, no entanto, cobra uma solução constitucional para o caso. “Não há um entendimento constitucional de como é a gestão da área metropolitana, se compete ao Estado ou ao conjunto de municípios”, diz a deputada Maria do Carmo Lara, autora do PL 1144/03. A deputada foi prefeita de Betim (MG), município da região metropolitana de Belo Horizonte (MG) entre 1993 e 1996, e concorda tanto com o plano de ação imediata quanto com a necessidade de se criarem dispositivos constitucionais para o saneamento em metrópoles. “Quando fui prefeita em Betim, fiz um trabalho conjunto com a Copasa ( Companhia de Saneamento de Minas Gerais ). Mas o saneamento é um setor que não tem regulamentação adequada desde o final da década de 80” , conta. Os subsídios cruzados são um pouco mais complicados e rendem, também, uma discussão acirrada. Em linhas gerais, é uma espécie de compensação, com usuários ricos pagando tarifas superiores ao custo. O lucro obtido pela companhia é transformado em tarifas inferiores ao custo para usuários pobres. “É importante que haja subsídios cruzados. A sua inexistência dificultaria a ação das empresas estaduais”, sustenta Maria do Carmo. |
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